Capítulo 10

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EU ACORDO DE REPENTE. DESCUBRO QUE LUTAR CONTRA alienígenas a noite toda e depois dormir num vagão de metrô sujo não te dá uma boa noite de sono. Pesadelos sobre minha mãe voltam à minha mente enquanto eu me recupero do choque de acordar num lugar estranho. Meus olhos ardem pelo lapso de sono, e a minha cabeça voltou a doer. Por alguma razão eu lembro da escola, de quando tivemos que ler Os Ilíadas e aprender sobre os deuses gregos e coisas do tipo. Eu me lembro que uma das deusas nasceu do crânio de seu pai. Afrodite, talvez? Ou Atena? Qualquer que seja, é como minha cabeça está agora: como se alguém estivesse batendo nela, tentando sair. São estranhos os pensamentos que passam pela sua mente quando você acorda num vagão de metrô abandonado com um alienígena e seu companheiro super-humano. O vagão do metrô está escuro como breu, exceto pelo brilho fraco do celular que está nas mãos de Sam. Ele está sentado em um dos assentos. Um punhado de revistas em quadrinhos escorregou de seu colo para o chão. O suficiente pela vigia e por ter me acordado. Eu me levanto, me espreguiço e sigo até ele. Há um respingo de baba escorrendo pela lateral de sua boca. Eu me pergunto como ele pode dormir tão silenciosamente com tudo o que está acontecendo, mas eu acho que ele teve mais tempo para processar a informação de que alienígenas existem do que eu tive. Eu pego o celular de sua mão, o que não o faz esboçar reação alguma. Eu provavelmente não conseguiria acordá-lo se eu tentasse. O celular me diz que já passou das cinco da manhã. Eu não sei se o sol já nasceu na superfície. Mal posso saber se ainda existe um sol, na verdade. Eu ligo a lanterna do celular e observo o interior do vagão. John não se moveu. Eu mantenho a luz sobre ele por tempo suficiente para eu saber se seu peito está se movendo para cima e para baixo antes de mudar minha atenção para a mochila de dinheiro que está abaixo do assento que eu dormi. Eu não abri espiei por dentro dela ainda, então eu abro o zíper, para o caso de haver algum tipo de arma que possamos usar. Eu me encontro olhando para uma quantidade de dinheiro que eu jamais saberia como gastá-lo. Eu pego um montinho de notas de cem dólares e penso no que esse dinheiro teria significado apenas vinte e quatro horas atrás. Tudo. E agora.... quem sabe? O futuro parece tão incerto. O dinheiro é o único conteúdo da mochila. Eu me sento, pegando uma quantidade gorda de dinheiro na minha frente, formando um semicírculo, me abanando com ele e tentando descobrir o quão longe eu estou da Canal Street ou onde quer que seja a próxima estação de metrô. Mas eu não sei onde estou. Não com certeza. Direciono a luz para as portas do vagão. Eu poderia ir embora agora. Pegar minha mochila e sair.
LEGADOS RENASCIDOS Esses caras ficariam bem sem mim. Não é a mesma situação de quando os túneis estavam desmoronando ao nosso redor. Eles acordariam e seguiriam em frente. Continuariam lutando. Continuariam lutando. As palavras que Sam disse. Talvez seja porque eu tive apenas algumas poucas horas de sono, ou talvez porque alienígenas grotescos atacaram nossa cidade - o que quer que seja, eu de repente me sinto só e perdida. Tanto que eu quase chacoalho Sam para tentar acordá-lo. Eu poderia mentir dizendo que eu estava o acordando por ele ter dormido durante seu turno de vigia. Mas ele precisa descansar. Ambos precisam. Independentemente se eu decidir partir sozinha ou ficar com eles, eu vou precisar de suprimentos. Mesmo se eu tiver uma dúzia de celulares comigo, se eu me perder nos túneis eu não quero correr o risco de ficar presa com um bando de baterias descarregadas. Então eu guardo o dinheiro no bolso e sigo para a outra metade do trem que eu e Sam não vasculhamos. É praticamente a mesma coisa dos outros vagões que exploramos ontem à noite. Um monte de lixo no chão. De vez em quando uma bolsa ou sacolas de supermercados com algumas coisas úteis. Eu encontro mais alguns celulares e duas sacolas de mercado gigantes - provavelmente mais de cem dólares em suprimentos. Eu pego um pote de amêndoas e as como enquanto continuo. Três vagões depois, eu encontro uma pequena mochila azul em um dos assentos. Há saquinho de cenouras para bebês e uma maçã no bolso da frente. A parte maior contém um urso de pelúcia e alguns livros ilustrados. Essa é a mochila de algum aluno do ensino fundamental. Talvez até da pré-escola. Deixou para trás quando o trem parou por qualquer motivo. De repente eu não me sinto mais com tanta fome. Eu me sento com a mochila no colo, me sentindo um pouco tonta.
