- Pega essas toucas aí Wellington... - Ordenou Gusmão.
- Precisa mesmo de todos esses disfarces? - Perguntou Wellington apanhando as toucas ninjas que Breno há pouco havia tirado de uma caixa escondida no assoalho do "casebre".
- Vocês estão mortos, baby! - Disse Lorrane com seu jeito sedutor. - Não podem ser vistos por aí. - Completou Breno.
Eles se preparavam para ir até a comunidade. O objetivo era trazer Beto, vivo, até o "casebre". O furgão já estava com o motor ligado, Breno também tirara algumas armas e coletes daquele assoalho, dois fuzis de assalto, uma submetralhadora e pistolas 9mm para todos.
Bolívar e Breno ficaram com os fuzis, Lorrane com a metralhadora.
- O Bolívar não é lutador? - Wellington perguntou observando a facilidade com que manejava o fuzil.
- Esqueci de mencionar que o nosso amigo era das forças especiais do exército. - Respondeu Breno com aquela cara de quem se esqueceu de colocar a cereja no bolo.
- Comando! - Bolívar, embora isso fosse raro, falou.
Já acostumado com as surpresas de Breno, Wellington apenas pensou: "Será que essas armas são legais?" Não precisou pensar muito, ele já sabia a resposta, "mas o que fazer?" "fingir estar morto também é crime." Ele se virou para entrar no furgão e viu Lorrane com a submetralhadora empunhada como se fosse um simples revólver.
- Nem vou perguntar... - Disse ele enquanto entrava na parte de trás do furgão, sendo imediatamente seguido por Algoritmo e Gusmão.
- Não passei momentos muito bons aqui... - Disse Gusmão sentindo como se uma agulha penetrasse seu ferimento.
Lorrane estava muito atenta a missão, não falou muito durante a viagem, Wellington e Gusmão repassavam as informações e táticas, enquanto Breno e Bolívar cochichavam algo em uma linguagem que só eles entendiam. Breno acelerava para chegarem à casa em que Beto estava, antes que a polícia o encontrasse, ou melhor, o Red Eye o encontrasse.
Eles adentraram a comunidade, Algoritmo falava o caminho, sempre consultando o seu computador a fim de assegurar que gastariam o menor tempo possível.
- É aquela casa ali. - Apontou Algoritmo com uma energia incomum.
- Coloquem as toucas. - Ordenou Gusmão, todos colocaram, com exceção de Algoritmo que ficaria no furgão, como vigia.
- Prontos? - Perguntou Breno enquanto ajeitava seu colete.
- Sempre... Agora... É pra já... Lets Go... Cric, cric... - Todos responderam, ou quase isso.
- A festa vai começar! - Disse Lorrane abrindo a porta traseira do furgão.
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Laura era a única na casa, sua família tinha saído para uma apresentação de teatro em uma ONG do morro. Ela se recusou a ir, inventou uma desculpa qualquer, mas o real motivo era que ela pretendia fazer um belo almoço para Beto, e como seus pais só voltariam à noite, passaria seu tempo com Beto.
Ela já estava pronta para chamar Beto quando a porta de sua casa se abriu...
Beto ouviu um grito vindo da casa de Laura, não pensou duas vezes, saiu correndo em direção à casa.
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Breno abriu a porta utilizando sua faca e alguns apetrechos. Quando entraram, Laura deixou o prato, que tinha nas mãos, cair. O barulho da queda nem foi ouvido, Laura gritou tão alto que Lorrane precisou saltar sobre ela para silenciá-la.
- Que barulho... - Disse Lorrane imobilizando Laura. - Você é uma menina má.
Laura tentava se soltar de qualquer forma, no entanto, isso de nada adiantava, Lorrane era muito mais forte que ela. E como Wellington percebeu ao observar a cena, ela já estava acostumada àquele tipo de situação, com certeza já havia participado de outras missões com Breno.
- Por aqui, venham... - Disse Gusmão aos outros, com exceção de Lorrane. - Olhem! - Exclamou Wellington correndo até a janela.
Beto estava observando pela janela, entretanto, ao ver que Wellington o descobrira, correu em direção ao portão.
- Atrás dele! - Gritou Gusmão abrindo apressadamente a porta dos fundos.
Beto já estava chegando ao portão.
- Para! - Gritou Gusmão sendo seguido pelos gritos de Breno.
