Capítulo IV

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- Johanna, acorda. Acorda temos coisas para fazer.
- Mmmmmhhh...- Espreitei por um olho fora da almofada. Estava escuro ainda. Enterrei a cara ainda mais no tecido e tapei a cabeça com o cobertor.

- Ainda é de noite...- a minha voz saiu abafada e ouvi um riso que reconheci de imediato. O cobertor foi puxado da minha mão e atirado para trás, descobrindo-me o tronco. Newt colocou as mãos na cintura e olhou-se como se estivesse chateado, mas com um sorriso a ameaçar despontar.
- Vá dorminhoca, já te deixei dormir mais dez minutos que devia. Dormiste bem?

- Bolas, nem me fales nisso. Não consegui pregar olho. A cama estava empestada com o teu cheiro. Tu tomas banho? - A cara confusa que ele fez foi impagável.

- Estou a brincar. Dormi que nem uma pedra. Mas hoje tu dormes aqui. Eu durmo no chão.
- Mas o Alby disse...
- Não interessa. Sinto-me mal por te estar a roubar a cama e teres de dormir lá fora. Sem argumentos. Nem que te tenha de arrastar lá debaixo cá para cima e enfiar-te na cama à força.- Ele levantou os braços em sinal de rendição.
- Está bem, eu durmo na cama. Mas agora despacha-te a arranjar-te. Quero-te lá em baixo daqui a cinco minutos.- Disse saindo do quarto.

Pus-me de pé num salto e desfiz a trança emaranhada no meu cabelo já seco. Penteei as mechas de cabelo castanho minimamente, já que não tinha espelho. Calçei as minhas botas castanhas e coçadas. Enrolei a bainha das calças que agora sabia que eram de Newt. Entalei a camisa dentro das mesmas e apertei o cinto. Saí do quarto e desci as escadas o mais silenciosamente possível. Lá em baixo Newt estava à minha espera.

- Então, o que vamos fazer hoje? - disse balancando o peso de um pé para o outro.
- Então já te esqueceste? Vou-te apresentar às nossas pequenas mascotes. Espero que tenhas um estômago forte. E depois tens o dia para espairecer porque vai haver uma reunião de Guardiões e é bem capaz de demorar o dia todo. Por isso começas a trabalhar só amanhã.- Newt encaminhou-se em direção a uma das grandes paredes cobertas de erva e eu segui-o.

A maior parte dos rapazes ainda se encontrava adormecido no relvado pontilhado por formas escuras. Da cozinha saia um fumo esbranquiçado, provavelmente Frypan a tratar das refeições. Um rapaz alto que reconheci como sendo Winston, o Guardião dos Fatiadores, caminhava em direção aos currais dos animais para os alimentar.

Segui a cabeça loira de Newt pela semi-obscuridade até uma zona dos muros onde se concentrava uma grande quantidade de hera.
- Vamos ver se temos sorte e está algum aqui... - Newt afastou as folhas e destapou um quadrado de vidro sujo e manchado. Do outro lado vi um cenário parecido ao que vira no dia anterior pela Porta aberta. O mesmo cinza morto e escuro coloria as paredes cobertas pela mesma vegetação vertical da Clareira. A luz filtrada pela sujidade fazia estranhas sombras de cores dançar na minha pele, na face queimada pelo sol de Newt, nos seus cabelos cor de mel.

Depois de um minuto inteirinho de silêncio, decidi quebrá-lo:
- Estamos à procura do quê, mesmo? - perguntei-lhe. Mas as minhas últimas palavras foram abafadas por um gemido inumano, inanimal, inatural.
- Daquilo. - Os seus dedos agarraram o meu maxilar e, sem quebrar o seu olhar da janela, ele rodou a minha cabeça para a frente.

Ao princípio não vi nada. Mas depois um vulto disforme destacou-se no escuro e uma luz vermelha brilhou algures do outro lado. Uma criatura viscosa, grotesca e híbrida entrou na luz e vi pela minha primeira vez um Magoador.

