Desagradavel

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Havia recobrado a consciência já há algum tempo. Ficou observando, imóvel, o quarto no qual repousava na mesma velha cadeira de madeira, bem observou. As paredes desbotadas e descascadas eram brancas, um branco encardido, sujo, triste, como as do seu quarto. No ar sentia o cheiro de café; o shampoo com cheiro assemelhado à canela que a tia usava; a mesma catinga de sempre; aquele cheiro de característica velhice, um cheiro de morte inevitável, mas esquecida, aquele cheiro triste, que já era acostumado, também estava presente. Mais além, forçando as narinas, fungando, podia sentir um leve aroma de perfume masculino, não muito forte, ainda camuflado no fedor de canela e velhice. Mais fraco ainda, quase surreal, sentiu o cheiro da estranheza; quase imperceptível, indistinguível para um desavisado, um cheiro errado, desconfortável. Delineou o olhar pela escrivaninha. Ainda continha os doze lápis, perfeitamente alinhados e apontados, e a caixa de abelhas amarelada do monitor. Definitivamente, estava em casa.

- Tavam falando, ainda hoje na televisão sobre isso – Markus pode ouvir a odiosa voz esganiçada da tia que vinha da cozinha, seu estomago se revirou – Sócias! Acho que foi o que o homem bonito da TV disse.

- Sósias, senhora, somos sósias – Disse uma voz retumbante, calma, serena, firme, e muito semelhante a sua não fosse pelo tom completamente distinto. Seu estomago embrulhou-se, outra vez.

- No vejo muita semelhante no sour e no seu Markus- escutou a velha empregada dizer na sua; perceptível para Markus, completa falta de intelecto. Sentiu o estomago dobrar-se sobre si, o gosto da bile atingiu as pupilas gustativas, quase simultaneamente. As narinas queimaram com o ácido gástrico. Um jato de piche explodiu para fora de sua boca. Uma água; escura com pedaços de carne, pão, arroz e feijão esparramou-se aos pés da tia.

-Seu Markus, meu Sued! – tentou consolar a americana – o sour no deve sair eatendo porcaria por aí – e mais um jarro de água lodosa viajou do estomago de Markus ao chão branco da cozinha.

- Deixem- nos a sós, pelo amor de Sued! – proferiu Markus, com a voz fraca e hesitante, sentia seu rosto como uma pedra de gelo, frio e branco. Tentou atabalhoadamente se levantar com o apoio da mesa, seus dedos resvalaram na madeira lisa do tampo, e por alguns centímetros não ficou banguela.

Após alguns tristes segundos que pareceram anos para Markus, tentara ficar em pé, sem êxito, claro. Suas pernas estavam fracas e tremiam, assim como todo seu corpo, chegou a imaginar-se caindo sem vida aos pés do homem desconhecido. Conseguiu endireitar-se depois de várias tentativas frustradas. Fitou o estranho à frente.

- Qual seu no... – não conseguiu terminar a pergunta, sendo interrompido.

- Pelos céus! De todos nós, eu tinha que conseguir me comunicar com este gordo verme inútil, típico dos Deuses – Markus ficou confuso com as palavras proferidas por sua duplicata – Me chame Larry, e temos pouco tempo. Sente-se – disse puxando uma cadeira.

Markus observou cuidadosamente o homem a sua frente, vestia-se de maneira estranha: um blusão cinza, com alguns desenhos estranhos, cobriam-lhe os ombros, os braços, mas terminava antes de lhe cobrir o abdômen, deixando exposta a camisa curta que vestia por baixo, esta, porém só cobria um lado do tronco, sendo presa por presilhas e elásticos envolta da barriga. Um suspensório de lado, pensou Markus. Pode notar no lado que não era coberto pela camisa um abdômen definido, desenhado, gomudo como uma laranja, uma esfregadeira. Não conseguiu evitar olhar para baixo, reparar seu próprio barrigão de barril, suas tetas caídas e flácidas.

- Eu deveria ter feito àqueles malditos exercícios

As calças de Larry eram cinza, comum, sóbria.

O Pseudo-escritorWhere stories live. Discover now