Primeira Parte - Capítulo 1 - Cindhy

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Era uma tarde fria e chuvosa na cidade de Nagasaki em que, ainda afetada pela bomba atômica, a chuva ainda tinha um odor diferente. Às onze e meia da noite meu pai Sam me apontava o dedo sobre meu nariz e gritava:

_ Cindhy, você é nova, não sabe o que quer! - entre suspiros e bufadas, continuou - Você pensa que o mundo gira em torno de você, se você sair da cidade será uma desonra a nossa família, o que os nossos amigos, vizinhos e parentes vão pensar de nós, uma garota à deriva, assim, sem supervisão?

_ Eu, eu... Não sei. - falei cabisbaixa.

_ Siga nosso conselho: fique conosco. O mundo é cruel, vai implorar por paz e acolhimento de alguém querido.

_ Ok, papai. - achei melhor não relutar.

Minha mãe, Sung, não expressou nenhuma reação, ficou ali no canto, como se estivesse em outro mundo.

Durante a penumbra da noite eu estava na cama, delirando adentrando num sono profundo; minha mãe chegou ao quarto, abriu a porta com cuidado e beijou minha testa com uma suave delicadeza. Enquanto delirava, quase adentrando nos meus sonhos, incrivelmente o que ela dizia coincidia no que havia dito dentro do sonho para mim:

_ Vá minha filha, siga sua jornada. Ela é mais importante que o orgulho de seu pai rancoroso.

Ohh... amada mãe, voz doce, confortante e sempre compreensiva, colocou um envelope em cima do meu peito. Ela sabia que não me mexia muito e que acordaria com o envelope no mesmo lugar, notando-o. Uma lágrima escorreu sobre seu rosto, belo, liso e entristecedor, com o dedo indicador direito ajeitou o cabelo negro e liso atrás da orelha direita, como se um último olhar afagasse sua dor. Levantou-se, dirigiu-se à porta e, antes de apagar a luz e ficar na penumbra, sussurrou:

_ Volte um dia, minha filha.

A porta bateu e, ao mesmo tempo em que a vida dela se desmoronou, meu sonho se tornou também num pesadelo, daqueles que nem o diabo poderia criar pior tortura. Eu acordei assustada, parecia que o universo tinha caído nas minhas costas. Olhei o relógio que marcava oito horas; percebi que tinha algo me incomodando, era o envelope.

No sonho, minha mãe tinha me dado o envelope, sabia que era dela, abri imediatamente e dentro dele havia uma passagem - a passagem da minha vida! Rumo ao MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), no qual fui aceita na semana retrasada. Além disso, ali continha uma quantia em dinheiro.

Arrumei minhas tralhas imediatamente e corri para o aeroporto. Faltava pouco tempo, assim, não deu para me despedir de ninguém, aliás, creio, segundo as circunstâncias, que não era para me despedir. O fato de minha mãe aparecer no meu sonho me dando um envelope e, o mesmo estar realmente em minha posse, confirmava o meu futuro.

Cheguei ao aeroporto, fiz o check-in e me dirigi ao avião, meu coração pulava pela boca, mesmo com a típica frieza da minha família. Sempre fui estressada, resmungona e provavelmente a ovelha negra da casa. Durante o voo, analisando o envelope que tinha a passagem, notei que nele havia algo estranho, parecia uma palavra bem pequena. Minha mãe quando mais nova fazia enigmas atrás de enigmas para eu decifrar. Percebi, após pedir emprestados os óculos do colega ao lado, improvisando uma lupa, que ali estava escrito "queime"!

Olhei em volta, encontrei o isqueiro de metal que ela havia me dado quando tinha 15 anos. Resolvi aguardar até o avião chegar a Cambridge, caso contrário iria pôr fogo no avião ou ser confundida com uma terrorista. Aliás, mancada da empresa aérea deixar tal tipo de objeto adentrar a parte que os passageiros se encontravam.

Quando cheguei ao chão, logo ao sair do avião saquei meu isqueiro maneiro, passei cuidadosamente o fogo por baixo do papel, o qual amarelou e revelou um número, não fazia algum sentido para mim.

Os Homens DeusesOnde histórias criam vida. Descubra agora