A primeira palavra que me ocorre para o descrever é: Aberração. Não existe forma alguma de aquela coisa ser natural. Do seu corpo gelatinoso saíam diversos braços metálicos com os mais variados apêndices e utensílios. Desde lâminas tão compridas como o meu antebraço, a serras de aço inoxidável que luziam ameaçadoramente. Pude vislumbrar uma seringa que, imaginei, devia ser o que eles usavam para picar as vítimas.
Um pouco maior que uma vaca, o monstro não tinha olhos nem boca visíveis. Fazia um som extremamente irritante.

Whirr.
Click. Click.
Whirr.

E depois, sem qualquer aviso, o raio do bicho enrolou-se sobre si próprio e rebolou a toda a velocidade contra a parede onde estava instalada a pequena janela. Dei um salto para trás e suprimi um pequeno guincho assustado.
- Bolas! Que raio...- disse Newt. - Estas coisas, de vez em quando, dá-lhes o amoque e tentam partir a traca do vidro. São mesmo estúpidas.
- Mas nunca conseguiram, pois não?
- Não, este vidro deve ser à prova de bala ou assim. É grosso como tudo.- para reforçar a ideia ele deu duas pancadas secas com os nós dos dedos, produzindo um som quase inaudível. Espalmei a minha palma contra a janela e mirei o habitante do Labirinto.
- E mesmo que conseguissem parti-lo, não passavam os corpos para cá, não cabem. - acrescentei.

- Exacto. - depois virou-se muito sério. - É por isto que só os Exploradores podem ir lá para fora. São os mais experientes, os mais rápidos e os mais fortes de entre nós.
Olhei-o nos olhos e vi uma melancolia como se ele tivesse experiênciado tudo na primeira pessoa. E perguntei-me novamente quando é que ele teria começado a coxear.

Um ruído despertou-me dos pensamentos e vi que as Portas se estavam a abrir. O sol subia lentamente no céu e vi o cabelo negro de Minho ao longe, liderando um pequeno grupo de rapazes artilhados com mochilas que saiu disparado para o exterior.

- Anda, ainda tens de fazer uma coisa se queres ser uma Clareirense. - Ao dar a volta vi Newt que segurava um objecto com um brilho prateado na mão. Alarmei-me e dei-lhe um encontrão no braço, fazendo-o largar a faca.

- Au! Para quê que foi isso?
- Desculpa, assustei-me. - baixei-me para apanhar a lâmina e devolvi-lha. Ele recusou e apontou para um troço de parede mais à frente que estava coberto por inscrições. Quando me aproximei, vi que eram nomes e os meus olhos saltaram automaticamente para aqueles que conhecia. Newt tinha cravado o seu numa letra pequena e inclinada. Alby escrevera em maiúsculas. Thomas assinara entre Newt e Alby com precisão e destreza. Winston, Chuck, Frypan, Gally.

E depois vi os nomes cortados.

Stephen, George, Nick.

Will, Clyde, Alex.

Os mesmos que vira nas tábuas de madeira no meio da floresta.

Nem percisei de perguntar oque era para fazer. Instintivamente escostei a faca à dura pedra e tatuem a minha existência no cimento. Senti cada músculo no meu braço dorido e retesado pelo esforço mas continuei. Juntei o meu nome aos muitos que aqui se aglomeravam formando mais do que uma parede meramente vandalizada. Ao assinar ali com o meu suor, assinei um contrato para com estas pessoas. Que era agora parte delas e que quem quer que fosse que nos pôs aqui podia mandar do mais forte e do mais feio que o nosso espírito permaneceria intocado como uma barra de aço.

Porque se para Eles isto era apenas um jogo doentio de quem verga primeiro, prometi-me a mim mesma que não iria descansar até eles tocarem com a cabeça nos dedos dos pés.

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FIM DO CAPÍTULO IV

Eh este foi um bocado para encher. Desculpem pelo capítulo pequeno mas achei que era importante antes de saltar para a ação a sério.
E como eu sou uma procrastinadora do pior, acho que devia deixar mais umas sugestões de autoras para lerem enquanto não vem o próximo.

storiesloverrose e IronyOfFate

<3 Johanna

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⏰ Última atualização: Apr 24, 2016 ⏰

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