Eduardo saiu correndo da sala de reuniões, assustado com seu atual estado "psicológico". Ele se ausentou sem dizer uma palavra sequer para qualquer um do escritório e apertou os botões do elevador no andar em que se encontrava. Impaciente, resolveu descer pelas escadas. Inúmeras coisas passavam pela sua cabeça. Coisas do tipo: "Estou ficando louco? Será algum tipo de estresse nervoso pelo excesso de trabalho? Muitos diziam que um dia isso aconteceria comigo se eu continuasse trabalhando tanto assim..."
Mas quanto mais Eddie pensava, parecia que pior era. Ele já se vira perdido em seus pensamentos quando chegou na rua e de novo o branco aconteceu! Ele fora viajar... Cada vez suas viagens estavam ficando mais frequentes e isto assustava o jovem de tamanha maneira que ele já estava entregando os pontos. Queria desistir e entregar seu destino à Deus. Dessa vez Eduardo se encontrava numa grande sala. Ele sabia que era no futuro pelo ambiente. Era uma espécie de reunião e o ancião de seu clã fazia um discurso, onde dizia:
- Quando jovem, aproximadamente na idade de vocês, eu era inconsequente. Usava drogas, cometia crimes e nunca me importava com ninguém. Isso não foi diferente inclusive quando entrei na faculdade. Coisa que só consegui pois por sorte tive um tio abastado na minha juventude que conseguia me livrar da maioria de meus problemas, apesar de eu ser diretamente de uma família pobre. Cansado de atender à todas as solicitações de favores de meus pais, um dia meu tio parou. E eu me vi só. Já estava completamente reprovado na faculdade e iria ser expulso, quando um belo dia, na aula de filosofia de meu antigo professor Carlos, ele falava sobre suas loucuras de fim de mundo quando, de repente, não sei se por mágica ou por inspiração dos anjos, passei a prestar a atenção nele. Ele disse algo que nunca esqueci. Algo simples e sem sentido naquele momento mas que se instalou no meu cérebro como uma daquelas músicas que demoramos para esquecer. Bem, sem sentido, até este momento. Ele dissertou sobre as ideias, sobre as origens delas e seus fins. Hoje sabemos que a roda não pode ser reinventada. Precisamos que um dia alguém falasse que a Terra não era redonda para termos a coragem de navegar para além da linha do horizonte. Por isto Edgard - O ancião apontou o dedo para a versão futurista de Eduardo. - Por isto, diga à Carlos que seu aluno William, o "nó cego", conseguiu. Ele entendeu finalmente que o apocalipse é a mudança, e não o fim!
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Eduardo voltou ao tempo presente bem a tempo de ver um homem de meia idade iniciando um processo de xingamento:
- Seu tolo! Poderia ter morrido! Aprenda a olhar para a rua antes de atravessar! Está pensando que está no interior?
- Carlos... William pediu para avisar que ele finalmente entendeu. Lá do futuro, não sei como. Ele já era um velho, mas pediu para dizer que ele viu que o apocalipse não é o fim, mas apenas o recomeço... - Interrompeu o jovem advogado.
- O que? Que loucura é essa? Quem é você? - Carlos ficou transtornado com tudo aquilo.
- William, o "nó cego". Ele disse. Caramba. Nem eu sei porque estou te falando isto. Só senti que deveria falar. Cara! Estou muito louco. Me desculpa. Por favor, me dê uma carona para o hospital psiquiátrico mais próximo que pago todos os danos que o senhor teve com o meu "atropelamento". Vou me internar e pedir para me encherem de remédio para sanar esta loucura. Já chega!
Carlos colocou o jovem no carro e dirigiu. William era um daqueles alunos que o professor ignora na sala de aula pois já descobriu que não tem solução. Durante todos os anos de experiência de Carlos, ele percebeu que se o aluno não quiser cooperar, ele simplesmente não irá aprender e pronto. Mas o que aquele cara de terno e gravata disse instigou o filósofo. Afinal de contas, não tinha como William ter pago um rapaz daquele para fazer tal tipo de pegadinha. E qual seria o sentido disso tudo? Carlos resolveu entrar no jogo e continuou a dirigir. Ambos não se falaram até que o carro estacionou na frente de uma casa antiga com os dizeres estampados na entrada:
"Casa dos caminhos de Chico Xavier"
Eduardo olhou fixamente para aqueles letreiros, fitou Carlos e disse:
- Cara... Eu disse que estou louco mas nem tanto assim. Falei pra me levar no hospício e não num centro espírita! Aí tem gente mais louca que eu! Mano, eu não acredito nisso nem a pau!
- Meu jovem. Eu sou um cientista também. Cientista social, porém, cientista. Perdi uma aula em outra universidade por sua causa pois acredito nela. Na história de fatos tidos como "sobrenaturais" no passado, a forma como as pessoas passavam o primeiro filtro era: Se este fato foi percebido apenas por ti, ou foi uma peça causada pelo seu cérebro ou foi uma confusão de um fenômeno natural ainda não explicado. Mas se o mesmo fato fora percebido da mesma maneira, sem diferenças, por duas ou mais pessoas, daí a única teoria científica que explica é do inconsciente coletivo. Esta muito rara e controversa. Que precisa de muitos outros dados para ser apurada. Daí, usando de probabilidade e estatística, seu caso tem grandes chances de ser um caso "sobrenatural". Remédios só irão te perturbar ainda mais...
- Putz! Já sei com quem o tal William do futuro aprendeu a falar tanto. Meu... Eu entreguei pra Deus. Vai logo então senhor da ciência. Bah! Fala que é da ciência e me traz numa casa espírita. Só rindo!
Carlos deu um leve sorriso de canto de lábio e foi até a entrada do centro. Numa coisa Eduardo estava correto. O professor não era um verdadeiro crente na teoria espírita. Mas sempre achou esta a religião mais "científica" de todas que havia estudado e resolveu arriscar. Um velho amigo de Carlos atendeu os dois e após apresentações, explicações e mais explicações, resolveram permitir que Eduardo participasse da reunião secreta daquela noite, que era permitida apenas para membros ativos da casa. Afinal, aquela era uma situação incomum.
- Como alguém consegue ver sua encarnação futura? - Disse Marcelo. O amigo espírita de Carlos.
- Bem, não sei o que esse jovem tem, mas lá na hora do atropelamento, acredito que uma pessoa normal teria saído bem machucada, no mínimo. Eu estava devagar sim, mas ele esquivou do carro igual à um ninja. Essa parte eu omiti e esqueci de dizer. Pelo menos proteção do anjo da guarda forte ele tem! - Carlos respondeu.
Marcelo, medindo o jovem advogado de cima à baixo, continuou:
- Vamos fazer um teste rápido! Eduardo, já tentou meditação alguma vez? Se prepare, pois vamos expandir seu mundo.