Capítulo 38

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Entrei silenciosamente no quarto dela, tomando cuidado para não acordar ninguém. Meus passos eram atentos, cuidadosos. Fechei lentamente a porta atrás de mim.

Estava muito escuro, mas não esperava outra coisa, são apenas 2:13 da manhã. Todos estavam a dormir. E Cora estava ainda ligada a uns fios.
Andei até a cama e afastei-a para o lado direito da cama. O suficiente para ter espaço para mim também.

Olhei em seu rosto e suspirei.

Minhas mãos foram directo para seu pulso. Fiz como aprendi, e como Melken fez. Tentei transmitir sua dor para mim, mas apenas senti um arrepio na espinha. Comigo aquilo não resulta. Tenho que tentar uma outra coisa. Mas o quê?

Lembrei que minha mãe disse que quando entro no corpo de alguém, ligo-me a essa pessoa de corpo e quase alma.
Então o fiz. Entrei no corpo de Cora como uma alma voltando para sua casa, seu corpo. E normalmente, senti uma sensação estranha, a mesma que sentia quando fazia isso no subterrâneo.
E fi-lo, transferi sua dor para mim, e foi como se minhas veias, pulmões, ossos, tudo, absolutamente tudo quebrasse com a fúria dessa transferência. Tive vontade de gritar intensamente, mas me controlei. Parecia uma avalanche de dores que se alastrava por todo meu corpo. Pesava, e ainda não tinha acabado de "entrar".

Mas e aí parou. Parou de transferir. A dor amenizou-se. Mas ainda me sentia pesada.
Saí do corpo da Cora com grande esforço e deitei-me ao seu lado. Minhas mãos pareciam estáticas, como se eu tivesse sido eletrificada. Minha garganta estava seca.

E depois foi como se meu sangue aquecesse. Aquecesse tanto que entrasse em estado de ebulição. Como se minha pele pudesse sair com essa queimadura. Uma dor horripilante que transpaceou meu corpo e alma.

Me contorci. Pareciam grandes marteladas no peito. Peguei o lençol firmemente, o suor corria, as lágrimas também se fizeram presentes. Não aguentei.

Gritei!

Mas logo fui consumida pela escuridão.

****

LAUREN

O café está pronto.

Eu estava na cozinha com uma chávena com café quente. E eu estava levando aquilo para o Tayle. Que está em meu quarto.

Situação meio estranha, admito. Mas ele mereceu isso e, pelo menos uma vez, como um pequeno consolo, eu decidi fazer um café para ele.

Tayle suportou muito essa semana. Sofreu pelo Mike, Cora e Kira. Mas ele foi forte o suficiente para manter um sorriso em seu rosto. Forte para continuar brincando. Forte para não mudar. Apesar que eu saber que toda aquela força, aqueles sorrisos, que eu simplesmente admirei muito nele, não fez diminuir seu sofrimento.

Cora melhorou. Foi um susto ter encontrado Kira naquele estado. Eu sabia que ela estava se culpando, mas não imaginei que fosse tanto, ao ponto de ela decidir morrer por isso.

Foi inacreditável.

Uma verdadeira loucura o que ela fez. Desafiou sua natureza. Foi longe. Podia morrer, se não aconteceu, é porque ela ainda tem caminhos por percorrer. Não morreu porque ainda tem muito que fazer em sua vida.

A casa estava silenciosa. Difren estava lançado no sofá da sala e Cora e Liam em seus quartos.

Andei calmamente com o café nas mãos, subi as escadas e quando cheguei ao meu quarto abri a porta com cuidado. Tayle estava sentado na minha cama. Ainda descamisado, como sempre fica depois de acordar. Uma imagem que nunca vai deixar de parecer nova, deslumbrante.

Tayle: nunca vou habituar a ver-te assim tão simpática - ele abriu um sorriso e eu fiz o mesmo

Lauren:é melhor mesmo, porque não será assim pra sempre

Tayle: isso depende de ti

Lauren: porquê de mim?

