Todo incêndio é imprevisível

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Campo I; Segunda-feira (vinte anos antes); 7h30.

-Andrew Rheukar.

O garotinho levantou a mão assim que ouviu o chamado da professora, mas soltou um bufo de frustração ao perceber que mesmo aquele gesto não lhe tornava visível. Ele estava lá atrás e todos os meninos eram mais altos que ele, mesmo aos pulinhos ele não aparecia. Ela nunca iria notar a sua presença daquele jeito.

-Rheukar? -A mulher chamou novamente e ele não viu outra alternativa senão gritar que estava ali.

Andrew se enfiou por entre os outros meninos, ouvindo diversos guinchos de reclamação, recebendo empurrões e até tapas na cabeça. Todo amarrotado, ele sorriu ao ficar de frente para a professora, sendo empurrado mais algumas vezes e ouvindo algumas risadas atrás de si.

A mulher abriu e fechou a boca diversas vezes ao colocar os olhos no menino, franzindo o cenho ao analisá-lo. O garotinho sorridente se balançava de um lado para o outro contendo a animação sem parecer perceber que era motivo de chacota. Era notoriamente menor que todos os outros meninos da classe, o blazer vermelho do uniforme ia até os seus joelhos e o shot branco parecia uma calça capri. Ela cerrou os lábios para não rir, porém, ele era a coisinha mais adorável sequer já vista.

-Em qual área você deseja se habilitar, Andrew? -Ela perguntou oferecendo-lhe um sorriso ao apoiar o rosto nas mãos para encarar o pequeno.

-Pacificadora. -O garoto respondeu com o peito inflado e a classe inteira irrompeu em risadas.

Andrew olhou pra trás com as sobrancelhas unidas, sem entender porque todo mundo estava rindo. Voltou o olhar confuso para a professora de longos cabelos castanhos que lhe sorriu graciosamente e agachou-se para assemelhar-se a sua altura, acariciando-lhe cuidadosamente os ombros.

-Você tem certeza? Talvez esteja indeciso, tem tantas outras áreas... -Ela disse numa voz doce e ele negou com a cabeça.- Você pode ser um doutor, um engenheiro, pode ficar com a mecatrônica, na parte elétrica, são tantas possibilidades que voc...

-Eu quero ser pacificador, igual ao meu pai.

-Você tem certeza que não quer pensar mais um pouco?

-Certeza absoluta! -Ele bateu o pé e a mulher assentiu, dando-lhe mais um sorriso antes de se levantar e pegar um tablet em cima da mesa para dar ao menino.

-Se você não se adaptar, saiba que pode me procurar para mudar de classe.

-Eu não vou. -Ele respondeu com um sorriso, pegando o tablet da mão da mulher.

Os olhinhos castanhos de Andrew se arregalaram maravilhados ao ver o holograma sair da tela, mostrando-lhe toda a estrutura da grande escola. Ele procurou o emblema da área pacificadora e viu a imagem virtual se transformar, revelando-lhe a sala em que ele estava naquele exato momento e uma linha pontilhada que seguia pelos corredores mais afrente, sumindo na escada rolante para o andar de baixo.

-O mapa te levará até lá, é só seguir a linha vermelha. -A mulher disse e ele assentiu com veemência, tão empolgado que nem mesmo lembrou de agradecer ou se despedir, saindo da sala com os olhos presos no caminho que precisava fazer.

O garotinho seguiu correndo pelo caminho indicado, esbarrando em todo mundo e murmurando desculpas atropeladas enquanto avançava. Ele estava tão ansioso que mal podia esperar para sua primeira aula, tinha literalmente contado os dias desde o começo do ano e finalmente estava ali. Sua jornada iria começar e um dia, ele se tornaria um grande pacificador, bem como seu pai.

A turma dos pacificadores tinha aulas no primeiro andar, em céu aberto fizesse sol ou chuva. A grande tela jazia de frente para a vasta área aonde os meninos se sentavam no chão, de pernas cruzadas e postura ereta firme até segunda ordem, de forma a já se acostumarem com a disciplina corporal. Debaixo do sol forte ou da chuva, a postura deveria se manter intacta e aquele que não aguentasse, não era então capaz de se tornar um pacificador algum dia e era obrigado a mudar de aula e escolher outra área, o que era uma grande humilhação no colégio, por isso, só os meninos de maior resistência e porte físico eram aconselhados por suas famílias a seguirem aquela área.

As Galáxias de UranoOnde histórias criam vida. Descubra agora