O peso do martelo marciano
Por: Fernand Pêcheur
Publicado em 06/02/2216
Introdução
Desde minha tenra infância, quando me mudei da pobre Europa para o Brasil, sempre tive dificuldade em me adaptar à vida no último dos grandes impérios. Meu amor por toda pluralidade e oportunidades que essas terras oferecem contrasta com como a nação mais avançada do universo consegue ser tão medieval em toda a raiz de seu pensamento. Quanto pode ser perigoso juntar alguns fatores culturais tão atrasados com tal gigantismo?
Escrever críticas sobre esse povo sempre me foi complicado, pois tenho uma eterna dívida de gratidão por ser tão bem recebido e sempre tratado como um dos seus. Por esse motivo tomo cuidado para não deixar meus caprichos críticos carecerem de respeito ou, de alguma maneira, agredirem. Não sou também adepto à Política das Alfinetadas. Explico: Como jornalista e cronista acho uma imensa pobreza de caráter profissional qualquer prática sensacionalista. Expor casos apenas pela necessidade de satisfazer a fome coletiva por desgraça é uma postura profissional que nunca adotei. Um caso merece reportagem quando transmite algo que faz as pessoas pensarem além dos fatos mais óbvios. É muito difícil encontrar casos que atinjam tais critérios e desafiador os transformar em conteúdo digno de leitura.
Até hoje pouco me arrisquei nesse sentido, pois minha filosofia de trabalho sempre priorizou a qualidade sobre a quantidade, a não ser por meus incontáveis textos sobre gatos (ninguém se cansa de tanta fofura) e mais um ou outro artigo de simples curiosidade despretensiosa. Viajando para todos os planetas, luas e estações espaciais onde o Brasil clamou território me deparei com várias situações que variaram de curiosas a intrigantes e uma em especial chamou minha atenção.
Foi um caso no pequeno povoado marciano chamado Simiópolis. Um próspero ponto comercial localizado entre as fronteiras do Império do Brasil e territórios livres, muito conhecido por ter o maior zoológico especializado em símios de todo Sistema Solar, e inspiração para seu nome.
A Constituição Imperial, como todos sabemos, dá liberdade para que cada região tenha suas próprias leis, de modo que atenda às necessidades específicas de lugares diferenciados. Por mais que algumas leis causem estranheza em visitantes elas costumam existir por algum bom motivo e não cabe a mim as questionar. Sendo assim, sempre fujo dos pedidos de escrever sobre qualquer coisa a elas relacionada. Mas e se o questionamento não partisse de mim e sim da própria comunidade?
Um pouquinho de História
Com o fim da Grande Guerra de Libertação, em 20 de março de 2202, a última grande nação a manter toda sua unidade territorial foi o Império do Brasil. O Império passou a guerra inteira mantendo sua condição de neutralidade, porém muitos dos novos territórios independentes temiam que as forças militares brasileiras usassem esse momento para ampliar suas fronteiras. Isso nunca ocorreu, como a Historiografia moderna prova, mas o medo era legítimo. A única maneira encontrada por esses novos povos para lutarem contra um império foi instigando levantes regionais e executando ataques terroristas.
Desde o Século XX o governo brasileiro passou a desencorajar a posse de armas de fogo por sua população. Foi um processo gradual e controverso estendido por mais de século, que hoje é plenamente consumado, pelo bem ou pelo mal, e ninguém mais discute. Inquestionavelmente o governo brasileiro se tornou muito eficiente tanto em desarmar sua população quanto em evitar que qualquer arma entre em seu território, a não ser com agentes autorizados. Nesse contexto foram criadas leis bastante severas sobre uso e regulamentação de qualquer artefato que possa ser usado como arma, desde simples facas de cozinha até ferramentas industriais. As leis foram bem aplicadas e isso pode explicar como o território brasileiro registra os menores índices criminais de todo universo.2
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O peso do martelo marciano
Kısa HikayeJusto agir ou reto pensar? A Lei contra o Cidadão. Quando uma velha história brasileira ainda é atual em pleno Séc. XXIII. Povoado de Simiópolis, Marte, 27 de setembro de 2215 a justiça condenou o mecânico e armeiro Joaquim Ramalho a sua pena máxima...