Que o vento leve...

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Sinto meu celular vibrar como um sino grande de uma torre de alguma igreja antiga depois de badalar.
É o meu pai.
Que horas são?
Olhando para a hora digital do relógio na tela do aparelho, vejo que já se passaram dás 21:00 horas.
Hesito alguns segundos para atender aquela ligação. Ele deve está fervendo de raiva comigo. E eu disse que isso não voltaria a acontecer de novo. Pisco algumas vezes, -É, nem pensar em rejeitar. -atendo.

-Oi.

-Murilo! Onde você está? -Pergunta ríspido.

-Estou... -Penso um pouco. Será que digo a verdade? Ele não me entenderia. Eu sei. -Estou terminando um trabalho na casa de um colega. Desculpa não avisar. Achei que não demoraria tanto assim. -minto.

Sou o rei das mentiras agora. Que beleza. Odeio ter que mentir. Mais dessa vez não tenho opção.

-Deveria ter ligado. Estava preocupado. Você não é disso. -Faz uma pausa, ouço sua respiração se normalizar junto com a sua voz. Ótimo, ele acreditou. -Vai demorar?

-Não muito. Talvez eu chegue antes dás dez.

-Às dez ok? A chave reserva da casa vai ficar no lugar de sempre. Vou sair com a Laura. Jantar de última hora com o meu supervisor e a esposa. Não sei que horas voltaremos. Você deve imaginar como é. Odeio esses jantares. Como sempre é uma conversa fiada sem fim.

-Sei. Tudo bem pai. Um bom jantar mesmo assim.

-Cuide-se. -desliga.

Dessa vez tive sorte. E graças aos céus apareceu esse jantar. Preciso de mais tempo com os meus pensamentos. Que raios sejam. Fui amaldiçoado será?
Carolina não me quer. Não significo nada pra ela?
Como vou esquecer seu beijo? Seu sorriso?

Pego a pulseira. E com ela na minha mão, passo as pontas dos meus dedos nos pingentes, deslizando em cada um deles. Sentindo os pequenos desenhos de prata. Fria. Como o meu coração agora. Frio, congelado.
Sinto uma lágrima escorrer sobre minha face. E mais outras querendo transbordandar. Persistindo em cair. Não consigo segurar. Desabo ali mesmo.
Apertando a pulseira com força e abraçando os joelhos. Estou largado ali na grama da praça. Sozinho.

-Murilo? -Escuto uma voz atrás de mim.

Uma voz familiar ao sair como um sussuro. Me trás esperança.
Alucinações agora é Murilo?
Carolina? Sinto o cheiro dela misturado com a brisa leve da noite. Ela tem o cheiro de rosas e morangos frescos.

-Você não foi para casa? -pergunta incrédula. Toca-me derrepente os ombros. Esta me puxando pra cima. Inutilmente. Sou pesado demais linda, será que não vê? -Meu Deus Murilo. Levante-se! Você não pode ficar aí.

-Por quê não? Aqui é o meu lugar. Jogado. É assim que me sinto. -Digo irônico. Percebo ela revirar os olhos.

-Tudo bem. Você não vai levantar? - Ela joga a sua mochila que estava nas costas no banco. -Então vou me juntar a você aí. -Senta-se à minha frente no chão.

-Não precisa figir que se importa comigo. Não preciso de sua pena.

-E quem disse que estou com pena? -Cruza as pernas decidida a ficar ali.

Desvio o meu olhar do dela. Quero fugir daqueles olhos. Quero fugir daquela boca. E ao mesmo tempo quero me entregar a eles. Possuí-los.

-Você andou chorando? -Sua voz soa mas como uma afirmação do que uma pergunta. Percebeu a minha cara de dor só agora?
É isso mesmo Carolina. Sou um molenga.

-Choro sim, porque sou um fracote! -Respondo em meios as lágrimas que ainda enchem meus olhos.

-Você se considera fraco por que chora? -sorrir sem animo. -Então todos nós somos fracos. Chorar é uma prova que temos sentimentos. E isso não é ser uma pessoa fraca. E sim forte, por suportar a dor.

