ESMERALDAS NEGRAS - PARTE 5

29 0 0
                                    

Uma hora havia se passado. 

***         

Trogloditas. Eram atarracados, pele verde-amarronzada, tinham protuberâncias gosmentas em seus rostos, veias saltadas nos olhos esbugalhados, narizes desproporcionais, e fediam a sangue e excremento. Vestiam armaduras sujas de couro batido tingidas de marrom por grossas camadas de lama e fezes. Usavam armas diversas, e eram numerosos demais para se mensurar em quantos estavam – principalmente porque era noite e eles se camuflavam entre as árvores.

Rodearam Dargo e Murdaryk como predadores rodeiam suas presas. Começaram a grunhir e rosnar. Em um misto de ferocidade e sadismo, alguns caminhavam em círculos, armas em punho. Outros foram lentamente se aproximando das vítimas, “fechando o cerco”.

Um imenso clarão surgiu. Desta vez, sem projeções mágicas de imagens. Apenas a voz maldita que todos haviam aprendido a odiar. 

- Uma hora se passou – era o Conquistador Negro – E então? O que decidiram?

Os trogloditas silenciaram. Nenhum pio pôde ser ouvido. Cessaram os rosnados, as bravatas, o som ameaçador dos pés esmagando folhas e caminhando rumo aos oponentes. O tilintar das armas foi contido, as respirações ficaram mais pausadas para não se fazerem ouvir. Até os sapos pararam de coaxar. Silêncio absoluto. Eles aguardavam apenas uma palavra de ordem para atacar os adversários.

- Eu te desafio, Conquistador – silêncio quebrado – Desafio você a vir até aqui e lutar comigo. Só eu contra você. Frente a frente. Um contra um. Como as lutas devem ser. Mas peço que solte a Yanysha. Ela não tem nada a ver com isso.

- E eu desafio seus trogloditas – Dargo vociferou – Liberte Yanysha. E eu prometo lutar sozinho contra todos eles. 

Os trogloditas deram passos para trás. Os semblantes que antes exibiam confiança e deboche, agora eram de preocupação e seriedade. Virotes envenenados foram colocados nas bestas. As poucas armas que ainda estavam embainhadas foram sacadas. Ouviu-se o clangor de espadas, maças, alabardas e lanças sendo preparadas para o embate. 

- E então, Conquistador? – Murdaryk berrou a plenos pulmões – Vai aceitar nosso desafio? Ou vai se esconder atrás de seus trogloditas e de suas esmeraldinhas? Ou pior: vai se esconder atrás da coitada da Yanysha? 

Um novo clarão, desta vez bem maior. Os trogloditas se afastaram assustados, sem saber o que fazer. Uns se ajoelhavam em reverência, outros mantinham a postura combativa, e alguns apenas olhavam embasbacados a chegada triunfal de seu senhor.

O Conquistador Negro era muito alto. Robusto, seus músculos salientes se faziam notar mesmo embaixo da imponente armadura negra que vestia. Presa aos ombros, uma esvoaçante capa, também negra, tremulava mesmo sem ter o vento para movê-la. O rosto era bem definido, barba aparada, olhos grandes e brilhantes, e uma beleza que contrastava com a feiúra de sua alma. Trazia nas grandes e largas mãos uma espada imensa de lâmina vermelha. Costumava usar um elmo, mas não o fez naquela ocasião. Queria olhar fundo nos olhos de seus inimigos.

Os trogloditas abriram passagem. 

- Se a Yanysha morrer por causa da minha derrota, prometo que levo o Conquistador para o inferno junto comigo – Murdaryk sussurrou.

- Se a Yanysha morrer por causa de sua derrota, juro que vou até o inferno e te mato de novo.

O Conquistador Negro partiu em direção ao oponente. Caminhava lentamente, dando a seus subordinados o tempo necessário para que continuassem abrindo passagem. Segurou com as duas mãos sua espada. Em poucos segundos, estavam ele e Murdaryk, frente a frente. Os trogloditas se afastaram indo em direção a Dargo.

 - O último que me disse palavras como essas teve as cinzas de seu cadáver atiradas aos porcos – o Conquistador sorria, espada em punho.

- Bonita sua espada – o bárbaro respondeu – Depois que eu te matar, vou usá-la para cortar a grama do jardim da Rainha. 

A poucos metros dali, Dargo, ciente que não tinha chance de vitória, caminhava lentamente para o lado, tendo os movimentos seguidos por seus algozes. Trocava sua espada de mão, fazia menção de avançar rumo aos inimigos, mas ficava apenas na ameaça, esperando uma reação deles. Posicionou-se de forma a ficar de frente aos trogloditas que estavam com as bestas. Assim, veria quando fosse alvo de um ataque a distância e poderia tentar desviar, ou se proteger usando, quem sabe, o corpo de outro oponente como escudo. Se existia uma chance de vencer a batalha, com certeza era essa.

Murdaryk esperava que o Conquistador tivesse consigo algum tipo de manopla, onde estivessem incrustadas as esmeraldas. Mas não tinha. Ficou imaginando como o poder daquelas pedras poderia beneficiá-lo à distância, e onde ele poderia tê-las deixado guardadas.

- Qual é a sensação de saber que se vai morrer em poucos segundos – o vilão gargalhou – Como se sente sabendo que seus esforços serão em vão, e que o mundo que você tenta defender está condenado? 

Murdaryk ouviu um grito de dor de seu amigo. O confronto dele havia começado. Pôde escutar o som do aço se chocando contra o aço e a cacofonia dos trogloditas berrando enquanto lutavam. Mas não ousou olhar para o lado para saber o que acontecia. Estava concentrado em sua própria batalha. Desejou, em silêncio, boa sorte ao amigo e partiu para sua guerra particular.

- Já perdeu essa luta, Conquistador – Murdaryk abriu um sorriso e tirou de uma algibeira algo que coube na palma de sua mão.

- O que? Isso não pode ser possível!

- Quem foi que disse a você que as Esmeraldas Negras eram apenas quatro? 

***  

O sangue amarronzado dos goblins escorreu em grande quantidade no chão outrora verde. Tahya e Durud, sem muito esforço, chacinaram os humanóides que os surpreenderam antes que outros tantos inimigos pudessem ser alertados. Vísceras, pústulas, tripas e todo o interior daquele que outrora foi o corpo dos goblinóides conspurcavam a beleza da floresta. A poucos metros dali, a cidade de Zyephyn. E em algum lugar lá dentro, o sábio Vierhut.

Já era noite, mas ainda havia movimento na cidade sitiada. Pequenas patrulhas das criaturas invasoras perambulavam de um lado ao outro nas proximidades dos limites de Zyephyn. Ao longe, uma cortina de fumaça indicava uma fogueira acesa pelos goblinóides que ainda estavam acordados. E, além disso, um grande burburinho que podia ser ouvido longe dali se intercalava a gritos de dor e desespero de vítimas dos monstros.

- Eu consigo me mover furtivamente e evitar todos os goblins – Durud tomou a iniciativa de propor algo assim que viu sua colega mais preocupada em aprumar-se do que em cumprir sua missão.

- Mas e eu? O que eu faço?

- Se você não sabe, eu muito menos.

- Belo plano, Durud. Deste jeito vamos ter que ficar até aqui até esses bichos feios irem dormir. O que pode nem acontecer.

- Podia ser pior. E se mais goblins vissem a gente?

Uma seta envenenada rompeu o ar velozmente. Houve uma gargalhada com som de rosnado quando ela raspou a perna de Durud.

- Você e sua maldita boca – Tahya praguejou.

ESMERALDAS NEGRASOnde histórias criam vida. Descubra agora