Capítulo 2 - Madeira

24 3 0
                                    

Era incrível, a casa estava exatamente como me lembrava, tirando as teias de aranha e a poeira é claro. O assoalho de madeira polido com verniz, as paredes em tons pastéis, as enormes janelas que davam no jardim ao redor da casa, a lareira de pedras, a escada também de madeira, até mesmo meu quarto, com os mesmos lençóis que usei na noite de três anos atrás.

Me sentei na beirada da cama e encarei a parede coberta de fotos imprimidas de bandas que eu gostava na época. Minha consciência vacilou por um instante mas por sorte a voz de minha mãe me tirou do transe.

- Pessoal! Desçam aqui em baixo um instante!

Eu e Coraline chegamos até a cozinha onde encontramos nossa mãe picando rabanetes.

- O que foi? - Ela foi até o armário da cozinha e pegou uma espécie de caixa de ferramentas.

- Vocês vão me ajudar em algumas atividades esta noite... - Ela me entregou um chaveiro e para Coraline, uma colher. - Sebastian, acho um pouco perigoso você sair sozinho já que está quase escurecendo, mas o caseiro esqueceu de buscar lenha nova. Vá no celeiro pegar um machado e corte apenas as árvores mais jovens ao redor da casa.

- Eu também quero ajudar mamãe! - Coraline declarou subindo na banqueta.

- Mas é claro! Você vai misturar a massa da torta para mim! - Minha mãe carinhosamente beliscou o nariz dela.

- Mas e a Mel, mamãe? Ela não vai ajudar? - O olhar de minha mãe se distanciou por um instante.

- Não querida, a Mel se cansou muito pela viagem e deixei que ela ficasse descansando no quarto. Agora vá lá na dispensa pegar uma garrafa de leite para mim! - Coraline desceu da banqueta e correu alegremente para a dispensa.

- É aquele problema de novo? - Perguntei baixinho e a expressão de alegria de minha mãe mudou para preocupação.

- Sim... Eu já imaginava que vir para cá não iria fazer bem a ela, mas tive esperança que ela pudesse ficar feliz pelas boas lembranças.

- Parece que ocorreu o contrário... -  Eu disse pouco antes de Coraline vir correndo até a frente da bancada com a garrafa em mãos.

- Aqui mamãe! - Ela finalmente sorriu e delicadamente pegou a garrafa das pequeninas mãos.
- Muito obrigada querida!

Coloquei minhas botas e o casaco e saí para fora, a neve caía tranquilamente e as primeiras estrelas já davam as caras.

Caminhei até o antigo celeiro nos fundos da casa e levei quase cinco minutos procurando a chave certa para finalmente conseguir entrar. Olhei ao redor e perdi o equilíbrio ao ver em um canto o antigo trenó que papai havia feito para nós quando eu e Melanie éramos pequenos, nós o chamávamos de raio de fogo. Sorri ao relembrar tantas tardes em que nós quatro passamos com ele. Limpei as lágrimas que escorriam por meu rosto e fui até o fundo do celeiro onde ficavam as ferramentas, peguei o machado e fui para fora.

Caminhei aproximadamente dez minutos até encontrar a árvore ideal, na descrição de minha mãe. Segurei firme o cabo do machado e golpeei o tronco até estar fracamente firmado na base, empurrei o tronco o qual caiu por cima da neve.

- Pronto ! Isso sim é um lenhador experiente ! - Disse para mim mesmo depois de ter cortado o tronco em barras. Olhei para aquelas barras e me perguntei como faria para levá-las para casa. " Mas é claro! O trenó! ", voltei correndo para o celeiro e tirei o lençol velho de cima de Raio de fogo, limpei a camada de poeira de cima e o puxei, funcionava perfeitamente.

- Ao trabalho parceiro. - O empurrei dentro da floresta até o ponto em que minhas lenhas estavam, as coloquei de uma em uma no trenó e quando estava pronto para partir ouvi uma risadinha de criança. Olhei ao redor.

- Coraline? Você me seguiu sua danadinha? - Andei lentamente por entre as árvores já preparado para encontra-lá escondida atrás de uma delas. Mas o que vi foi diferente.

Em um dos antigos troncos caídos estava sentada uma garota de costas para mim, ela parecia usar um tipo de camisola branca. O que mais me surpreendeu foi seu cabelo liso e preto na altura do ombro, exatamente igual ao de Melanie.

- Mel? É você? - Minha mão estava prestes a tocar seu ombro quando ouvi um barulho no trenó, de súbito me virei e encontrei minhas lenhas jogadas no chão novamente, quando me virei para a garota que eu tinha certeza ser minha irmã,  ela havia sumido, olhei ao redor e não a encontrei.

Resmunguei e recolhi as lenhas, empurrei o trenó e ao chegar em casa coloquei algumas na lareira da sala.

- Uau... Parabéns meu rapaz, perfeito ! - Minha mãe disse e me entregou um biscoito, sorri e sacudi minhas mãos, o pegando e o mordendo.

- Sim, mais a Mel bem que podia ter me ajudado, não ficando fazendo mistério no meio da floresta, de camisola ainda por cima! - Ela me olhou preocupada.

- Como assim? A Melanie não saiu do quarto hora nenhuma...

- T-tem certeza? Eu a vi... - Encarei meus sapatos.

- Querido, deve ser uma de suas alucinações. Eu disse para não parar de tomar seus remédios. - Ela se sentou ao meu lado e apoiou a mão em minhas costas.

- É que tinha parado... Pensei que não precisasse mais. - Ela beijou minha testa.

- Tome hoje esta bem? Ah, e vá acordar sua irmã, o jantar está pronto.

Andei pelo corredor e girei a maçaneta. Melanie estava sentada de frente a janela penteando os cabelos. Ela estava vestida exatamente igual a garota que minha mente viu na floresta.

ImaginariumOnde histórias criam vida. Descubra agora