- Não atira! - Beto disse ao ver Bolívar com o fuzil apontado para ele. - Ajoelha! - Ordenou Gusmão.
Algoritmo viu que alguma coisa estava errada, nenhuma viatura tinha deixado o DP, contudo, constava nos registros que a operação estava em andamento. Ele hakeou as câmeras de segurança da entrada da comunidade e foi aí que ele percebeu que seus planos poderiam ir por água a baixo, dois carros pretos estavam adentrando a comunidade em alta velocidade, Algoritmo não teve dúvida de que era o Red Eye em ação.
- Breno... - Disse Algoritmo ao rádio. - Na escuta? Saiam daí agora! O Red Eye já está na comunidade.
Breno nem precisou esperar Algoritmo terminar de falar para ajudar Gusmão a levar Beto até o furgão o mais rápido possível.
- Wellington chame a Lorrane. - Disse Breno apressadamente. - E aquela menina? - Perguntou Wellington desesperado.
- Deixe-a. Não precisamos dela. - Gritou Gusmão com a tensão correndo em sua corrente sanguínea.
- Vem, vem... - Disse Algoritmo ajudando a fazer com que Beto entrasse no furgão. - Trouxe algemas Breno? - Perguntou Gusmão.
- Aqui. - Respondeu Breno entregando as algemas. - Nunca saia de casa sem uma.
Breno correu para o banco do motorista, enquanto Bolívar entrava, ele gritava para que Wellington e Lorrane se apressassem. Os dois pularam no furgão já em movimento. Eles mal se distanciaram da casa quando viram, pelos vidros traseiros, os carros pretos pararem na frente dela.
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Os carros pararam bruscamente em frente à casa que acabara de ser invadida. Vários homens armados desceram do carro e entraram pelo portão, não se preocupando com o fato dele já estar aberto.
- Polícia! - Gritou um dos homens ao adentrar a casa.
- Mas o que é isso? - Perguntou Wilson ao ver Laura no chão, amarrada e com fita adesiva na boca.
- Para os fundos! - Ordenou um homem que estava ao lado de Wilson para os outros homens que os acompanhavam.
A frustração e o medo tomaram conta de Wilson ao descobrir que Beto não estava ali. O Chefe Supremo, ao ouvir Wilson dizer que Beto havia sumido, jogou o celular na parede.
- Alô... - Dizia Wilson. - Ainda está aí Chefe?
Não obtendo resposta, Wilson resolveu se encontrar com o Chefe Supremo para esclarecer o que fazer. Ele sabia que não tinha culpa de Beto ter desaparecido, porém, seu chefe não costumava seguir raciocínios lógicos quando seus planos fracassavam.
Uma hora e meia depois ele estava em frente àquela casa em Bangu, à espera do Chefe Supremo. Wilson ainda temia entrar na casa e sofrer outro ataque como aquele que Alexandre fizera na última vez que ele esteve ali.
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Cobriram o rosto de Beto para que ele não pudesse ver o caminho até o "casebre". Gusmão teve que imobilizá-lo diversas vezes enquanto ele lutava, sem êxito, para se soltar.
Ao chegarem, Gusmão puxou Beto para fora do furgão com a ajuda de Wellington. - Vamos levá-lo para o porão. - Disse Breno dando a volta no "casebre".
- Aqui tem um porão? - Perguntou Wellington, mas percebendo a ironia de sua pergunta, completou. - Ah... Esquece.
O porão era pequeno, mas podia acomodar os sete, no entanto, Algoritmo não fez questão de participar do interrogatório.
Breno fez Beto se sentar em uma cadeira que já estava estrategicamente posicionada e fez Wellington imaginar que ela já havia sido utilizada para outros interrogatórios, e ele tinha quase certeza de que foram interrogatórios ilegais.
- Então... - Disse Gusmão tirando a touca que usava. - Senhor, Alberto Gomes. Gusmão puxou o saco que cobria o rosto de Beto.
- Que, que vocês querem? - Beto perguntou assustado vendo Gusmão com um sorrisinho maldoso e mais quatro pessoas com toucas ninjas.
- Nós? - Perguntou Gusmão com ironia. - Não queremos nada. - Onde eu tô? - Perguntou Beto olhando para todos os lados.