Forte. Sou isso?
Quero ser. Mais do que nunca, quero ser. Ser forte pra suportar toda essa carga. E não estou falando do meu peso. Sorrio apesar de tudo que estou sentindo.

-Não mereço suas lágrimas Murilo. Não mereço nada disso.

-Por que Carolina? É tão difícil assim pra você ficar comigo?

-Já disse que não tem nada haver com você

-Isso tudo não faz o menor sentido. Como você quer que eu entenda se você não me diz nada sobre isso que te encomoda tanto?

-Não insiste mais Murilo. Não dar de...

Sem pensar nem mais meio segundo a beijo. A beijo como se minha vida dependesse disso. Eu a quero. E não vou desistir fácil assim. Não e não.

-Não. Para. Eu não posso. -Se afasta de mim se pondo de pé novamente.

Olho para o chão. Olho pra ela. Me levanto também.

-O que você não pode? -pergunto sério.

Carolina demora a falar. Está pensativa.

-Me esquece Murilo.

-Agora quem diz que não pode sou eu. -digo sereno. Ela inclina a cabeça me observando.

-Eu achei que você só queria curtir. Como todos os caras. -sua voz vacila.

-Não sou assim Carolina. Não quero só ficar com você. Isso não funciona comigo.

-É uma pena. -diz com a voz terna. -Não quero e não consigo me envolver "Mais" com ninguém.

-Por quê? -pergunto semicerrando os olhos.

-Isso não importa. Não quero falar disso. -balança a cabeça em negativo. -Só quero que você entenda que eu não quero namorar.

-Não quer namorar comigo? -pergunto dando grande ênfase no "comigo".

-Pense o que quiser. -ela toma fôlego. -Eu não me importo. Me odeie. Me julgue. Não vou dar a mínima importância para o que você pensa ou deixa de pensar de mim.

Suas palavras são como um soco no meu estômago. Ela não se importa com o que eu penso, nem mesmo com o que eu sinto. Fui um idiota em alimentar falsas esperanças.

-Não vou mais fazer você perder o seu tempo comigo. Desculpa tudo isso. Me enganei. -pego minha mochila e após ajusta - lá em minhas costas procuro forças para ir embora. -Mesmo não sabendo o motivo por você ter essa decisão. Sei que deve ser algo importante pra você. Eu entendo. Meu sentimento por você estar muito longe de ser ódio Carolina. -Tomando fôlego me despeço sem toca-la. -Boa Noite.

Carolina abre a boca pra me dizer alguma coisa. Mas desiste e apenas me deixa ir.

-Boa Noite Murilo.

Andando sem olhar para trás para não vê ela ali sozinha. Tento absorver o vento que passa por mim. Olhando para o céu vejo algumas nuvens. São de Chuva.
Gosto da chuva. Gosto do cheiro da terra úmida. Do som dos pingos que caem sobre o telhado. E desse vento que sempre vem antes dela. Quero me purificar de todo esse sentimento de derrota. Que esse vento leve tudo embora. Que fosse fácil assim sem nenhuma dor.

Chego em casa. Procuro pela chave da porta de entrada. -No lugar de sempre. -recordo as palavras do meu pai. Pego as chaves no pequeno vaso de flores. São violetas. Adimiro a beleza delas por alguns segundos.

Ao entrar na cozinha tomo um copo de água bem cheio.
Casa vazia. Apenas o som dos meus sapatos e do vento lá fora. Laura me mataria ao ver entrar em casa assim de sapatos. Rio com a idéia.

Após um banho demorado. Visto-me. Sinto meu estômago roncar.
Ligo o aparelho de som e a música Forever do Kiss preenche os meus ouvidos e todo o ambiente.
Na cozinha esquento o jantar que já estava frio. Sirvo-me de arroz, feijão, batata frita e um pouco de Bacon.
Na bancada de mármore puxo uma cadeira e ali mesmo volto a pensar nela.
De novo. Droga!

São quase dez horas quando termino meu jantar. Me distraio lavando as louças e com a música All My Life do Foo Fighters. Ótima para explicitar o que sinto agora. Apenas sonhos.

-Sonhos...

Assim Como as BorboletasOnde histórias criam vida. Descubra agora