Já era quarta-feira e eu ainda não havia visto Blaine.
Enquanto minha querida O'Donnell me lotava de trabalhos intermináveis, eu não tinha muito tempo para pensar em nada além de agradá-la, o que era ótimo e me livrava de distrações indesejadas. Ele, por exemplo.
Foi só no fim da tarde, ao tirar minha pausa para o lanche, que eu o encontrei. Ponderei se teria como evitá-lo, mas não quis ser esse tipo de pessoa. Lidaria com ele como a adulta - embora com pouca experiência em ser adulta - que era.
Ele me notou logo depois de pegar seu copo. Café expresso, extra forte e quase nada de açúcar, como eu bem sabia. Cumprimentou-me com um aceno de cabeça e o meu sobrenome dito em voz baixa. Fui o mais educada que consegui, e o mais indiferente também. Não doeu, no fim das contas, mas algo em mim se aqueceu com aquele "Lancaster" rouco e cortês e com o fato de ele ter passado mais tempo parado na minha frente que o necessário.
Não pude evitar observá-lo se afastando, agarrando meu copo com as duas mãos para disfarçar a tremedeira. Por que ele não podia ter a droga de uma cafeteira dentro da sua sala? Ele era o chefe, e ainda assim eu teria que encará-lo em situações como essa.
Fui caminhando lentamente para onde os outros estagiários estavam sentados, sozinha com os meus pensamentos desconexos, subitamente consciente do fato de não ter ninguém para conversar no meio de tantas pessoas.
[...]
- Veeeeeeeeenus! - uma voz masculina me gritou do outro lado do campus, quando eu estava prestes a entrar no carro de Rachel - Me espera aí, mulher.
Sorri involuntariamente ao constatar que era Declan. Nem liguei para aquele escândalo todo como ligaria normalmente. Pelo menos ali eu tinha gente que gostava de olhar na minha cara.
Sim, eu ainda estava meio amarga por causa do dia anterior.
Encostei a porta e esperei que ele terminasse de correr até onde eu estava.
- O que foi?
- A gente tava pensando em sair amanhã. Eu, Carter e o pessoal de sempre - ele respondeu. - Ir pra algum bar legal, sabe? Você deveria ir também. Eu pedi a Rachel pra te chamar, mas como ela não comentou mais nada achei melhor falar direto contigo.
- Não, ela não me falou nada. Em casa brigo com ela - falei em tom de brincadeira. - Obrigada.
Caí no banco do carona assim que ele foi embora, despedindo-se com uma continência de dois dedos.
- Por que você não me deu o recado?
- Que recado? - ela perguntou, virando a chave na ignição.
- Declan disse que tinha pedido pra você me convidar para sair com vocês - expliquei.
- Ah, isso. Eu só estava esperando que o Carter tomasse coragem de falar com você invés de ficar fazendo a mim e ao Declan de pombo correio. Fez a gente jurar de pé junto que ia te chamar, olha que gracinha. Mas eu ia te chamar de qualquer jeito, claro - ela acrescentou, interpretando erroneamente o porquê de eu estar de queixo caído.
Então me lembrei de todas as vezes que eu havia me encontrado com Carter durante a semana, em circunstâncias que pareciam completamente forçadas e lugares nos quais eu raramente o via. Dos cochichos e olhares quando ele estava com alguém e eu passava por perto.
- Então ele quer muito que eu vá? - sorri repleta de malícia.
- Vai pegar o garotinho pra criar, é? - ela provocou.
- Quem sabe? - devolvi no mesmo tom.
Rachel me olhou de soslaio e riu em aprovação.
- É assim que se fala.
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Carpe Noctem
RomanceEu costumava achar que tinha tudo sobre controle. Era jovem, bonita, com um futuro promissor pela frente. Tudo ia muito bem, obrigada. Minhas preocupações giravam em torno de ir bem na faculdade e conseguir um bom emprego. Em outras...