Eu tento usar a lanterna do celular para iluminar o lado de fora da janela, mas ela apenas é refletida pelo vidro. Não há nada além da escuridão esperando por mim do lado de fora, e a ideia de andar sozinha pelos túneis nessa escuridão parece maluca. Mas então, tudo parece maluco agora. Eu me concentro na mochila. Ela flutua do meu colo e paira no ar. Eu olho para minhas mãos. Esse poder. O que eu devo fazer com ele? Eu percebi agora que estive fugindo - literalmente - desde que eu derrubei os Mogs com minha telecinese pela primeira vez. Eu não tive tempo para me sentar e pensar no que tudo isso significa. Quais serão meus próximos passos. Eu tinha um objetivo concreto de ir para o restaurante que minha mãe trabalha que eu nem parei para pensar no que eu faria caso ela não estiver lá. Isso nem foi uma possibilidade, na verdade. O que eu daria para poder voltar no restaurante e comer waffles? Para caminhar com minha mãe? Eu até seria mais legal com Benny - o veria com outros olhos. Como é possível a vida virar de cabeça para baixo num piscar de olhos? Na manhã de ontem eu era apenas uma garota normal. Meu maior problema era conseguir novos fones de ouvido. E agora... agora tudo é diferente. Eu estou diferente. Eu sou poderosa. E o mundo está acabando. Mas talvez eu possa ajudar a impedir isso. Eu só não tenho certeza do que devo fazer. Honre a pessoa que não está presente através de suas ações. Minhas mãos começam a tremer e eu faço com que a mochila retorne para meu colo, e eu a abraço com força. Eu me pergunto o que seu dono estará fazendo agora. Eu espero por Deus que ele esteja seguro. Talvez a criança e seus pais conseguiram ir para a ponte do Brooklyn, para a zona segura de que John e o cara do rádio falaram. Brooklyn. Eu tento colocar as coisas em perspectivas. Durante todo esse tempo eu estava cogitando minha mãe ainda estar no restaurante.
Se escondendo. Porém, sendo mais realista, não é isso o que ela estaria fazendo, certo? Não se ela sobreviveu. Ela estaria me procurando. Ela tentaria chegar à Harlem. Ela pode estar em qualquer lugar. Ou talvez ela foi levada para o Brooklyn contra sua vontade. Se ela foi ferida, ela deve ter sido levada para lá. Ou se o exército apareceu eles devem ter forçado uma evacuação. Se o sol ainda não raiou - e se ele ainda estiver lá - será logo. Um novo dia irá começar, e minha mãe irá começar a se perguntar onde estou. Eu me levanto, colocando a pequena mochila azul de volta no acento cuidadosamente. Então eu respiro fundo, junto o resto das coisas que eu encontrei e volto para o vagão onde meus amigos esquisitos estão dormindo. Quando eu chego eu tento me sentar e ficar quieta, e decido esperar que os meninos acordem sozinhos. Eu checo a bateria de alguns dos celulares que eu encontrei, deixando os que estão com a bateria cheia ligados para tentar fazer com que o interior do vagão pareça menos depressivo. Depois de um minuto ou dois, então, eu começo a me preocupar se os dois vão dormir a manhã toda, e eu estou muito bem acordada para dormir de novo e esperar. Então eu tusso algumas vezes e jogo a falsa bolsa de Prada no assento acima da cabeça de John. Ele acaba acordando. - Você está vivo - eu digo. Eu não tenho que fingir o sorriso. John parece drogado, mas isso não o impede de recomeçar outro discurso de recrutamento depois de me repreender por estar carregando uma mochila cheia de dinheiro, como se eu fosse algum tipo de ladra comum. Como se ele me conhecesse. Eu não sei de onde ele tira toda essa coisa de "eu sei tudo o que você deveria estar fazendo com sua vida". Ele fica todo sério e me diz como ele era jovem para revidar quando os Mogs atacaram o planeta dele, mas que eu não sou e que posso fazer a diferença na Terra. As palavras fazem sentido.
