De Todo Coração

Limpei o suor que escorria pelo meu rosto e sorri. Minhas costas latejavam e os dedos da minha mão estavam doloridos, mas eu não iria desistir por causa de um pequeno incômodo, tinha que terminar minha obra prima. Eu gostava tanto do que fazia que o cansaço físico nunca me vencia.

Poucos minutos depois, ergui o tecido de pelo de cabra à minha frente e suspirei satisfeita. Mais uma maravilha finalizada. Me levantei, segurando o longo pano que havia acabado de tecer em minhas mãos, tomando o cuidado de não o deixar arrastar no chão, e segui para o lado de fora de casa onde meu pai estava. Já podia imaginar aquela cobertura, depois de lindamente tingida, sobre uma tenda enorme que seria erguida por meus irmãos. Papai analisava os pregos espessos em cima de uma mesa - ele sempre escolhia os melhores para serem usados nas tendas de nossos clientes -, ergueu os olhos quando viu que eu me aproximava e abriu um largo sorriso.

- Terminei mais essa cobertura. - coloquei uma das pontas do tecido em suas mãos para que ele pudesse sentir a textura. - Usei o melhor material e teci com cuidado e atenção.

- Sim, querida. Nunca se esqueça, "Tudo quanto te vier à mão para fazer, faze-o com todas as suas forças..." - ele repetiu as sábias palavras que havia ensinado a mim e meus irmãos desde pequenos. - Faça sempre com dedicação que o Senhor te recompensará. Esse é o segredo da nossa família, por isso nossas tendas são as melhores da região. - ele sorriu novamente. - E você é meu orgulho, minha preciosa Priscila!

Sorri agradecida e ele deu um beijo em minha testa.

Eu amava isso. O modo carinhoso como o velho Eli me ensinava e cuidava de mim como se eu ainda fosse uma garotinha, mesmo que eu já estivesse com meus 18 anos. Era muito bom ser a princesa da casa. Por causa disso me dava um frio na barriga toda vez que eu pensava que logo estaria casada com alguém, porque, afinal, será que ele cuidaria de mim da mesma forma que meu pai o fazia? E se esse homem não se importasse com meu coração e me escolhesse como esposa apenas por minha beleza? Engoli em seco e voltei para dentro de casa a fim de começar o tingimento do tecido para afastar esses pensamentos sombrios.

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Meu pai e meu irmão mais velho sempre viajavam para comprar os melhores materiais para nosso trabalho e aproveitavam para buscar novidades, a fim de melhorar ainda mais a qualidade de nossos serviços. Certa vez, porém, voltaram para casa não apenas com os produtos, mas com uma pessoa. Um rapaz judeu, natural da região do Ponto, cuja profissão também era a fabricação de tendas, havia se interessado pelo modo como fazíamos sucesso em nossa cidade e havia resolvido passar alguns dias conosco para aprender e, aparentemente, também fazer negócios com meu pai.

O jovem, chamado Áquila, era muito atraente; durante sua estadia em nossa casa, em nenhum momento chegamos a conversar, a não ser quando ele me agradecia por servir o jantar. Ele me respeitava por estar sob o teto de meu pai; Porém, algumas vezes notei seu olhar sobre mim enquanto eu trabalhava.

Após sua partida, ainda voltou mais algumas vezes para nos visitar. A principio pensei que ele ainda quisesse aprender, mas logo descobri seu verdadeiro interesse: ele havia pedido minha mão ao meu pai.

Apesar de sua beleza ter me agradado me senti temerosa, porque eu mal o conhecia. E se ele fosse o tipo de homem que eu temia? E se exigisse que eu não mais fizesse o trabalho que eu tanto amava?

Angustiada, naquela mesma noite pedi ao Deus de Israel que me livrasse do mal, que juntos pudéssemos ser um, e que nosso casamento servisse para mostrar a glória do nosso Senhor.