Alma Iluminada

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Ar. Água. Terra... e Fogo.
  Quatro elementos que somente o Avatar pode dominar. Somente ele, a porta entre os dois mundos, pode trazer a paz e o equilíbrio a um mundo repleto de monstros.
  Eu vi uma garota.
  Uma bela garota de cabelos castanhos e olhos verdes. Parecia ter doze anos. Ela brincava com a irmã mais nova no jardim do palácio. As duas corriam para os lados, brincando de pique-esconde.
- Te peguei, Asore!
  Asore abraçou a irmã.
- É, maninha - e riu.
  Do topo de escadas, o irmão mais velho das duas chamou. Ele tinha quinze anos e era um ótimo guerreiro, sempre sério. A diferença era que dessa vez ele estava mais sério que antes.
- Asore! - ele chamou. - Os mestres querem te ver!
  Asore franziu a testa.
- Tudo bem, né... - se virou para a irmã. - Depois eu te chamo para brincarmos mais, Misa.
  Ela subiu as escadas do palácio para a sala do conselho, onde o seu pai, o rei da terra, a esperava com os conselheiros.
- Asore, querida. Sente-se, por favor.
  Ela olhou para os lados, confusa. Sentou-se.
- Eu fiz algo errado?
  O pai riu.
- Não, meu bem. Você não fez nada de errado.
- Nós te chamamos aqui para te dar uma notícia importantíssima - disse um dos velhos conselheiros.
  Foi naquele dia que me disseram quem eu era. Que eu era o Avatar.
  Abri os olhos e me vi dentro de uma água celestial, em pé de frente a um espelho. Eu brilhava em um tom azul, enquanto que meu reflexo mostrava Asore colorida de roxo. Seus cabelos flutuavam ao redor em várias direções. Um de seus olhos estava totalmente escuro e sua roupa era a mesma de Oni.
- O que aconteceu depois? - perguntei.
  Ela sorriu.
- Não foi nada fácil. Minha vida mudou completamente. Eu nunca mais tive tempo para minha irmã e minha família. Era só treino, treino e treino.
- Era isso que eu temia quando descobri ser o Avatar.
- Então temos algo em comum - Asore respirou fundo. - Foi naquela época que o Ty começou a explorar as selvas e conheceu a Ada. Ele sempre foi muito livre, por isso abdicou do trono e deixou com a Misa, já que eu não podia assumir.
- Então os dois além de serem irmãos, são seus irmãos?! - aquilo de repente era algo incrível de se ouvir.
  Asore fez que sim.
- Conforme o tempo passou e eu treinei dominação de terra e ar, Misa teve um pouco de inveja e ciúmes de mim.
  Voltando às visões, vi Asore treinando. Haviam os treinadores de dominação de terra e ela se movia rapidamente, dominando a terra e as pedras contra eles enquanto Misa observava.
- Você está ficando cada vez melhor, meu bem - disse o pai de Asore, o rei.
  A família estava reunida à mesa, apenas Ty estava de fora.
- Naquela época, Ty viajava pelo reino da terra - complementou Asore.
  Já na visão...
- A Asore estava treinando dominação, papai - disse Misa. - Por que eu não posso, também?
  O pai fez uma careta para ela.
- Ela é o Avatar, minha filha. Ela deve aprender os elementos.
  A irmã de Asore a olhou com uma cara feia.
- É tudo culpa sua! - e saiu da mesa, irritada.
- Espere um pouco, Misa - a Avatar correu atrás da irmã, que estava chateada. - Misa, espera aí! Não fica desse jeito!
  Estava chovendo do lado de fora, logo, Misa estava chorando e com os cabelos molhados. Àquela altura ela já tinha quinze anos.
- Me deixa em paz, tá? Já não basta você ter me abandonado, agora tem que ser o Avatar?!
- Eu não tenho culpa de ser o Avatar, irmã. Por favor, tente entender! - Asore, de repente, voltou a ser roxa. - Naquele dia Misa fugiu de casa e se refugiou no pântano. Demorei quase uma semana a procurando, mas eu tive uma ajuda.
