☣VI☣

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Passamos por uma estrada de chão, sem buracos dessa vez. Em ambos os lados árvores densas despontavam em direção ao céu. Mais abaixo arbustos floridos povoavam a paisagem. Ótimo. Mais flores. Paramos em frente a uma porta negra de aço, John buzinou duas vezes e o portão se abriu. Havia árvores em ambos os lados, cheias de frutos que enchiam nossos olhos, era impressionante o quão lindos eram, podia-se até mesmo dizer que beiravam a perfeição. Após 3 minutos admirando a paisagem no caminho, chegamos a um casarão branco gelo que se sobressaía em meio às macieiras carregadas, o teto era de telhas azuladas que davam a arquitetura um ar de mistério. John estacionou bem na frente, sua feição demonstrava cansaço e um pouco de preocupação. Descemos do carro e seguimos em direção a grandiosa porta de entrada, tocamos a campainha e esperamos. A porta se abriu exalando um cheiro de rosas e um ar quente passou por nós.

- Olá jovens visitantes. - Disse uma voz arranhada. A dona da voz veio em seguida, se esgueirando pela porta entreaberta. Era uma figura magricela vestindo uma roupa completamente preta, desde os adornos no cabelo, até um macacão surrado e as sapatilhas escuras. Ela nos olhou de cima a baixo, até que chegou em John, seus olhos brilharam e um sorriso surgiu em sua face esquelética. - Joohn, querido. É mesmo você? - ela esfregou cantarolou.

John soltou um sorriso sem jeito. A mulher empurrou a porta, que abriu completamente.

- Vamos, entrem. Sintam-se em casa. - disse sorridente.

Quando nos demos conta, estávamos nos fundos da casa nada modesta de uma senhora misteriosa. Tomando chá e escutando sobre a infância de John.

- Houve uma vez em que ele fugiu de casa porque não deixei ele ter um cachorrinho. Achou na rua e simplesmente trouxe pra casa. - ela falava sobre John, enquanto ria.

- Sim senhora. Podemos para de falar sobre mim por um instante e nos concentrar na situação atual? - ele passou a mão nos fios grossos de seu cabelo negro.

Quem era aquela mulher? A mãe dele? Ao contrário de mim, Akim não estava nada surpreso. Se via apenas um ar de reprovação em seu olhar

- Essa é minha tia. - Disse John como quem lê pensamentos. - Devido a certas circunstâncias foi ela quem me criou. Bom... - ele soltou um olhar torto. - a maior parte do tempo. Agora vamos direto ao ponto, você sabe o por que viemos. Beatrix.

A senhora franziu a testa e mordeu os lábios. Ela sabia mais do que realmente queria saber. O fim começara. Com seus olhos azuis, ela encarava John.

- Já te falei pra não me chamar assim. Vamos, repita comigo: Tiii-a, Tiii-a. Ou se preferir aceito titia também.

- Não fuja do assunto.

- Ok. Vamos direto ao ponto. O fato é: não posso fazer nada, vamos lá é só o fim do mundo que conhecemos, nada demais. - Ela soltou um riso. - Tuudo bem, me sigam. Se após verem o que tenho a mostrar e ainda assim insistirem nessa loucura eu ajudo vocês.

Beatrix pousou sua xícara com delicadeza sobre a mesa e se levantou em silêncio. Fizemos o mesmo. E a seguimos pelo campo esverdeado, nuvens negras se formavam no céu. O dia estava calmo, a calmaria sempre vem antes da tempestade. No fim da propriedade havia um alçapão enferrujado e coberto por fuligem, que por causa da grama alta ao redor era difícil vê-lo ao longe. Beatrix puxou um cordão preso ao pescoço e uma chave surgiu, ela enfiou no cadeado e puxou o alçapão, que com um rangido se abriu. Estava escuro. Muito escuro. Ela foi na frente, havia uma escada e um corrimão do lado esquerdo. Lugares fechados me davam arrepios e esse era pior: embaixo da terra. Engoli em seco e tentei pensar em outra coisa. Campos verdes e abertos, o vento acariciando meu cabelo.

De volta a realidade.

Conforme fomos descendo, o ar vindo de baixo era quente, abafado e ao respirar o cheiro forte de mofo ardia nos pulmões, era diferente, misturado com um cheiro estranho. Era de... menta? Espremi os olhos para tentar enxergar, mas a escuridão era tremenda, parecia nos engolir. Uma luz ofuscante preencheu o local, agora os olhos antes acostumados com a escuridão, tentavam adaptar-se à repentina claridade.