Talvez se eu não estivesse tão assustada por conta de minha mãe e dos alienígenas, eu aproveitaria essa chance. Eu não sei. É difícil pensar nisso agora. John não é tão esperto quanto ele pensa que é. Ele nem sabia do vídeo no YouTube sobre ele que não param de passar nos noticiários, e ele fica com um olhar muito estranho quando eu termino de contar tudo para ele. Eventualmente ele acorda Sam e diz que precisamos continuar andando. Antes de eu concordar em seguir com eles ou mesmo perguntar para onde eles estão indo, eu quero saber tudo o que eles sabem sobre o que está acontecendo no Brooklyn. - Você mencionou que eles estão levando algumas pessoas para fora de Nova Iorque... - Sim - John diz. - O exército e a polícia estão protegendo a ponte do Brooklyn. Eles estão evacuando as pessoas por lá. Pelo menos eles estavam até a noite passada. Eu assinto. Na minha cabeça, eu tento imaginar os lugares onde minha mãe pode estar. Eu poderia tentar ir sozinha para o restaurante, ou eu poderia ir para a ponte do Brooklyn com esses dois caras que podem mover as coisas com a mente e atirar bolas de fogo e ver se ela está lá primeiro. Seria bom não estar sozinha nessa procura. Especialmente se ainda houver esquadrões Mogadorianos pelas ruas. - Eu gostaria de ir para lá - eu digo, me levantando. - Para ver se minha mãe conseguiu escapar. - Tudo bem. Ele começa a sorrir como se ele soubesse que eu iria perguntar alguma coisa parecida com isso. Eu olho para ele e sigo para a porta do trem. Que doido. - Nós deveríamos seguir por aí também - ele diz. - Que seja - eu murmuro, embora uma onda de alívio cai sobre mim quando ele diz isso. Eu não sei se algum deles me ouviu. Isso não importa. Eu estou grata por eles virem comigo, que eu não terei de seguir sozinha. Sam grita para que eu não esqueça minha mochila. Eu troco um olhar com John, pronta para que ele me diga que esse dinheiro deveria ir para o fundo de guerra da Terra ou algo do tipo. Eu sei que eu disse algumas coisas parecidas para Jay sobre isso mais cedo, mas eu não preciso ouvir uma lição de moral de John Smith sobre- - Use sua telecinese - ele diz, apontando para a mochila. - É bom para praticar. Ok, talvez ele não seja um garoto Escoteiro, afinal de contas. Eu dou-lhe um sorriso e sigo pela porta, a mochila flutuando atrás de mim. Hoje as coisas serão diferentes. Hoje eu irei encontrar minha mãe e nós vamos juntar as peças. Estou a um passo fora do vagão quando eu vejo armas apontadas para mim. Levanto minhas mãos, e estou pronta para gritar e usar minha telecinese. E então eu percebo que essas armas não são canhões Mogadorianos. São armas humanas, seguradas por soldados humanos. Ah, merda. Vou ser presa. A Terra está por um fio e eu vou para a prisão por estar levando o dinheiro que tecnicamente eu nem roubei. - Opa, opa - eu digo, enquanto eu dou um passo para trás, usando meu poder para tentar esconder a mochila embaixo de um dos assentos. Eu vejo John se mover lá atrás pelo canto do olho. Suas mãos estão em chamas. - Espere - Sam diz. - Eles não são Mogs. Um deles reconhece John quando eles iluminam nossos rostos com lanternas. Eu percebo que eles não abaixam as armas imediatamente. - Amigos seus? - eu pergunto. - Não tenho certeza - John diz.
- Algumas vezes o governo gosta de nós, outras vezes nem tanto - Sam diz. - Ótimo - eu murmuro. Eu fiz um excelente trabalho escolhendo meus amigos. - Por um segundo, eu pensei que eles estavam aqui para me prender. A voz de uma mulher sai através do rádio de um dos militares. Eu vejo John endurece um pouco quando ele ouve. O homem dá um passo à frente. - Por favor, venham conosco - ele diz. - A agente Walker gostaria de dar uma palavrinha. Eu olho para John, que assente para mim. Eu acho que Walker é amiga. - Ei, para onde vamos? - eu pergunto. - Para a zona de evacuação do Brooklyn - o soldado diz antes de se virar e seguir de volta pelo túnel. Eu acho que as coisas estão começando a melhorar. Eu não sei como explicar minha mochila para esses caras, então por mais que me doa, eu a deixo para trás. Em algum lugar entre Spring e Canal - eu repito em minha mente, - eu vou voltar por você, mãe. Logo estaremos juntas.

Os Arquivos Perdidos #13 (Legados Renacidos)Onde histórias criam vida. Descubra agora