  Encontrei três garotos caminhando por lá. Um era gordo, outro magrelo e outro mais forte. Os três tinham cabelos escuros e olhos verdes, uma característica típica do povo da terra.
- Avatar Asore? - perguntou o mais forte. - Me chamo Kehlan, e sou seu maior fã!
  E foi aí que eu o conheci; era o mais bonito dos três e o mais atraente. Ino era muito magro e tímido, enquanto que Saitama era mais gordo e mais baixo, também tímido, mas ele era o que mais falava.
- Não, eu sou seu maior fã! - disse ele.
  Revirei os olhos.
- Acho que a Avatar não veio até aqui para ver fãs, garotos - disse Ino, sempre inteligente.
  Fiz que sim.
- Minha irmã fugiu e se escondeu por aqui. Estou procurando há uns dias, mas... eu não sei como achá-la. Estou perdida.
  Saitama riu.
- Muitas garotas se perdem por aqui, e nossa maior missão é levá-las de volta.
  Kehlan me olhou com aquele olhar sedutor.
- Por favor, poderia nos dizer como sua irmã é?
  Naquela época eu não tinha percebido, Reina, mas Kehlan era um calculista dos melhores. Modificava sua abordagem para seduzir e manipular as pessoas dependendo de como elas se saíam. E eu fui manipulada.
  Percorremos um grande caminho pelo pântano, procurando por Misa. Havia se passado muito tempo, e sabe-se lá o que ela estaria sentindo. Eu estava preocupada, mas Saitama me fazia rir, Kehlan me dava confiança e Ino me acalmava com sua lógica.
- Sua irmã pode ter desenvolvido alguma habilidade de dominação de plantas e sobrevivido.
  Eu ri. Parecia impossível, mas eu sempre via Misa mexendo no jardim real, em sintonia com a natureza. Ela gostava de tudo aquilo.
- É, eu a vi várias vezes andando pelo palácio.
- Ela sempre gostou daquilo tudo, entende? Quanto mais tempo eu treinava, mais tempo ela ficava por lá.
  Procuramos por várias horas e chegamos a dormir no pântano, fazendo uma fogueira à noite.
- E como é que é ser o Avatar? - perguntou Saitama, com os olhos brilhando.
  Dei de ombros.
- É normal. As pessoas me tratam como uma princesa, e meio que eu já sou uma - ri um pouco. - Mas eu não vou me sentir verdadeiramente o Avatar até que eu saiba todos os elementos e saia para trazer o equilíbrio ao mundo.
  Kehlan me sorriu com aquele seu jeito.
- Quantos elementos?
- Terra e Ar - respondi. - Digamos que só vou pro próximo nível quando aprender tudo.
  Ino ajeitou os óculos.
- Você não liga de largar a realeza para viajar?
  Balancei a cabeça, negando.
- Nunca gostei da realeza. Sempre me senti melhor com o povo.
  Kehlan fez uma expressão sombria.
- Eu preferiria a realeza - e mordiscou uma maçã-morango. - Já passei fome; é horrível.
- Ah, nossa - me comovi. - Eu sinto muito.
  Ele balançou a cabeça.
- Não sinta. Já passamos por essa fase, não é, garotos?
  Os outros dois assentiram.
  Logo nós achamos Misa. Ela estava em uma das raízes da grande figueira, dormindo. Eu a acordei e a abracei. Ela estava apenas carente e precisava de amor.
  Eu não sabia, mas ela tinha aprendido muita coisa no tempo que tinha ficado lá.
  Com o tempo, eu e os garotos ficamos cada vez mais chegados. Nos tornamos amigos fiéis e companheiros dos melhores. Eu sempre os amei muito.
- Vocês passaram quanto tempo unidos?
- Acho que cinco anos, Reina. Nesse tempo eu consegui perceber muitas coisas sobre eles. Percebi que o Kehlan tinha uma revolta contra a realeza, o que fazia mal a ele. Saitama não se aceitava por sua compulsão em comer e Ino tinha baixa auto estima. Eu consegui ajudá-los a melhorar. Treinei o Sai e o ajudei em sua alimentação, enquanto que ensinei Ino a ser melhor em vários aspectos.