A sala subterrânea era grande, estava bastante desorganizada, grandes estantes empoeiradas despontavam desde o chão até o teto, livros abertos e papéis rabiscados estavam espalhados pelo chão, mesinhas desorganizadas tornavam o lugar ainda menor. Passamos por entre os objetos caídos, tentando desviar o máximo possível para não danificar livro algum, mas se fosse realmente importante eles não estariam espalhados, ou estariam?

- Venham, por aqui. - Beatrix chamou.

- Talvez achemos um minotauro escondido por aqui também. - Disse Akim em tom de deboche.

Eu soltei um risinho. John olhou para Akim, que estava logo atrás, com reprovação em seus olhos. Como quem diz: "não é hora para piadas" ou ainda: "não entende a seriedade da situação?", mas nada disse.

Nos esgueiramos pelo meio das estantes que não estavam nada firmes no chão, elas balançavam e rangiam. Haviam várias teias de aranhas espalhadas aleatoriamente, Beatrix não deve limpar esse lugar há séculos, só de passar por ali meu nariz já estava vermelho e minha pele irritada. Pelo menos o ar condicionado funcionava, mesmo que fizesse um som ensurdecedor.

- Chegamos. - Disse Beatrix.

O canto do recinto era extremamente organizado, o que se é de estranhar com todo o redor em completo caos. Uma mesa de canto beirava a parede de um lado a outro, haviam pelo menos 5 monitores de 21 polegadas grudados em vigas de ferro que despontavam por detrás da mesa larga com seus fios a mostra, todos desligados. Beatrix apertou um botão azul no canto esquerdo da parede e os monitores ligaram.

- Aqui está.

Várias imagens de desastres apareciam na tela, tsunamis, terremotos, erupções vulcânicas, chuva ácida, pessoas doentes.

- O que é isso? - perguntei.

- Ahh minha querida, são desastres, digamos "naturais". - ela levou sua mão ao queixo.- ou pelo menos é assim que são tratados. Todos esses lugares que aparecem na tela estão sofrendo nesse exato momento, essas imagens são em tempo real. O mundo está caótico. Em pânico.

- O que causou tudo isso?

- São fissuras. O selo está fraco, desde então rachaduras começaram a aparecer ao redor do mundo. Liberando forças que há muito tentam escapar. Talvez até já haja alguns monstrinhos vagando por aí, isso é claro são os mais fracos, mas ainda assim podem provocar um desastre dos grandes.

Ela digitou alguma coisa no teclado, fazendo com que o globo terrestre aparecesse em uma das telas. Haviam várias marcações com pontos amarelos, vermelhos e azuis.

- Estão vendo esses pontos? - apontou. - os amarelos marcam as cidades onde estão acontecendo algum desses desastres nesse exato momento. Os azuis são os antigos pontos de incidência, que estamos sempre monitorando e os vermelhos são relatos do rompimento no espaço tempo. Ou seja, os que vão acontecer a qualquer momento.

Os pontos vermelhos dominavam completamente o globo, havia estados que estavam cheios, 200, não. Talvez 400 ou 500. Era assustador, como iria acabar essa história? Em minha mente passava o pior cenário possível, onde o mundo como conhecemos era extiguido, algo parecido com o mundo inicial, segundo a teoria do big Bang, cheio de vulcões e lava.

- Ah. Está desatualizado. - Beatrix apertou um botão no teclado, a tela mudou. Mostrando a animação de uma ampulheta e, instantes depois, de volta ao globo terrestre. Algo nos assustou. A todos, sem exceção, se via um semblante parecido. Medo. Simplesmente, estávamos perplexos e despreparados para ver algo assim. O globo terrestre ficou vermelho, haviam tantos pontos em vermelho que não mais se via as divisas dos países, nem sequer o formato. Era só uma bola vermelha que pairava na tela.

- Isso é ruim. Muito ruim. - Balbuciou John.

Um som metálico percorreu a sala.

- O que foi isso? - John perguntou.

- Deve ter sido um rato, já que ela não curte esse negócio de limpeza. - disparou Akim.

- Não há ratos aqui. - sussurou Beatrix.

- Fiquem aqui. - mandou John. - Vou ver o que foi isso.

Beatrix se voltou aos teclados e começou a digitar alguma coisa bem rápido, seus dedos moviam-se como se houvesse um motor em suas mãos. John seguiu o som, pisando cuidadosamente, nessa hora, todos rezávamos para que fosse somente um ratinho perdido. Ele logo desapareceu por entre as estantes. Foram longos minutos no silêncio penoso. Ouvimos novamente um som metálico, logo em seguida uma estante caiu. John soltou um urro de dor.

Entre Dimensões: GrimoireOnde histórias criam vida. Descubra agora