Três minutos depois de ter lido a carta do ilustre secretário da Marinha,
caçar aquele monstro inquietante e livrar os mares de sua constante
ameaça tornara-se o único objetivo de minha vida. A oportunidade de
participar daquela caçada me empolgou.
No entanto, eu estava cansado e precisando de repouso. O meu maior
desejo era rever o meu pais, os meus amigos, o meu pequeno aparta-
mento do Jardim Botânico, em Paris, as minhas preciosas coleções.
Mas nada me deteve. Esqueci tudo: fadigas, amigos, conforto, e aceitei,
sem mais reflexões, a oferta do governo americano.
- Conselho! - chamei com voz impaciente.
Conselho era o meu criado. Tratava-se de um rapaz dedicado que me
acompanhava em todas as minhas viagens, apto para todo o serviço e
que, apesar do seu nome, nunca dava conselhos mesmo quando não lhe
eram pedidos. Era uma excelente e honesta criatura.
- Conselho! - chamei-o de novo, começando os meus preparativos
para a viagem, com grande agitação - Prepare-se, meu rapaz, partimos
dentro de duas horas.
- Vamos para Paris? - perguntou ele.
- Sim... certamente... mas dando uma volta primeiro - respondi.
- Daremos a volta que o senhor quiser - concordou o criado.
Não será uma grande volta. Trata-se de um caminho menos direto.
Vamos embarcar na "Abraham Lincoln".
- Se é a sua decisão, para mim é a melhor, senhor - disse ele.
- Vou lhe dizer a verdade, meu rapaz. Trata-se do monstro marinho.
Vamos livrar os mares da sua presença. O autor de uma obra importan-
te, sobre os "Mistérios dos Grandes Fundos Submarinos", não poderia
deixar de embarcar com o Capitão Farragut. Missão gloriosa, mas
perigosa também. Não sabemos para onde vamos. Esses animais são
seres caprichosos. Mas, ainda assim, vamos. Temos um comandante
que não tem medo de nada.
- O que o senhor fizer eu também farei - disse ele.
Um quarto de hora depois as nossas malas estavam prontas. Em pou-
cos minutos chegávamos ao cais. As chaminés da "Abraham Lincoln"
soltavam na atmosfera torrentes de fumaça negra. Subimos a bordo e
um dos marinheiros conduziu-nos ao tombadilho. Conselho caminhou
para a amurada e eu fui levado à presença de um oficial de aspecto
agradável, que me estendeu a mão:
- Sr. Pierre Aronnax? - perguntou-me.
- O próprio - respondi. - O Comandante Farragut?
- Em pessoa. Seja bem-vindo, Sr. Professor.
Após os cumprimentos de praxe deixei o capitão entregue ao seu
trabalho e me encaminhei para a cabina que me estava reservada. A
arrumação interior da fragata correspondia às suas qualidades náuticas.
Fiquei muito satisfeito com o meu alojamento, situado à ré e comunican-
do-se com a sala dos oficiais. Deixei Conselho a arrumar conveniente-
mente as nossas coisas e subi à coberta a fim de assistir aos preparati-
vos da partida.
As oito horas da noite, navegávamos a todo vapor nas sombrias águas
do Atlântico.