  Foi naquela época em que encontrei e adestrei Gumiho.
- Você sabia que eles eram apaixonados por você?
- Saitama tinha um amor mais de irmão, que acredito ter se transformado em algo maior depois. O Ino sempre me viu como amiga, mas o Kehl... Eu percebi que ele tinha um ciúme estranho comigo. Era controlador e obsessivo.
  Arregalei os olhos.
- Ele é o Oni!
  Fiz que sim.
- Quase. Mas se puder esperar, eu te explico melhor.
  Foi quando algo aconteceu.
  Encontrei os garotos na entrada da floresta. Eles pareciam estranhos, como se tivessem matado alguém.
- O que houve?
  Eles engoliram em seco.
- Encontramos algo na floresta - disse Kehlan.
  Franzi a testa.
- O que?
- É melhor você ver - me disse Saitama.
  Adentramos à floresta, escura e densa do pântano. Parecia diferente, como que corrompida e sombria. Algo estava errado.
- O que querem me mostrar? - perguntei. - Estou ficando assustada!
- Fique calma, Asore - me disse Kehlan. - Não é algo tão ruim.
  Mas era.
  Foi quando chegamos a uma espécie de altar na densa floresta, revestido de madeira podre e plantas escuras. Era uma pequena caixa.
- O que é isso, garotos? - eu sentia uma energia terrível a emanar daquela caixa.
- É uma caixa antiga! - disse Ino, entusiasmado. - Encontramos em uma de nossas caminhadas.
  Olhei para Kehlan.
- Por que querem me mostrar isso?
- Essa caixa contém pergaminhos antigos de dominação de sombra - ele abriu a caixa e eu senti-me pior ainda. Kehlan me mostrou um dos pergaminhos; velho, sujo e com desenhos estranhos. - Veja! As escritas dizem que qualquer um pode aprender a dobra.
  Recuei um passo.
- Eu não tenho um bom pressentimento sobre isso!
- Como não? - me perguntou Ino. - Finalmente podemos nos tornar dominadores!
- Isso é loucura! Não podem fazer isso. São sombras, não vento, não fogo. Sombras!! Existe um motivo para essas técnicas estarem perdidas!
  Eles não me ouviram e então brigamos.
- Que história triste... O que houve depois?
  Não os vi por algum tempo. Apenas treinei, treinei e me vi numa situação complicada quando Kehlan começou a sair com a Misa. Ela estava claramente apaixonada por ele e eu percebi que ele não era mais o mesmo. Ele estava sombrio e frio, enquanto os outros dois garotos estavam ficando cada vez mais tristes.
- Qual foi, Saitama? - perguntei em certa ocasião. - O que houve com vocês.
  Saitama se levantou, triste. Ele só disse poucas coisas, mas foi o suficiente para me quebrar.
- É o Kehlan, Asore... É o Kehlan.
  Não consegui dormir por dias e isso me deixou vulnerável a pesadelos enquanto acordada. Eu estava ficando louca.
  Ver Misa saindo com Kehlan me destruía, não por ele, mas por ela. Não queria que ela se metesse com ele.
  Foi quando Kehlan invadiu meus sonhos.
- Você já me esqueceu, Asore? Não me esqueça. LEMBRE-SE DE MIM!!
  Eu acordava suada todos os dias e mal dormia. Não conseguia treinar e estava entrando em depressão.
- Querida... - disse minha mãe. - Coma um pouco.
  Eu olhava Misa com Kehlan do lado de fora do palácio e me sentia cada vez pior.
  Minha mãe percebeu.
- São eles, querida? Eu sinto muito se você gostava dele, mas...
- Eu não gosto dele, mãe! - me levantei. - Estou sem apetite!
  Em todos os bailes reais eu tinha que ver minha irmã com aquele desgraçado que havia se dito meu amigo. Ele ainda invadia meus sonhos e me olhava durante os bailes.
  Bebi um pouco e perdi o medo de falar com ele.
