BANCÁRIOS EM GREVE

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Você me assusta, ela disse


Oh, é isso o que amor faz, pensei,

enlouquece as pessoas

tornam-nas dramáticas,assustadoras,

como se o mundo fosse acabar

caso não haja mais meios para amar.

e era nesse drama em que eu me arrastava

pelas ruas da cidade,

vertendo lágrimas

e secando-as,envergonhado.

que diabos, as pessoas vão me julgar

um doido, um órfão,vão me oferecer caridade

mas então eu lembrei dos mendigos:

todos os julgam abandonados

todos os julgam miseráveis

atire a primeira pedra quem não.

lembrei deles e lembrei

de como as pessoas simplesmente

passam por eles.

passam, os julgam, se comovem

e não ajudam

eu sei, eu mesmo já o fiz várias vezes.

ainda faço.

vamos passando a bola da caridade

as pessoas vão passando a bola da caridade

umas pras outras

e, céus, como demora,

mas como demora até que chegue

nos mendigos.


então, naquele dia, eu decidi:

iria encontrar um morador de rua

bater um papo com ele,

dar-lhe um biscoito,

é isso, ele é um dos nossos,

vamos lá, eu tinha uns trocados.


segui o fluxo

segui a correnteza da multidão.


"BANCÁRIOS EM GREVE",

dizia um cartaz colado nas portas

de um banco fechado.

eram 17:46hrs.

um homem estava estirado ali em frente.

pedia esmolas. as pessoas não olhavam.


segui o fluxo

segui a correnteza da multidão.


não foi dessa vez,

sinto muito.


cheguei em casa,

não havia ninguém,

me pus a chorar.

as lágrimas rolando

salgadas, chegando à boca.

não havia ninguém olhando

não precisava secá-las.





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