V1
O som dos meus pés esmagando a neve me distraí mais que o impacto do gelo sob minha pele.
Aquele zumbido que vem do nada -ou talvez seja simplesmente o som da natureza - ressoa por toda parte feito um pressionar histérico de campainha.Continuo correndo. Está nevando muito. Eu deveria estar acostumada com isso. Mais de 5 centímetros de neve sob mim e ainda tenho a falsa esperança que o sol nasça escaldante num belo dia, não vai aconteçer, o clima daqui é o reflexo de todos os moradores; frio . E vázio... Se bem que em toda parte esbarramos em carcaças humanas. Eu posso ser uma. Frágil e vázia. Como o inverno. Tão feia quanto ele. Odeio inverno. Pareçe um sutil convite para coisas ruins... "seja como eu", quase dá pra ouvir os sussuros entre as rajadas de vento, o inverno nunca deixa de fazer seu convite discreto para o suicídio.
Balanço a cabeça afastando os pensamentos.
Minha casa está perto. Sorrio. Está bem ali parada, quadrada, fria... De vidro. É aquecida por dentro mas quando estou lá, na casa progetada pelo arquiteto sem graça que só se preocupa com quantos zeros virá em seu cheque, me sinto submersa em pleno oceano... O Atlântico, de preferência. A caixa de vidro mais sufoca que protege. Mais amedronta que conforta.
Minha mãe escolheu uma casa térrea, mesmo com a neve caindo e a visão embaçada pelo esforço físico, consigo ver a Libby -a empregada recém contratada - passando aspirador de pó na droga daquele carpete enorme de pelos brancos de algum animal grande. Os únicos espelhos "ilusórios" , como Vance Redington -o arquiteto que progetou a casa para meus pais - os nomeou, são os dos quartos e banheiros, o que significa que ao usar o banheiro da casa se tem a visão 360 graus da casa toda, isso aí, o centro da construção é um banheiro todo rodeado de vidros ilusórios ao invés de paredes comuns, como pessoas normais fariam.
Do meu quarto consigo ver as montanhas ao longe e todo o vázio que nos abrange aqui, não temos vizinhos, a coisa mais próxima é um posto de gasolina -há 10 kilometros - , da sala temos a visão ampla da cozinha e de tudo que nos cerca, nos vidros que são as paredes dos quartos vendo-se de fora encararemos nosso próprio reflexo , uma mensagem implícita para visitantes "Não ouçam atrás das portas." e a complementação da frase é "Porque vemos vocês " , quem estiver do lado de dentro verá você no corredor, ou na sala, ou chegando de carro estando metros longe.
Todos os móveis são ridiculamente... Modernos demais. Não são ridículos pra muita gente que de fato, admira isso. Não sou dessa gente. Não sei que tipo de decoração escolheria pra nossa casa mas com certeza haveria cores além de cinza, branco e preto.Paro puxando ar para os pulmões. As portas são de vidro revestido, acerte um machado e se surpreenderá, não é vidro de verdade, só querem que pense que pode tentar invadir pra então disparar uns cem alarmes.
Empurro a porta e o ar quente me faz gemer chamando a atenção da Libby.
Ela me vê e esclama desligando o aspirador imediatamente, a pequena mulher de pele corada e trança enorme vem na minha direção.—Menina o que aconteçeu?—Pergunta com a voz fina cheia de preocupação.
—Nada. —Falo surpresa por não gaguejar.
Ela avalia meu corpo. Sei bem porque o choque. Está nevando torrencialmente lá fora, estou de pés descalços, regata branca e shorts fino. Cabelos molhados. Tremendo. Arfando. Minhas pernas estão doloridas. Braços exaustos. Corri até sentir que apagaria e então fiz a volta. Pelas minhas contas deveria ter desmaiado há minutos atrás mas meu corpo deve estar se adaptando a isso.
—Mas... A senhorita está...
—Eu sei Libby, fui só... Correr. —Respiro com dificuldade por entre os dentes. Hipotermia?—Sabe me dizer que horas são?
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Todas As Vítimas
Mystery / ThrillerVítima número 1 ; Laurel Hoover Vítima número 2 ; Jordan Anderson Vítima número 3 ; Daphine Gonzales Vítima número 4 ; Lucas Sawyer Estão todos conectados pelas mesmas raízes e procuram uma liberdade que só pode ser alcançada quando o primeiro reagi...