05 - O taxista que era filho de uma quenga

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Depois de alguns minutos, em frente ao Teatro Municipal, o táxi parou e eu abri a porta. Pensei que não houvesse mais Fuscas sendo utilizados como táxis, em pleno ano 2007. Senti algo esquisito na fisionomia daquele motorista. Eu estou atrasado para a palestra e não posso dar-me o luxo de escolher muito. Entrei no veículo mesmo assim. Aquele bigodinho fino acompanhado de um sorriso insuportavelmente sarcástico de quem pensa que o mundo inteiro é otário e só ele é esperto não estava descendo pela minha goela. Não entendia porque aquele cara não parava de revezar o olhar entre o trânsito e a minha direção. Seu globo ocular não parava quieto, parecia um sono R. E. M., só que com os olhos abertos. Eu tentava permanecer concentrado na leitura do livro, mas aqueles olhos ficavam, vez por outra, fitando-me, como se quisesse pescar alguma coisa.


– Que livro é esse aí na sua mão?


– O Segredo.


– Ah, esse aí que é aquele livro que promete sucesso e dinheiro para pessoas fracassadas?


– Cada um olha as coisas pelo ângulo pelo qual lhe é mais familiar...


– Você conhece alguém que ficou rico lendo esse negócio aí?


– De certo modo, sim.


– Ah, então ele guardou muito bem esse segredo, não é?


Meu Deus, esse homem deve sofrer, parcialmente, de paralisia facial. Ele só sorri com um dos cantos da boca... – pensei.


– Senhor taxista, pode dar-me um cartão seu? Quero sempre usufruir dos préstimos de um profissional bem sucedido.


O "sincero-man", uma espécie de versão maligna de Jorge Kajuru, rasgou a ponta de um pedaço de um exemplar da semana passada do Metrô News – jornal de distribuição gratuita de São Paulo – rabiscou uns garranchos e estendeu para mim.


– Vitório Bom Sucesso?


– É o meu nome.


– É por isso que o senhor despreza tanto esse livro... com um nome desse, quem precisa?


– Esse seu livro é excelente para ficar rico. Os autores ganharam bastante dinheiro com ele.


– Algumas pessoas da minha família também.


– Você tem família?


– Ué! Por que a surpresa?


– Pela sua cara de infeliz, achei que não tivesse.


O trânsito de São Paulo estava aquela maravilha de sempre. E eu, morrendo de vontade de fazer o que mais ninguém pode fazer por mim...


– Senhor Bom Sucesso, eu preciso tirar água do meu joelho, vou aproveitar que está tudo parado e ir naquele jardinzinho ali.

Eu queria morar na República Tcheca e outras crônicasOnde histórias criam vida. Descubra agora