Junho I

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A única coisa que me motivava a enfrentar Junho era a expectativa do aniversário do Sander. Por mais que estivesse imaginado mil coisas pra comemorar o dia com ele, acabou que o pessoal todo se reuniu pra fazer uma espécie de festa surpresa. Eu desconfiava que o gringo não era muito fã dessas coisas espalhafatosas e tumultuadas, mas não podia dizer nada contra o plano - mesmo porque isso poderia ser usado contra mim também.

Eu tava era até curioso com a reação dele, e empolgado também. De certa forma.

Ficou combinado que faríamos uma comemoração na casa do intercambista mesmo, e eu e o Daniel ficamos incumbidos de ir ao apartamento da família brasileira do Sander para acertar a hora e arrumar as coisas por lá.

Bem, o fato era que até então ninguém sabia que eu já conhecia todo mundo por lá. Fiquei todo nervoso tentando arrumar uma explicação caso o Alfredo, ou a Carmem, ou mesmo o Lucas me colocassem numa posição delicada, digamos. Gastei uns bons neurônios no processo, vou te falar.... E não cheguei à conclusão alguma.

Eu tinha algumas opções, porém.

Podia dizer que nos conhecíamos da vez que tínhamos ido ao estádio juntos, o que não seria mentira - não uma mentira completa, claro. Mas e se eles comentassem alguma coisa das minhas idas ao apartamento, ou das saídas posteriores com o Sander? Pra mim parecia que eu tinha que esquematizar toda a nossa "história" de um jeito que ficasse subentendido que nos encontrávamos de vez em quando fora do colégio, mas que aquilo era algo tão "banal" que eu nem tinha pensado em mencionar antes pro resto do pessoal... Sabe?

De qualquer forma, acho que gastei meus neurônios à toa, porque algo muito importante aconteceu antes do aniversário do Sander, na exata semana do dia doze de Junho, o dia dos namorados brasileiro. Saca só:

Estávamos numa correria por causa de trabalhos e provas, e eu vivia indo à biblioteca para pegar e devolver livros sem correr o risco de pagar multa e tal. Numa dessas viagens, saí da sala e imediatamente escutei a risada debochada do Carlos. Eu ia passar direto pelo corredor pra descer as escadas, mas não teve como não notar o Daniel empacado ali no meio, praticamente imóvel no espaço e tempo. Ele estava de costas pra mim, então nem me viu aproximar. Olhei direto pra onde ele estava olhando, pra ver o porquê da brincadeira de estátua... e, assim, de repente, eu entendi.

Foi como se as peças de um quebra-cabeça estivessem se encaixando dentro do meu cérebro, formando uma imagem sem qualquer imperfeição. Todos os últimos anos e, principalmente, os últimos meses fizeram sentido.

Encostados na grade, em frente à sala do segundo ano A, estavam a Maria Eduarda, o Luiz e o namorado dele, William. Os dois se abraçaram e o Carlos, junto da Natália e das outras meninas, pareciam bastante ocupados em remedá-los, mas o curioso era que eles não ligavam. Ambos estavam praticamente em uma dimensão paralela, onde só existia os dois...

Eu sabia onde ficava essa dimensão, aliás. Agora eu sabia.

Pisquei para a cena e olhei de soslaio pro Daniel. Era tão óbvio que me perguntei como não percebi antes! Ou como ninguém percebera antes.

Como o Carlos não percebeu antes?!

- Você gosta do Luiz! - soltei, meio sem fôlego até para argumentar.

Só então o Daniel notou minha presença ao seu lado. Seu rosto se transformou completamente: de tristeza, frustração ou algo assim, para puro pânico. Os globos oculares castanhos estavam do tamanho de bolas de tênis, sem brincadeira! E ele ficou tão branco, mas tão branco que parecia um fantasma.

- Q-Quê?! - Dani guinchou e saiu andando na direção contrária, tropeçando ao descer as escadas sem nem olhar pra trás pra ver se eu o acompanhava.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Onde histórias criam vida. Descubra agora