- No Rio de Janeiro, a cidade maravilhosa. - Disse Gusmão calmamente.
Beto não se irritou como Gusmão previa, ele simplesmente olhava assustado para os seus sequestradores.
- Poderia nos dizer qual o seu envolvimento com o Red Eye? - Perguntou Gusmão se aproximando de Beto.
- O quê? Não sei de nada não. - Respondeu Beto tentando se afastar, o que causou a queda da cadeira em que estava sentado.
- Não vamos resolver as coisas assim. - Disse Gusmão em tom sarcástico, mas ligeiramente irritado.
Wellington ajudou Beto a se levantar, e o fez se sentar novamente. Aquela conversa levou a tarde inteira sem que Beto falasse alguma coisa além de, "eu não sei", "não conheço" e "vocês são da polícia?".
O sol começara a se pôr quando Gusmão resolveu fazer uma pausa, ou melhor, fora obrigado por Breno. "A situação não está fácil" dizia Breno, "depois a gente tenta de novo".
Todos tinham permanecido na sala, minuto a minuto, entretanto, Algoritmo, que se recusara, resolveu cozinhar para o resto do grupo. Claro que não largou o computador, com uma mão ele pegava os ingredientes e com a outra ele pesquisava a quantidade correta.
Embora seu talento fosse mais notável no mundo virtual, Algoritmo fez um verdadeiro banquete, que foi demasiadamente apreciado pelo grupo que estava faminto, pois não comiam desde manhã.
- Tu deveria largar esse seu cyber mundo e abrir um restaurante. - Disse Lorrane saboreando o pudim de sobremesa.
- Não diga isso. - Repreendeu Breno enquanto ainda devorava um pedaço de frango. - Perderíamos o nosso melhor haker.
- Mais uma coisa é certa. Essa é uma das melhores comidas que já provei. - Disse Wellington fazendo sinal de positivo com seu polegar esquerdo, o outro estava ocupado segurando o garfo.
Algoritmo agradeceu com uma modéstia incomum em hakers. Gusmão não pensava em outra coisa a não ser em interrogar Beto. Bolívar por sua vez, apreciou a comida, mas limitou-se a um gesto com a cabeça.
---------------------------------------------------------------------------------------------------------- - Filha! - Gritou a mãe de Laura ao vê-la amarrada.
- Quem fez isso com você? - Perguntou seu pai ao tirar cuidadosamente a fita adesiva de sua boca.
Em um pranto sem fim, lágrimas infinitas brotavam daqueles olhos negros, sem poder contar toda a verdade para a família, chorava de forma inconsolável, não por ter sido amarrada ou pela casa ter sido invadida, mas sim por ter seu namorado sequestrado ou até morto, como se negou a pensar.
- Me responda filha. - Pediu seu pai.
- A polícia... - As palavras foram ditas, quase soletradas, entre lágrimas.
- De novo? Nóis tem que mudar de casa. - Disse a mãe de Laura também chorando.
Aquela noite seria longa, mas não tão longa quanto a que Beto estava prestes a encarar.
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O carro do Chefe Supremo parou ao lado de Wilson que se adiantou para abrir a porta.
- Como ele fugiu? - Perguntou o chefe Supremo logo ao descer do veículo.
- Nem ao menos o vimos, senhor. - Respondeu Wilson um pouco pálido. - Só encontramos a namorada dele, amarrada e amordaçada. Talvez ele a tenha amarrado antes de fugir.
- Eu conheço aquele rato, mais do que deveria, para saber que ele não faria isso. - Disse o Chefe Supremo pensativo. - Alguém, mais competente que vocês por sinal, conseguiu pegá-lo.
- Será possível? - Perguntou Wilson com medo da resposta.
- Claro. - Respondeu em tom calmo. - A pergunta seria quem o pegou?
---------------------------------------------------------------------------------------------------------- - Acho que devemos voltar a interrogar o tal Alberto. - Disse Gusmão ansioso. - É, também acho. - Concordou Breno com uma expressão séria. - Então vamos. - Levantou-se Lorrane.
- Não sei se você gostaria de ver as próximas cenas. - Disse Breno dirigindo a palavra a Lorrane.
- Eu acredito que já vi interrogatórios mais dolorosos. - Replicou Lorrane com um sorriso maldoso.
- Até o momento sim. - Disse Breno em tom de provocação. - De qualquer forma, tenho outros planos para você.