Tayle: porque para mim podemos estar nesse clima sempre

Lauren: o problema é que você não quer amizade

Tayle: eu quero! Mas não suporto não poder te beijar nem tocar - seu olhar estava fixo no meu e senti minhas bochechas esquentaram.

Lauren: o café vai esfriar - mudei logo de assunto e entreguei-lhe o seu café. Ele agradeceu e sentei-me ao seu lado

Tayle: está bom - abri um pequeno sorriso

Lauren: obrigada

Tayle: você fica linda sorrindo -revirei os com um sorriso nos lábios

Lauren: você não desiste?

Tayle: não! - ele soltou uma risada gostosa e voltou a tomar o café. Sua beleza é de admirar e chorar maravilhada. Seu cabelo está desarrumado, uns fios caem em seu rosto. Seus olhos em um tom cinza ficam mais chamativos pela manhã, seus lábios são finos e rosados. Seu sorriso o deixa meio criança e ele tem duas covinhas em suas bochechas que aparecem sempre que ele sorri.
Um sorriso se formou em seus labios quando percebeu que eu o encarava.

Tayle: gostou do que viu?- voltei a revirar os olhos e bati-o de leve na perna.

Lauren: idiota - ouvimos a porta bater e eu fui abri-la. Cora abriu um enorme sorriso quando nos viu.

Cora: Kira acordou - essas duas palavras me derrubaram. Quase não acreditei no que ouvi. Lágrimas se acumularam em meus olhos e eu fui para o quarto onde a Kira ficou essa semana toda. Um sorriso enorme, que quase não cabia em meu rosto se formou.

Quando vi a Kira, com o Liam ao seu lado, minhas lágrimas começaram a cair sem cerimónia. Fui abraça-lá.

Minha amiga acordou.

Ela está bem

Está viva.

Ela riu com meu sufoco e a larguei

Kira: antes que perguntem, estou bem - ela abriu um pequeno sorriso. Sua expressão ainda era meio fraca, cansada.

Tayle: você preocupou-nos tanto!

Kira: eu sei! E lamento por isso. Mas Cora está bem.

Cora: o que você fez não foi certo.

Kira: eu tinha que me redimir

Cora: aquilo foi suicídio.

Kira: estava a tentar acertar pelo menos daquela vez.

Cora: foi errado. Eu não queria isso.

Kira: eu não morri

Lauren: mas podia. Você errou. Não devia ter feito isso. Não era uma escolha sua - fiquei profundamente chateada quando soube o que ela fez. Ela podia morrer! É algo que não sai da minha cabeça. Ela realmente podia morrer.

Kira: como não era minha escolha? Eu compreendo que tenho que deixar de bancar a vossa babá, sei perfeitamente disso, está fixo em minha mente.
Não fiz isso por achar que devo cuidar de vocês. Fiz isso porque realmente fui culpada, porque eu nao conseguiria dormir direito. Então parem de tentar me controlar também. Sou dona das minhas acções, dona de mim, das minhas vontades.
Não precisam me olhar com pena, como se eu fosse uma menininha perdida e assustada. Que eu realmente fui. Mas estou crescendo com minhas quedas - ela olhou para mim. Suas palavras me tocaram profundamente. Fez-me perceber que sempre tentei cuidar dela como se fosse uma criança. Mas ela está crescendo. E virou uma mulher forte. Não é a mesma que conheci no orfanato. Não é a menina dos olhos assustados. Não mais.
Orgulho de irmã mais velha é o que sinto.
E todos pareciam surpresos. Como se ela já não parecesse tão frágil.

Sorrio

Liam: bom. Mudando de assunto, temos uma novidade - ele abriu um sorriso e Kira olhou-o com uma expressão curiosa.

Kira: boa ou má?

Liam: muito boa

Kira: o quê então? - ele parou por um tempo, fazendo um pouco de suspense. Revirei os olhos e ri.

Liam: Drifen se revelou útil. Já sabemos como voltar ao subterrâneo.

CALUTOnde histórias criam vida. Descubra agora