Março IV

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Acordei no sábado de manhã parecendo que um meteoro tinha me atingido. Meu rosto tava inchado e vermelho, nem a cor amorenada da minha pele aliviou a situação. Tinha até aquelas bolsas enormes debaixo dos olhos! Meu corpo tava todo dolorido também, pensei até que tinha ficado doente da noite pro dia (literalmente), mas minha mãe disse que eu não estava com febre nem nada. Nem a garganta estava ruim, então só concluí que era cansaço mesmo – físico e mental.

Pensei em ficar em casa, mas foi só eu cogitar em colocar essa ideia pra fora que meu pai apareceu e tirou meu cavalinho da chuva:

– Daqui a pouco vem feriado ai e você vai poder descansar o quanto quiser – ele resmungou alguma coisa, parecia até que estava adivinhando. – Quero só ver esse boletim depois...

Respirei fundo, troquei de roupa e fui pra escola.

Nunca dois quarteirões foram tão compridos em toda a minha vida. Nem as escadas do colégio; era como se eu tivesse pisando em areia movediça, com alguma coisa me puxando pra baixo...

Entrei dentro de sala, abaixei a cabeça na mesa e não quis conversar com ninguém. Tentei prestar atenção à revisão que a professora de literatura estava fazendo, mas eu nem tinha lido o livro que ela comentava, então não adiantou muito. Na hora do intervalo, o Daniel veio me perguntar se eu tava doente e eu só respondi que não, sem dar explicações. Acho que ele percebeu que meu humor não era dos melhores no momento, então me deixou quieto. Só que eu sabia que ele seria o único – se eu fosse almoçar com o resto do time, todo mundo ia cair nas minhas costas pra falar alguma coisa sobre minha aparência ou estado de saúde....

Então resolvi ir almoçar em casa. E, num acesso de brilhantismo do meu cérebro, dar uma desculpa qualquer pra não participar do treino naquela tarde.

Fui à sala dos professores procurar o Nasser, mas lá me disseram que ele estava numa das salas do terceiro ano. Engoli seco, mas que ótimo! A inspetora me disse pra ir procurá-lo porque de lá ele já sairia pra almoçar, então tive que me arrastar até o terceiro andar do prédio. Torci muito, até rezei pra que ele não estivesse na sala A, que era a dos gêmeos, e olhei a sala B antes (o terceiro agora só tem duas classes), mas nada de avistá-lo. Cheguei na porta do 3º ano A e espiei bem escondido mesmo, mas o Nasser estava de frente pra ela e logo me viu. Bela camuflagem, Renan!

Ele parou de conversar com um grupo lá na frente e me fitou – imediatamente todas as cabeças se viraram para a porta também, me olhando dos pés ao último fio de cabelo. Tava todo mundo lá: os gêmeos, o Sander, as meninas que de vez em quando almoçam com a gente, e metade da sala que eu não conversava, mesmo já tendo visto de longe. O Nasser fez um sinal pra que eu esperasse e eu me recolhi de volta pro corredor, sentindo-me ainda pior.

Esperei uns dez minutos. Enquanto isso, algumas pessoas saíam da sala conversando animadamente.

– Nossa, ele é um fofo! – uma das meninas cochichou. – E inteligente! Você viu como ele já tá sabendo tudo de química mesmo dizendo que só estudara um ano da matéria?!

– E educado! Sempre pensei que esses americanos fossem doidinhos da cabeça, mas ele é uma graça!

– E o sorriso dele com aquelas covinhas?! Meu Deus, dá vontade de apertar!

– Ele só devia deixar o cabelo crescer! Você viu a foto que ele mostrou com as irmãs; o cabelo dele é todo bonito! Parece aqueles cantores de boyband!

Com a cabeça encostada na parede, fechei os olhos e deixei as palavras irem passando por mim...

Os gêmeos saíram primeiro, rindo de algo e brincando com as meninas que andavam com eles. Quando me viram, eles me cumprimentaram e tal, mas nem disseram nada sobre minha aparência. Passaram batido, descendo as escadas na maior bagunça. Talvez não estivesse tão visível assim, né? O que me fez pensar que eu teria realmente que mentir pro Nasser me deixar ir pra casa...

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Onde histórias criam vida. Descubra agora