A expressão de Bolívar, apesar da cara amarrada, parecia estar radiante com o fato de Breno não deixar Lorrane assistir ao resto do interrogatório.
- Ah, e Bolívar, você vai com ela. - Completou Breno com a maior calma possível.
O brilho que resplandecia no rosto de Bolívar desapareceu, dando lugar ao seu habitual jeito casmurro.
- O quê? - Berrou Lorrane inconformada. - Eu não vou com ele a lugar algum.
- Vai sim. - Disse Breno todo divertido com a situação. - Vocês vão buscar a Júlia. - A Júlia? - Perguntou Bolívar de modo calmo. - Tem certeza? - Sim. - Respondeu Breno com naturalidade.
- Já vai ser difícil convencê-la a vir, imagine quando ela souber que esses dois estão aqui. - Disse Lorrane indicando Gusmão e Wellington que permaneceram em silêncio.
- Eu não disse para convidarem. - Disse Breno com a expressão séria. - Eu disse para buscarem.
- Pelo visto eu vou precisar disso. - Disse Lorrane pegando a sua arma oficial.
Gusmão e Wellington permaneceram em silêncio durante toda aquela conversa, mesmo quando citados não ousaram interromper. No entanto, eles estavam cercados de dúvidas sobre a tal Júlia e o porquê de Breno a querer alí.
- Vamos ao interrogatório senhores? - Perguntou Breno entusiasmado.
Ele mal terminou de falar e Gusmão já atravessava a porta em direção ao porão.
---------------------------------------------------------------------------------------------------------- - E o Alexandre? - Perguntou o Chefe Supremo enquanto olhava para a casa. - Não o vejo desde aquele dia. - Respondeu Wilson.
- Espero que não resolva nos atacar de novo. - Disse o Chefe Supremo. - Vamos lá. - Alexandre... - Wilson falou diante da porta arrombada na última vez ali estiveram.
- O que foi? - Perguntou uma voz fraca que vinha da casa. - Vieram terminar o serviço?
Da última vez que o viram, Alexandre estava magro, sujo, e com certeza enfurecido. Mas, agora ele estava com uma magreza acentuada e que provocava uma visão desagradável. Estava calmo, talvez fosse efeito da fraqueza, não tinha forças para relutar.
- O que está acontecendo Alexandre? - Perguntou Wilson arriscando-se a entrar na casa. - O que houve com você?
- Vocês estão me matando aos poucos, seus monstros. - Disse ele cuspindo no chão ao terminar a frase.
- E quem seria você? Senão um monstro? - Disse o Chefe Supremo. - Suas mãos já estiveram em contato com muito sangue.
- A maior culpa é sua. - Disse Alexandre encarando o chefe supremo com uma expressão de nojo. - Você me fez matar todas aquelas pessoas.
- Eu não puxei o gatilho. - Disse o chefe Supremo em tom zombeteiro. - Mas impulsionou meus dedos contra ele. - Replicou Alexandre.
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Gusmão já estava enfurecido, suas tentativas para extrair as informações de Beto foram frustradas. Nem os choques, ou a tentativa de afogamento em uma balde de água funcionaram.
- Por que, seu verme? - Perguntou Gusmão irritado.
- Eu já disse, eu não sei de nada.
- É claro que você sabe. - Gritou Gusmão. - O Red Eye não estaria atrás de você sem ter um motivo.
- Eu não sou do Red Eye. - Resmungou Beto.
- Mas claro que não! - Disse Gusmão impaciente. - Não seria tão fácil de achar se fosse um deles.
- Então me deixa em paz. - Berrou Beto ao ver Gusmão pegar os eletrodos.
- Me diga o que sabe, e eu paro. - Disse Gusmão com os eletrodos em punho na direção de Beto.
- Eu não sei de nada... - Disse aos soluços.
Mais uma vez os eletrodos se chocaram contra a pele de Beto, provocando queimaduras que faziam Beto pensar em contar tudo que sabia.
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Um caso além da vida
AcciónAlgumas investigações podem tomar rumos jamais esperados. E muitas vezes, há casos que estão acima da batalha entre o bem e o mal, da vida e da morte. A polícia tem que trabalhar duro quando o lobo se disfarça de cordeiro. Mocinho ou vilão? Tudo dep...