- Qual é a tua? - Misa tinha ido falar com alguém e ele estava sozinho. - É uma técnica essa de invadir sonhos, é?
  Ele sorriu enquanto bebia vinho.
- Gostou? É uma das técnicas perdidas das quais você desdenhou. Eu posso fazer coisas incríveis com essa habilidade.
- Como me assustar? Pode esquecer!
  Misa chegou, confusa por nos ver juntos.
- Sobre o que estão conversando? - perguntou, ingênua.
- Nada - respondeu ele, cínico.
- Estamos terminados.
  E saí de cena. O que eu não sabia era que naquele momento, eu havia reacendido a obsessão de Kehlan por mim, além dos ciúmes da minha irmã.
- Qual é a sua, hein? - ela me pegou desprevenida. - Está afim do Kehlan?
  Franzi a testa.
- O que? Não! Misa!
  Ela então colocou um dedo na minha direção.
- Você que fique longe do meu namorado!
  Mas eu não obedeci, fiquei ainda mais de olho em Kehlan. Eu imaginava que Misa tinha algo passageiro por ele, mas naquele momento eu vi que ele havia a manipulado.
  Ele saiu cedo da festa e seguiu para a floresta. Eu estranhei e o segui, sendo o mais silenciosa possível.
  Ele parou no mesmo lugar aonde a caixa das sombras foi encontrada. Estranho, pois o local ficava a horas do palácio.
  Foi quando uma figura sombria surgiu à frente de Kehlan.
- Você conseguiu o Avatar? - sua voz parecia ecoar em minha mente, algo bizarro e sombrio.
- Estou trabalhando nela, mestre! Logo terei toda a energia que você precisa, pois ela está logo atrás de mim.
  Arregalei os olhos. Tinha sido descoberta.
  Quando Kehlan se virou para mim com seus olhos negros, percebi que ele atacaria com suas técnicas sujas.
  Tentei atirar uma pedra com dobra de terra, mas não funcionou. Tentei várias outras vezes, sem sucesso.
- Espera um pouco... - falei.
  Quando abri meus olhos, eu estava deitada de bruços no jardim do palácio em cima de alguém, com os cabelos soltos e bagunçados.
- Você estava no mundo espiritual!
- Sim, Reina. E não foi só isso.
  Quando eu percebi, estava em cima de Kehlan em uma posição desfavorável. Todos estavam nos olhando, inclusive Misa.
- Vocês são sujos! - e correu para dentro do palácio.
- Que decepção - me disse minha mãe.
- Que droga, Asore! - exclamou Ty.
  Me virei para Kehlan e o vi com aquele sorriso cínico. Ele havia pensado em tudo. Invadido minha mente e me feito imaginar estar seguindo-o para me destruir perante minha família e amigos.
  Agora era guerra.
  Minhas dias seguintes foram solitários. Só Gumiho e eu, indo de lugar em lugar. Não aguentava mais o palácio e aqueles olhares tortos. Decidi ir treinar longe dali.
  Mas as coisas não foram tão boas, pois Kehlan começou a me atentar novamente, aparencendo em meus sonhos e pesadelos, me atormentando.
  E em um desses sonhos eu vi ele pegando Misa como prisioneira.
- Me ajuda, Asore!!! - ela chorava. - Me salve!! Socorro!!!
  Me convenci ser uma mentira dele para me impedir de treinar, para me fazer voltar após tanta perturbação.
  Mas eu estava errada.
  Caminhando por Ahren, ouvi notícias de que a princesa Misa havia desaparecido.
- É um ultraje, não? - Saitama me perguntou do meu lado. Foi uma surpresa encontrá-lo ali, mais velho, barbado e com roupa de cozinheiro. - Ela era uma amiga minha.
  Ele não havia me reconhecido, mas quando olhou para trás e viu Gumiho, arregalou os olhos. Ele não era o único a se surpreender com ela.
- Asore?! - ele me abraçou forte.
- Olá, SaiSai - abracei com a mesma força. - Decidiu ter uma vida nova aqui?
  Ele fez que sim.
