Capítulo 2

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Demorou mais creio que encontrei minha vítima! Houve corte na fábrica onde eu trabalhava no departamento de cobrança. Como sou arrimo de família e pago minha faculdade de jornalismo, nem pensar em ficar sem trabalho. Assim me mexi como um parafuso, e uma das agências de emprego nas quais fiz ficha me mandou ir ver uma vaga de secretária num escritório de advocacia em Copacabana. Fiz os testes, passei em todos e comecei a trabalhar.

   A vítima, no caso, é o dono do escritório. É um homem chegando a casa dos cinquenta anos, casado, com duas filhas - com quase minha idade - e dinheiro que não acaba mais... Claro que já me informei disso. Não faço nem idéia da cor dos olhos dele, mas o dr. Azevedo tem apartamento em Miami, mansão de veraneio em Búzios e outra na Argentina e mora numa cobertura triplex em Ipanema. Não poderia haver partido melhor que esse.

Claro, ele não faz a menor idéia de que despertou minha mais profunda e desinteressada paixão. Inteligente e manipuladora que sou, saberei fazer o jogo muito bem, para que o tolinho acredite que foi ele quem me conquistou. Acha difícil que nos dias de hoje ainda existam homens que caiam nesses artifícios? Espere e verá!

Estou tão cansada! Trabalhei como doida a semana toda e tive três provas na faculdade. Deve ser por isso que meti a cara na porta de vidro quando fui entrar no banco para pagar a mensalidade. Foi uma cena digna um episódio de comédia pastelão.

Cheguei ao banco, dentro da faculdade, toda poderosa em meu tubinho preto e saltos altíssimos. Dois professores meus conversavam no corredor, do lado oposto à porta do banco. Eu os vi, e eles, como sempre, sorriram largo para mim. Joguei o cabelo para o lado, fazendo charminho, e me virei com tudo pra entrar no banco. E lá estava a porta de vidro, fechada. Atarrachei o nariz nela e senti os olhos se encherem de lágrimas. Do outro lado, dentro do banco, dezenas de cabeças se viraram para ver o que causou aquele barulhão. Não me dei por achada. Fiz carinho em meu nariz, ajeitei o cabelo de novo,  olhei para os professores, que tinham parado de sorrir, pisquei um olho e disse:

  _ Viu o que vocês fazem comigo, rapazes?

Por pouco eles não explodiram de orgulho.

   Abri a bendita porta - como se nada tivesse acontecido - e fui pagar a conta.

Isso é muito típico de minha pessoa. Basta que eu me sinta observada para dar uma mancada desse tipo. Porém, como sou muito bem-humorada - afinal, a vida e a natureza foram tão maravilhosas comigo! -, sempre dou muita risada dessas situações. Imagine se vou perder a oportunidade de rir de mim mesma!

Na segunda-feira soube de algo muito interessante. O dr. Azevedo tem uma amante, dentro do escritório! Isso duplica meu trabalho. Antes eu teria apenas de fazê-lo divorciar. Agora tenho de tirar da jogada a amante, também, que é advogada. E, para complicar mais um pouco, a filha dele, que estuda direito, começou a trabalhar lá.

Certo, terei de rever meus planos. Cheguei mesmo a cogitar mudar de alvo. Há um outro advogado ali que parece estar bem de vida. Não é rico a beça como o dr. Azevedo, mas por um ano ou dois já ajudaria a melhorar meu saldo bancário. Mas ele não tem sex appeal. E eu não vivo sem sexo minha gente. E não pretendo ficar chifrando meu marido. Sim, eu disse marido. Nada de ser amante de homem rico. Sou amante dos que me divertem. Para eu ascender nos negócios, o sujeito tem de ser meu marido. E com comunhão de bens, que eu não sou boba nem nada.

Muito bem, agora terei de me concentrar na tática de detonar o caso do dr. Azevedo. Na verdade, talvez a vinda da filha dele para o escritório venha a servir muito bem a meus propósitos...

~~~ No dia seguinte ~~~

  _ Bom dia, Quilly.
  _ Bom dia, Natália.
  _ Você se importaria de trazer um café para mim?
  _ Açúcar ou adoçante?
  _ Amargo por favor.
  _ Em um minuto.
  _ Obrigada.

Natália, é filha do dr. Azevedo, era sempre gentil com todos nós. Além de linda. Uma morena de parar o trânsito. Adoro tudo o que é bonito. Não me deixo engabelar pelas lorotas dos feios, que dizem que a beleza interior e a única coisa que importa, que não vale nada ser belo e ter uma cabeça oca. Se fosse assim, meninas de catorze anos não estariam ganhando fortunas mostrando seus rostos lindos em capas de revistas. Beleza não e tudo, eu sei, mas tem grande importância. Nós, os lindos e gostosos, viemos ao mundo para encantar. Assim como as flores, o mar, o entardecer... Cruzes! Que conversa chata!

Então preparei o café e fui levar para a Natália.

  _ Obrigada, Quilly. Eu gostaria que você fechasse a porta.
  _ Certo.
  _ Mas ficasse aqui dentro - disse ao me ver saindo.

Fechei a porta e me sentei diante dela.

  _ Quilly, não sou pessoa de ficar enrolando, por isso serei direta. Você sabe que a dra. Joyce é amante do meu pai, não sabe?

Olhei firme pra ela.

  _ Natália, se existe algo que aprendi faz tempo é não me meter na vida dos outros. Ainda mais se esse "outro" paga meu salário.
  _ Fique tranqüila, ninguém saberá de nada. Não pretendo dar um tiro nela. De qualquer modo, se você não sabia, o que eu duvido, agora está sabendo. Aquela vagabunda se fez amiga de minha mãe para entrar em nossa casa, e agora vai pro motel com meu pai todo dia!

Fiz cara de paisagem e continuei calada.

  _ Acho você muito inteligente, Quilly, e gostaria que me mantivesse a par de todos os passos deles. Faria isso por mim?
  _ Não.
  _ Como é?
  _ Não. Se você quer saber dos passos deles ou de quem quer que seja, contrate um detetive. Sou uma profissional séria, seu pai é um patrão decente, e eu não tenho nada contra a dra. Joyce. Me deixe por fora de todo esse rolo, Natália. A vida particular de seu pai não e problema meu. E se era só isso, com licença, tenho uma tonelada de petições para digitar.

E com um sorriso gélido, saí da sala dela com a altivez dos justos.

O caminho estava aberto. Bastava agora dar os passos certinhos, um a um, com muita atenção, até o momento de armar o bote final. Ia ser muito engraçado ter uma enteada três anos mais nova que eu! Hahaha

Uma AmbiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora