Uma Voz Que Precisava Ser Ouvida

15-Sangue

Nívea Colbert.

Minhas cordas vocais se petrificaram. Meu queixo bateu no chão. O programa que eu havia assistido me veio a mente. Não. Era só um mau entendido, um grande mau entendido. Tentei fazer com que minha expressão insondável não falhasse.

A Sra. Colbert se levantou do sofá. Ela tinha um ar de superioridade e em seus olhos o azul não era nada agradável, mas sim, assustador. O olhar dela não desviou de mim, nem por um segundo, não vacilei, encarei-a com muita coragem.

Nívea parou na minha frente, se ela se inclinasse mais um pouco se quebraria. Ela me fitava sem hesitar. Tive a sensação de que eles estavam esperando alguma reação da minha parte. Eu só queria desaparecer. Olhei de Marcelo para ela, confuso.

— Finalmente vocês chegaram! Já estava começando a ficar entendida. — disse Nívea, fazendo uma carranca, sua voz era tão irritante quanto a de uma furadeira entrando na parede. Ela foi até Marcelo e passou seus braços pelo seu pescoço, quis vomitar quando vi os seus lábios se tocarem. Continuei ali, paralisado.

Os dois olharam para mim, indecifráveis.

— Estamos esperando perguntas. — disse Marcelo. Não falei nada. Fez-se um silêncio funesto.

Depois do que pareceu um século, perguntei. — Onde fica meu quarto? —  Fingindo que nada daquilo estava me machucando.
Eu me preparei para andar pela casa, de repente Marcelo me puxou com violência. Ele não se importou com o meu braço quebrado ou com qualquer coisa. Simplesmente segurou meu rosto com brutalidade.

— Não estou com humor hoje para suas tentativas bestas de fingir que isso é algum tipo de turismo. Por que NÃO É! — seu maxilar se contraiu. Estremeci.
Olhei para Nívea de relance, ela carregava um sorriso débil, aquilo era muito frio.

— O que você quer que eu diga? — Perguntei, lutando para manter minha voz firme.

— Quero que diga 'OI' para sua madrasta. — retrucou Marcelo me olhando de maneira divertida. Senti uma pontada no coração. Da minha boca não saiu nenhuma palavra. Com força, Marcelo me sacudiu e berrou:
— DIGA BEN... DIGA SEU GAROTO INÚTIL!!! — As lágrimas brotaram dos meus olhos, mas eu não o obedeci, limpei a garganta.

— NÃO! — disse, seco. Os olhos de Marcelo desfaleceram, o sorriso de Nívea falhou. — Não importa o quanto queira...eu nunca serei seu filho perfeito. — Cuspi as palavras na cara dele sem medo de errar. Eu já era um ERRO.

— Seu... — Marcelo ergueu o punho decidido a me golpear. Fechei os olhos e esperei o soco me atingir, não ia doer tanto quanto a minha vida.

— Não! — uma voz interrompeu o ato. Abri os olhos hesitante. Nívea estava segurando o punho de Marcelo. — Marcelo, o-os vizinhos podem ouvir. — Nívea disse, nervosa. Marcelo relaxou os músculos que estavam contraídos e deu um longo suspiro. Seu rosto estava indecifrável. Os nós dos meus dedos ficaram brancos.

Antes que eu pudesse processar alguma coisa, Marcelo me agarrou pelo braço e me arrastou por um corredor que tinha o aspecto daqueles filmes horrendos, quais sempre acabavam de forma lamentável. Meu coração disparou. Não fazia ideia do que ele faria comigo.

— Para onde está me levando? — murmurei, tomado pelo medo. Porém, ele apenas continou me arrastando. Tentei organizar os pensamentos, ignorei a vontade de gritar por socorro, algo me dizia que seria pior se o fizesse.

Olhei para trás, mas, só se via escuridão, mesmo com o sol incandescente do lado de fora, a casa nova era um cenário perfeito para minha vida macabra. Quando percebi estávamos subindo uma escada, os degraus emitiam rangidos estridentes, entretanto, o barulho de sangue pulsando nos meus ouvidos era mais inquietador. Quando chegamos no topo das escadas percebi que NÃO havia janelas no andar de cima. Engoli em seco. Parecia que meu corpo tinha entrado em choque.
Sabe quando você tem a consciência de que algo está acontecendo, e você está lá, só que parece que não está, quando o medo te domina, ou quando você está tendo um sonho ruim? Eu estava deste modo, anestesiado.
De repente, Marcelo abriu uma porta estreita. Naquele momento podia sentir cada célula do meu corpo desfalecendo. Andentramos. Perdi o ar.