CAPÍTULO TRÊS

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Haviam se passado poucos dias desde a entrevista de Olivia. Era uma sexta-feira ensolarada e ela se encontrava sentada na terceira fileira da aula do Sr. Arthur, encarando seu notebook aberto. Enquanto prestava atenção nas técnicas de marketing criativo, ouviu seu nome ser chamado na porta da sala. Era o secretário da diretoria do seu curso.

— Oi Kit. — chamou o rapaz pelo apelido, fechando a porta atrás de si.

— Estão te chamando na diretoria! — disse apressado, iniciando passos largos. Olivia logo começou a segui-lo.

— Aconteceu alguma coisa? Juro que não fiz nada.

— Não faço ideia, só me mandaram te chamar, você me deixa agoniado com tantas perguntas... — tão novo, mas tão rabugento.

— Eu que te deixo agoniado? — riu sozinha.

— O dono de uma empresa acabou de sair daqui, ele é muito rico. Dinheiro e pessoas ricas me deixam nervoso...

Não teve tempo de responder quando Kit abriu a porta da diretoria, e empurrou-a para dentro.

— Eu não sei porque ele é assim tão nervoso o tempo todo... — a mulher dentro da sala falou enquanto mexia em alguns papéis dispostos na mesa.

Aquela era Martha, diretora do curso de Jornalismo e Publicidade de uma das maiores e melhores Universidades do país. Olivia a admirava muito, mas não se sentia intimidada por ela, era uma mulher tranquila e simpática, que por vezes até lembrava a sua própria mãe.

Né? — foi á única coisa que disse, afinal, não fazia ideia do porque estava ali.

— Parabéns, Olivia! Imagino que isso seja uma conquista enorme para você, eu só preciso que você assine alguns papéis... E leia tudo antes de assinar.

— O que? — estava confusa, mas sentiu o coração apertar.

— Da Editora Meraki, os responsáveis pela empresa vieram aqui entregar alguns papéis sobre o seu estágio e visitar a Universidade.

— O QUE? — descontrolou-se, quase gritando. A mulher mais velha riu.

— Você não foi avisada?

— NÃO! — pigarreou. — Não. Ninguém me ligou, nem me avisou nada... — sentiu o coração disparar e o sorriso no rosto que abriu logo em seguida foi espontâneo. Sentia-se emocionada, e feliz.

— Aqui os papéis.

— Eu estou tremendo... — pegou a caneta, olhou para as folhas na mesa tentando ler, mas não conseguia se concentrar. Decidiu simplesmente assiná-los. A letra saiu horrível.

— Agora, a gente precisa tirar uma foto sua aqui na Universidade...

— Foto? Pra que?

— Eles pediram, pra publicar nas redes sociais junto com alguma nota sua sobre ter conseguido o estágio.

— Ah, ok. — sentiu um frio na barriga. — Falando "neles", quem são? Eles queriam só conhecer o lugar?

— O CEO que todo mundo conhece, alguém com um cargo mais poderoso que o dele, cujo eu não consegui identificar, uma assistente e mais duas pessoas que não falaram nada. — O CEO. O babaca esteve aqui. — Eles vieram visitar a Universidade, mais especificamente o nosso curso, me informaram que além da parceria viabilizam algum evento junto a nós em breve. A ideia é incrível. — disse calmamente.

— Realmente incrível!

— Agora vamos, tem um fotógrafo ai fora te esperando. Você escreve alguma nota que ache interessante ser divulgada sobre você e sobre essa experiência, e me envia por e-mail ainda hoje, ok?

Tudo bem, obrigada! — ainda pulava por dentro quando saiu da sala.

*****

QUARENTA MIL CURTIDAS! — Molly disse histérica quando Olivia atendeu o celular.
— Pelo menos eu tinha lavado o cabelo no dia da foto. Até que sai bonitinha, né? — abriu a foto e se encarou novamente, enquanto escutava a amiga falar pelos fones de ouvido. Estava em um banco defronte ao prédio da Meraki. Era o seu primeiro dia de estágio e ainda faltavam trinta minutos para o seu horário, portanto decidiu estacionar a bicicleta e sentar-se um pouco para acalmar os nervos.

A foto que haviam colocado era uma montagem de duas fotos dela, uma em pé de frente a placa com o nome da Universidade segurando um livro de Stephen King, e a outra enquadrava o seu rosto, olhando fixo para lente com um sorriso aberto.

— Essa ideia de colocar sua foto nas redes sociais deles foi genial... — Ficaram conversando por um tempo. Olivia sorria abobada e respirava fundo o ar agradável da trégua do inverno, quando verificou a hora novamente, viu que deveria entrar no prédio.

— Vou entrar agora, tá? — levantou, juntando as coisas.

— Tá, boa sorte. E tira muita foto de tudo que eu quero ver depois...

Entrou no prédio a passos fervorosos, caminhou até a recepção e foi informada que alguém a estava esperando no décimo quarto andar. Entrou no elevador cheio e quando chegou, imediatamente foi interceptada por uma loira muito "alternativa". Tinha a franja cortada ao meio da testa, o cabelo era loiro quase branco e usava roupas pretas, com uma jaqueta jeans cheia de brilho por cima. Para a alegria de Olivia ela era do time garotas-que-gostam-de-sapatos-confortáveis, visto que a bota que calçava era parecida com a sua.

— Você deve ser Olivia. Meu nome é Charlotte, mas pode me chamar de Charlie. — Olivia estendeu a mão, mas tomou um susto quando recebeu um abraço. Não conseguiu dizer nada, e antes que pensasse em algo, a loira já tinha voltado a tagarelar.

— Então, queria te explicar que hoje sua tarde ficará dividida em dois momentos. Você quer se sentar? Não, não precisa não é? Vai ser bem rápido. — puxou um tablet de dentro da jaqueta, o pensamento a mil por hora. — Primeiro eu vou com você te apresentar para o setor em que você ficou designada, que foi o setor de criação, certo? Não se preocupe, todo mundo de lá é muito legal e gostam muito de sair depois dos expedientes. — deu uma pausa, Olivia pensou que aquela seria uma deixa para que ela falasse algo, mas não, não era. — Depois disso eu vou te deixar a vontade para conhecer o prédio e por hoje é basicamente isso. Ah! Quase me esqueci, preciso também que mais tarde você passe no RH e dê os seus dados bancários, e escolha um dia do mês para receber o seu dinheiro.

— Dinheiro? Eu não sabia que seria remunerado...

— Mas é claro que é. O próprio CEO foi até a sua Universidade deixar os papéis. — Ah, os papéis... Aqueles que Olivia não leu por que estava nervosa demais para isso. Sentiu as pernas formigarem. Estágio remunerado, aquilo estava sendo bem melhor do que ela imaginava. — Falando nisso, vamos logo, tenho que voltar para o meu setor.

— Em que setor você fica? — as duas começaram a andar.

— No setor de presidencial e de reuniões, sou a assistente do CEO. Fui assistente do pai dele durante um ano, mas desde que o filho assumiu o cargo, agora sou dele. