Capítulo 6 (Parte 2)

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Letícia


Sigo até a cozinha e me sirvo de um lanche rápido. Nada muito elaborado para não abusar da trégua que os enjoos estão me dando nas últimas horas. Sento à mesa da sala de jantar observando a movimentação da casa. Meus pais estão sentados no sofá, abraçados e não param de cochichar. Vez ou outra nossos olhares se cruzam e sinto uma leve pontada no peito.

Respiro fundo e sigo para o quarto de Yuri, onde sempre fico instalada. O ambiente é o mais tradicional possível. Uma cama de solteiro feita em mogno, encostada na parede, algumas prateleiras com vários clássicos da literatura, um guarda- roupas de duas portas, e uma escrivaninha onde ele varava as noites estudando. Sorrio internamente por gostar tanto de ficar aqui, embora esse lugar não tenha nada a ver comigo.

Abro minha mala e retiro uma muda de roupa e alguns cosméticos para que eu possa tomar banho. Abro meu aplicativo musical preferido e escolho uma playlist com canções alegres que possam levantar o meu astral. Enquanto a água escorre pelo meu corpo, ensaio mais uma vez como revelarei minha gravidez para todos. Na hora do almoço fraquejei e voltei atrás, mas de hoje a noite não passa, afinal de contas não tenho como escondê-la por muito tempo.

Depois do lanche e do banho tomado me sinto mais revigorada e decido me juntar aos outros na sala. Observando-os reunidos numa conversa animada, sinto um frio na espinha quando imagino a reação que minha revelação pode causar em cada um.

— Se junte a nós, filha. — Minha mãe estende a mão para mim. — Seu pai estava nos contando alguns causos de quando ainda era criança no interior do Paraná.

Obedeço e caminho lentamente na direção de todos, que me olham com estranheza.

— Aconteceu algo, Letícia? — Meu avô me olha intrigado.

— Você está bem? — Desta vez é meu pai quem pergunta.

— Sim, estou, mas tenho uma coisa para contar para vocês. — Digo sentindo todo o sangue do meu corpo gelar. Sempre enfrentei os Schneider com facilidade, mas hoje é diferente.

— Uma coisa? E essa coisa não pode esperar até depois do jantar? — Doutor Otávio questiona seriamente.

— Na verdade é algo importante. — Engulo em seco diante de seus olhares atentos.

— Então diga logo o que quer nos contar. — Minha mãe pede calmamente, mas com um semblante preocupado. — Você disse que é algo sério, e quando você fala assim não sei nem o que imaginar.

Paro de repente e a encaro em pânico. Não sei como jogar uma bomba dessas em seu colo, assim sem mais nem menos.

Neste mesmo instante ouço a porta da frente se abrir e vejo Yuri entrar, cambaleante. Seus olhos estão vermelhos, confusos, e sua aparência um pouco desgrenhada. Não preciso de mais de um segundo para perceber que ele estar completamente bêbado, e sinto raiva emergir de dentro de mim por conta disso. Onde ele estava onde quando eu precisava? Enquanto eu vivo um dos piores momentos da minha vida, ele estava enchendo a cara por aí. E desde quando Yuri enche a cara? Ele é sempre tão certinho para tudo.

Santinho do pau oco! — Penso enquanto tento ignorar sua presença.

Pelo olhar inquisitivo que Erick lhe lança, percebo que também não está gostando a atitude do filho. Yuri, por sua vez, apenas encolhe os ombros e sorrir feito bobo.

— Mas que caras são essas? — Pergunta embaralhando as palavras. A vontade que tenho é de estapeá-lo. — Por que estão me olhando desse jeito? Nunca viram um cara embriagado? — Ri descompensado.

Um amor de amigo (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora