Part 2

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   Descer do avião, seguir a fila e retirar a bagagem foi fácil, mas e agora? Não via meu pai a mais de 10 anos e certamente não seria ele a me buscar, saquei minha arma super poderosa do bolso, vulgarmente chamada de celular e catei meu aplicativo mágico de palavras em coreano, encaixei o fone no ouvido e fui guiando lentamente o carrinho de bagagens super lotado por entre as pessoas em busca de algo como uma placa com meu nome, uma pessoa diferente no meio da multidão, um anjo, um sinal divino, uma fada, quem sabe a sininho? Fui arrancada dos meus pensamentos brincalhões no meio da crise por uma algazarra estranha, gritos histéricos, palavras desconexas que eu mal conseguia identificar como sendo humana e passos apressados se aproximando de mim, então.. se aproximando, se aproximando..realmente perto e..

 - Aiii, O que é isso? O rapaz se levantou com uma expressão atônita no rosto e esticou a mão para que eu me levantasse, sua mão era suave, macia como de uma lady, mas seus olhos eram sagazes agora que já havia se refeito do susto. Falei em inglês tentando lembrar que não poderia mais usar o meu português querido e pra meu deleite parece que ele entendeu. - Estou bem, mas se você tem motivos pra correr, continue porque alí vem uma multidão. Apontei para frente onde uma massa de adolescentes loucas se aproximavam e ele sem voltar o olhar pra mim iniciou uma corrida louca digna de um maratonista. 

  Não ouvi sua voz nem vi seu rosto já que estava coberto por uma máscara cirúrgica preta, mas uma coisa posso dizer, aquela calça preta e camisa coladinha mostrava um corpo bem interessante e o olhar era predatório embora os olhos fossem bem puxadinhos. Ele corria e eu ria daquela multidão correndo atrás dele, imaginei que se no brasil houvessem ladrões assim então eu seria advogada. Ri com meu pensamento e me dirigi a saída pronta pra pegar um táxi, mas antes que pudesse chegar lá meu braço foi agarrado por um homem estranho.


- AH! - Exclamei espantada com o súbito puxão que fez com que eu perdesse meu equilíbrio batendo violentamente no meu carrinho super lotado  e fazendo com que o mesmo continuasse o caminho desvairadamente até chocar com o carrinho de outra pessoa. Como desgraça pouca é desperdício, a minha mala rosa caiu do carrinho e espatifou-se de quina no chão fazendo com que de alguma forma mágica o lacre rompesse e eu atônita via minhas peças íntimas e super sexys espalhadas pelo chão do aeroporto.

- Desculpa, senhorita Marina? - O homem havia falado um inglês esquisito mas reconheci o meu nome, eu assenti mas me encaminhei diretamente para o local do desastre e rapidamente me ajoelhei a fim de recolher todas as peças espalhadas. Fui ajudada por uns dois seguranças que estavam por perto que evitavam me olhar e com expressão bem séria terminaram o serviço rapidamente. Agradeci envergonhada e recuperei meu carrinho pedindo desculpa ao casal que teve o seu próprio carrinho de bagagem agredido pelo meu. Mais vermelha do que pimenta malagueta eu levantei o olhar e pela porta aberta da saída do aeroporto vi quando o mesmo mascarado que havia trombado comigo no saguão entrava em uma van toda preta, ele parecia se divertir com algo enquanto desgraçadamente o segurança que me ajudou corria de encontro a ele e lhe estendia algo que se muito não me engano parecia muito com a minha calcinha Victoria Secret que ganhei no natal, para depois entrar na van junto com o mascarado. Me virei para o homem pequeno e envergonhado que me olhava enquanto pedia desculpas repetidamente e perguntei


- Pra onde?

 O homem que havia se identificado como Chin, acreditem eu achei que ele estava espirrando quando me disse o nome, mas então ele repetiu algumas vezes e eu entendi que era o nome dele mesmo, me disse que eu deveria entrar numa van parecida com a que acabava de sair e que ele ia me levar pra casa. Por alguns segundos um frio percorreu minha espinha enquanto eu pensava em todos aqueles filmes que vi com Fernanda em que mulheres são sequestradas nos aeroportos e vendidas como escravas sexuais. Não melhorou o meu medo quando eu notei que a van era exatamente igual a outra e que era realmente toda preta, cor, vidros, estofados e tudo mais que tinha pra ser preto, era. Entrei no veículo deixando que Chin guardasse minhas coisas. Mandei uma mensagem pra Fernanda com a foto da placa do carro, que eu havia tirado antes de entrar, e avisei que se eu sumisse eu seria vendida como escrava branca e loira na Coréia do Sul. Logo Chin voltou ao carro e sentando-se ao volante ligou o motor.

   O percurso do aeroporto pra casa do meu pai era realmente longo e já fazia uma hora que estava na mesma posição quando finalmente a van estacionou de frente para uma casa enorme, que vim a saber era a do meu pai. Me perguntei porque eu não podia ter meu iphone 6s se meu pai morava nesse tipo de casa, teria que tirar isso a limpo com ele depois. A porta se abriu e eu pisquei algumas vezes diante da cena que se descortinou em minha frente. Um enorme cachorro preto e branco todo peludo pulou de dentro da casa diretamente pra cima de mim, uma mulher por volta dos seus 40 anos mais extremamente bonita sorriu pra mim, uma miniatura dela estava a porta também com um sorriso no rosto e meu pai estendeu os braços pra me receber. Arregalei os olhos diante da imagem, parecia que eu realmente seria bem vinda ali e isso me surpreendeu muito. Fui sufocada por abraços, lambidas, beijos e perguntas em um português sutaquento daqueles três. Até que minha boadrasta me salvou

-  Ela deve estar cansada, Chi leve as malas pro quarto de Marina que eu vou levá-la para tomar um chá na sala enquanto suas coisas são arrumadas. Ela deu ordem a alguns empregados em volta que servissem chá com alguma coisa que não entendi e também ordenou que minhas malas fossem desfeitas e arrumadas nos devidos lugares logo em seguida estendendo a mão para mim com um sorriso amigável.  Suspirei e peguei sua mão, meus dedos foram entrelaçados e senti a força e aconchego que aquela mulher queria me oferecer o que fez com que lágrimas chegassem a beirada dos meus olhos,  e assim eu recomeço... Foi o meu último pensamento antes de entrar na casa de meu pai.




" Hoje desaprendo o que tinha aprendido até ontem

          e que amanhã recomeçarei a aprender "

                                    - Cecília Meireles  


O RecomeçoWhere stories live. Discover now