- Larguei o Kehl e o Ino. Eles estavam me enchendo o saco com aquelas histórias malucas e técnicas estranhas.
  Franzi a testa.
- Que histórias?
  Saitama me contou que Kehlan estava devoto a um antigo mestre de sombras chamado Oni. O verdadeiro Oni. Ele havia vivido cerca de nove mil anos atrás, na era antes do primeiro Avatar surgir.
  Oni vivia numa cidade tartaruga-leão que flutuava por aí. Era a tartaruga renegada, feia e sombria, lar dos ladrões e exilados. Quando alguém era expulso de sua cidade tartaruga-leão, podia achar abrigo nela.
  Seus pais eram antigos ladrões mercenários exilados que havia se casado e o tido. Porém aquela cidade era perigosa, pois vivia num ambiente anárquico.
  Quando se tornou adulto, Oni fugiu da tartaruga-leão e foi se aventurar pelo mundo dos espíritos. Infelizmente sofreu poucas e boas, pois os espíritos não eram amistosos.
  Passou fome e frio, sobrevivendo de insetos e animais. Se tornou um selvagem e, por sua revolta contra o mundo, um louco.
  Foi quando, acidentalmente o Avatar Wan libertou Vaatu, o espírito das sombras e caos de Raava, o espírito de luz e ordem, que ele se cruzou com o primeiro.
  Vaatu estava tão grande e poderoso que não percebeu ter atravessado-o com uma parte de seu corpo, passando para Oni parte de seus poderes.
  Foi aí que a técnica de sombras nasceu. Oni a desenvolveu e a guardou numa caixa. E após morrer, depositou seu espírito na caixa para o primeiro que a abrisse.
- Uau. Então ele teve ligação com o Avatar Wan.
- Não necessariamente. Mas sabendo dessa história, eu entendi o que estava acontecendo.
  Oni manipulava Kehlan para ter um hospedeiro. E quem melhor que o próprio Avatar para isso, não? Corrompendo Raava, Vaatu, o criador de Oni, teria uma chance após ser preso por Wan.
  Voltei para Beifong e dei de cara com minha família desesperada. Contei a eles o que Kehlan poderia ter feito, mas eles pareciam não me ouvir.
- O que fez com eles? - perguntei.
  Kehlan riu.
- Estão cegos por seu próprio desespero - levantou as mãos em rendição sarcástica. - Eu juro... Haha.
- Deixe-os ir. É a mim que você quer.
  Ele sorriu.
- Tem razão... mas não é o suficiente, Asore. Eu quero mais que sua alma e seu amor, como quero isso - apontou para o palácio. - Eu quero governar ao seu lado.
- Vai ficar querendo! - cuspi em sua roupa bonitinha.
  Ele fez uma cara feia.
- Então acho que ela vai passar por maus bocados por sua causa! - das sombras ele puxou Misa, que, em desespero, gritava por socorro. - Tem até a meia noite para me encontrar no pântano, justamente aonde encontramos a caixa. Você terá uma ajuda do meu mestre.
  E então ele se desfez em sombras.
  Decidi contar ao Saitama.
  - Você não pode se entregar, Asore! - pediu.
  Ele me abraçou, chorando. Eu sentia seu amor e lealdade. Podia fazer tudo para me ter em seus braços a vida inteira, mas ela parecia disposta a se sacrificar por algo.
- Eu preciso de ajuda, SaiSai, mas não é da sua, me desculpe - o beijei no rosto. - Terei que ser paciente e esperar até minha próxima vida.
  Ele chegou a catarrar de tanto chorar. Senti pena do jovem Saitama.
- Então... Então você vai morrer, Asore?!
  Fiz que sim.
  Então, quando deu a meia-noite, cheguei até a porta do pântano, cavalgando em Gumiho. De uma hora para outra eu estava dentro do pântano, como que por mágica.
  Foi então que eu me despedi de minha fiel companheira.
  - Eu vou te deixar aqui, Gumiho - chorei -, mas um dia, talvez, eu volte para te buscar. Só te peço que não me deixe destruir tudo o que tanto quis construir.
