Agosto VII

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A quarta-feira veio regada à cochilos e remédios para dor de cabeça. Passamos quase o dia todo na estrada, todo mundo se recuperando da noitada anterior – e eu do meu capote no quarto, sobre o qual tenho muito poucas lembranças, vou ser sincero. Ninguém comentou sobre a saída tampouco, então isso queria dizer que a moral do pessoal tava lá no chinelo.

Ao chegarmos na cidade mais próxima da capital, umas cinco horas de viagem depois, cada grupo foi para seu devido cômodo e por lá permaneceu, remoendo as dores que o álcool pode causar na alma. Num quarto triplo no sétimo andar, uma cama de casal e duas de solteiro novamente, eu me deixei estirar no colchão maior sem nem conferir se meus colegas de dormitório queriam fazer o mesmo.

Minha ressaca estava pesada. Não só por causa das bebidas do dia (e da cidade) anterior, mas também por que havíamos tido uma conversa esquisita, Sander e eu. No ônibus, naquele caminho, em meio à minha automutilação.

– Gosto de você, gosto do que somos, do que temos... – Sander havia sussurrado no meu ouvido enquanto nos ajeitávamos para cochilar nas poltronas desconfortáveis.

– Eu também. – eu havia respondido. – Bastante.

– Mas você sabe que não vai durar... – ele suspirou e eu balancei a cabeça positivamente. – Então...

Havíamos chegado naquele ponto porque eu perguntei o motivo de não terem saído com o Misael e os outros no dia anterior – os gêmeos estavam putos com o gringo, era visível, e eu não queria deixa-lo em maus lençóis com o resto do time mais do que ele já estava.

Daí que o Sander disse que não via graça alguma de sair para a balada sendo que o único propósito do pessoal era beijar na boca.

– Não quero ficar com mais ninguém aqui. – ele murmurou e, de primeira, não entendi. Mas depois eu entendi. E isso me preocupou um pouco até que soltei:

– Mas se rolar, deixa.

Ele revirou os olhos e se afastou, apoiando os pés no encosto da poltrona da frente. Nós nos fitamos naquele espaço apertado e eu observei as pintinhas do seu pescoço descendo e se escondendo sob uma das minhas camisetas que o intercambista estava usando.

– Não vai deixar de aproveitar a viagem... ou seu tempo todo aqui. – concluí.

– Nem você. – ele disse.

– Então relaxa, não vamos complicar. – eu havia trago-o para junto do meu peito, aninhando-o e beijando seu pescoço cheio de pintinhas, mesmo sob os riscos de sermos pegos em flagrante. – Certo?

Ele não me respondeu nem se afastou, só retornou o beijo e fechou os olhos, deixando nosso cansaço vencer.

Na cama nova, no quarto novo, o sono veio embalado por esses flashbacks, não necessariamente pelo cansaço. Os sonhos confusos me faziam despertar, mas não o suficiente para me acordar, sabe? Era como uma playlist em que a música anterior vai saindo de cena, abaixando o volume, e a próxima vinha por cima, ocupando seu lugar.

E então eu resolvo abrir os olhos. Está escuro, mas consigo ver a silhueta do Sander e do Daniel na janela. Eles estão de pé, os rostos próximos... Ouço uma risada e um shhh insistente em seguida.

Mesmo no torpor do meu sono, a cena é nítida o suficiente para me causar um certo desconforto.

Eles conversam em voz baixa. Me sinto excluído... Eu poderia me mexer e indicar que estou acordado. Tenho quase certeza de que me chamariam para entrar no papo da madrugada, mas não sei se é isso o que quero.

Não tenho certeza do que quero, então ignoro toda a situação e fecho os olhos novamente. Me forço tanto a dormir pesadamente que, no fim das contas, acaba acontecendo isso mesmo. Quando acordo de novo, Sander está deitado de costas pra mim, na cama de casal que, aparentemente, dividimos outra vez.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Onde histórias criam vida. Descubra agora