Perséfone era o tipo de pessoa que conseguia amar tudo o que via, quer fosse um rio de almas condenadas ou o orvalho da primeira manhã de primavera. Fora assim com os narcisos que eu usei, nunca tinha visto alguém ficar tão deslumbrado com uma porção de flores azuis como ela ficou, era quase como ver o sol ou a lua pela primeira vez.
Para mim, foi à sensação de vê-la.
Com o pequeno debaixo do meu braço não foi diferente.
Eu havia retornado para nossa quando encontrei Perséfone sentada em frente à enorme lareira no salão principal, lendo alguma coisa da nossa vasta biblioteca, era uma das coisas que mais amava fazer no tempo livre: ler o que podia sobre o mundo humano. Minha esposa via maravilhas que eu não conseguia ver, atentando-se para as singularidades que os mortais possuíam, fossem em suas fraquezas ou conquistas, eu simplesmente sorria e observava enquanto ela o fazia.
Dessa vez, chamei seu nome.
Perséfone levantou a cabeça de imediato, virando-a em minha direção, começando a formar um sorriso, que se desfez assim que viu o sangue em minhas roupas.
-Algo errado? – Sua expressão ficou séria. – Hades?
-Não. – Forcei-me a dizer, tirando das vestes a forma mal costurada por mim e ainda suja de sangue. – Mas...
-O que é isso?
Isso?
-Querida... Primeiro eu preciso que... Seja...
-Hades, o que aconteceu? – De imediato, ela se levantou, rastejando o vestido de cor carmim pelo chão, não ouvi o titubear de seus sapatos, constatando mais uma vez que minha esposa andava descalça. – É uma... Criança? Onde?
-A mãe o matou, bem, tentou, se não fosse por mim...
-Ele era seu, não era?! – Baixou a vista para ele.
-Não desta forma, meu amor, eu juro, não desta vez. – Perséfone me amava e, levando em consideração o fato de não poder me dar filhos, seus olhos se mantinham fechados para algumas... – Prometeram-no a mim.
-Um prometido?! Mas... Sabe o que isso significa?
Sorri. Sim, eu sabia exatamente o que significava e vê-la sorrir de novo daquele jeito valia muito à pena.
Meu raio de sol.
-Então não demorará muito para que a minha...?
-Não vamos nos precipitar, mas acredito que não demorará muito. Por favor, Perséfone, não se desespere por qualquer criança que vier para nós da mesma forma que Brian. – Eu conhecia aquele olhar e precisava pará-lo antes que ela desviasse tudo.
-Brian? Como o rei?
Assenti. Nosso guerreiro.
-Deixe-me segurá-lo, meu rei.
Perséfone esticou os braços para mim, onde depositei sem hesitar, afinal, ela jamais machucaria uma criança. Brian se acomodou entre sua pele, respirando fundo, absorvendo o cheiro doce que tinha.
-O que lhe fizeram, meu pequeno? Hades, ele está... Remendado?
-Foi preciso, a mãe o cortou ainda dentro da barriga. – Vi engolir a própria voz e forçar um sorriso para o bebê, que nem entendia o que se passava.
-Ah, meu pobre menino... Esses humanos, sempre tão frágeis. Mas agora está tudo bem. Vamos cuidar de você.
Minha rainha, sempre amando o desconhecido, sempre querendo abraçar a todos.
-Nosso filho já tem o meu toque, Perséfone. Em breve, ele será...
-Shii, Brian tem lindos olhos, não tem, Brian? E vai ser um rei maravilhoso, como você, meu amor, mas, por ora, ele é apenas um bebê que precisa de pais... De uma mãe. E de amor. Por ora. Agora, meu menino lindo de olhos azuis, mamãe vai te dar um banho.
E assim foi durante os anos que se seguiram: Perséfone lhe deu todo o amor que uma mãe de sangue pode dar para um filho. Cantou para ele, deu-lhe banho, o que sempre quis fazer, mas o tempo não foi o suficiente para que Brian quisesse tudo. Logo ele cresceu, passou a sentir a necessidade de se bastar, de não precisar mais de ninguém... E isso partiu o coração da moça sorridente com a notícia de ter um filho, mesmo que não o tivesse do próprio corpo. E se o coração dela estava partido...
Era meu dever ajudar a consertá-lo.
E durante a gestação de uma adolescente irresponsável, ela veio até nós. Coralyn. Perséfone não se continha de tanta felicidade, tínhamos, então, nossa família tão esperada completa, finalmente, com nossos filhos perfeitos e marcados em nosso nome.
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O Filho da Morte (EM PAUSA)
FantasyBrian não era como os outros. Nunca foi. E o motivo disso envolvia o fato de que desde sua concepção, sua alma pertencia à escuridão. Uma madrugada insana.Uma morte prematura. Sangue. E um Deus dos Mortos furioso marcaram sua quase morte e nascimen...