  A abracei no pescoço e ela, então, chorou. O velho choro de animais, seja cães, lobos... ou raposas. Como planejado, ela foi embora.
- Mas te esperou até eu a encontrar.
  Fiz que sim.
- Eu me arrependo até hoje de fazê-la esperar, Reina.
  Mas então, na visão, Kehlan apareceu atrás de mim.
- Ora, ora, ora quem apareceu! - dessa vez ele parecia mais psicótico que nunca. - Decidiu então dar a vida por sua irmã?
  Fiz que sim.
- Faça o que quiser comigo... só não machuque a Misa!
  E ele fez. Me preparou para uma espécie de ritual. Queria passar toda a energia de Oni para dentro de mim, por algum motivo que hoje eu entendo.
  Ele me segurou nos braços e deixou que todas aquelas sombras se apoderarem de mim. Doía; eu me sentia ferida por dentro. Eu comecei a gritar de dor enquanto ele ria.
  Foi quando comecei a sentir pensamentos estranhos e uma voz feminina ecoar em minha mente.
  Lute, Asore. Você pode!, era Raava.
  E foi então que eu vi, pela última vez, o olhar triste e sincero de Kehlan. Seu último resquício de piedade e amor por mim.
  Antes que esse momento terminasse, eu lhe dei uma cabeçada e o prendi num esquife de pedra.
  Comecei a correr, cansada. Era a visão em que fugia de um garoto na chuva.
- Asore! Espere, Asore, meu amor! - ouvi a voz de Kehlan ecoar em sintonia com o barulho da chuva.
- Me deixe em paz! - ela dominou a água da chuva, girou em anel e atirou na direção de quem corria atrás dela.
  Ele foi atingido pela água e caiu para trás.
  Continuei a correr, com medo.
- NÃO FUJA DE MIM, ASORE!! - gritou ele.
  Foi quando gritei e caí. Senti como se alguma coisa tivesse agarrado em minha perna e a puxado.
  Foi quando Kehlan me agarrou pelos braços e a olhou nos olhos. Ele parecia um maníaco e louco.
- Você vai ser minha, Asore!
- Me solte, Kehlan! - ela tentava se soltar, mas ele a prendia com sombras.
  Eu não sabia o que acontecia em meu corpo e alma naquele momento. Só sei que Kehlan me forçou um beijo e pude sentir as sombras entrando cada vez mais dentro de mim.
  Lute, Asore! Por nós! Por toda a geração de avatares antes de você!
  Desista, Asore! Por mim! Você não é capaz de vencer a pressão!
  Foi quando fiz a escolha mais difícil da minha vida: sucumbir às sombras. Antes, infelizmente, entrei no Estado de Avatar e o desliguei logo em seguida.
  De alguma forma eu havia morrido.
- Asore? - me chamou Kehlan; logo ele ficou desesperado. Me chacoalhava em seu colo, mas eu já tinha ido.
- Como isso pode acontecer se você está viva? Nós não podemos coexistir!
  Assenti.
- De alguma forma eu enganei a morte e o sistema dos avatares. Forjei uma morte com uma técnica sombria que aprendi ao sugar memórias de Kehlan durante o beijo. Ao fazer isso, o espírito de Raava foi obrigado a deixar meu corpo e renascer em você. Algum tempo depois eu renasci como Oni, da forma como Kehlan queria e não queria.
  Pude sentir todos meus familiares durante o meu enterro. Pude ver o casamento de Kehlan e Misa e a forma como ele manipulou a todos para se tornar rei.
  Saitama fez o mesmo e virou imperador de Ahren.
  Tudo continuou daquele jeito; acredito que só Ty tenha acreditado na minha morte por sombras e decidiu investir em dominação de luz.
  Tudo se seguiu de uma forma comum, enquanto eu seguia com um fardo, um novo espírito dentro de mim. O espírito do Oni.
  E agora, Reina, que você sabe o que me aconteceu e quem eu sou, se prepare para a batalha final.

Avatar - A Lenda de ReinaOnde histórias criam vida. Descubra agora