32 - O fim do mundo - ou - No alto do rochedo, eu me esvaí com o vento

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Vinte e um de dezembro de dois mil e doze. Em algum lugar de um universo paralelo, o mundo acabou. Tenho apenas uma mochila pra colocar nas costas e sair atrás de um local habitável. Quais pertences meus levarei?


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Nenhuma Coca-Cola na geladeira? Nenhum cigarro em cima da escrivaninha? Isto é realmente o fim do mundo, no sentido figurado e no sentido literal.


Já que não tenho estes principais itens pra botar na minha velha bolsa, lembro-me que nela não pode faltar o macaquinho Chico, meu brinquedo preferido de infância, que ganhei quando tinha três aninhos.


Encardido e com um nó cego no rabo, que nunca mais consegui desatar, ele foi o meu companheirinho de todas as horas. Foi ele quem me consolou nos instantes mais difíceis da adolescência, quando namoros foram terminados e paixões, perdidas.


O Sylvinho tinha o ursinho Blau Blau de brinquedo dele e eu tenho o meu macaquinho Chico.


Comida e água, posso achar pelo caminho, mas, outro macaquinho Chico, não reaverei jamais.


Se o Chico não me negou apoio nestes meus trinta e seis anos de vida, não será, hoje, no fim do mundo, que me abandonará.


Que venha o fim do mundo, porém, com o Chico abraçado comigo.


Não desejo procurar um oásis e nem sobreviventes. Espero somente recitar as minhas últimas poesias ao vento e recordar-me dos bons momentos que vivi por aqui. Valeu pelo tempo que durou.


A vida seria breve de qualquer forma... O que há de ruim em ter sido encurtada um pouco mais?


Levo, além disto, um papel e uma caneta pra escrever o que vier à cabeça. Os sobreviventes – se existirem – poderão lê-las.


Transcorrida a nova idade das trevas, da busca por alimento e sexo imediatos, decerto, interessar-se-ão por prazeres mais aprimorados.


A mãe natureza, é claro, despertará neles a esganada demanda pelo básico instinto. É um truque dela pra compelir a espécie humana a procriar e povoar o planeta novamente. Entretanto, após esta fase tão animalesca, o que se restará a fazer?


Os seres humanos não têm apetite só por comida, como cantaram os Titãs, na década de oitenta. A fome é por comida, diversão e arte.


Quiçá, seja este um dos motivos da ruína do Império Vermelho, que acalentou as expectativas por justiça, durante o século XX, quase de ponta à ponta.


Mas, o foco pegou muito fundo nas necessidades básicas do homem... básicas demais. Tão básicas que não satisfizeram o básico a ponto de deixá-lo infeliz e insatisfeito com o Sistema da Esperança.


Nas linhas sisudas do jornal do Partido, não havia um único artigo de humor ou, sequer, um espacinho pra que se narrasse um drama discorrendo acerca da angústia crônica da essência de todos nós.

Eu queria morar na República Tcheca e outras crônicasOnde histórias criam vida. Descubra agora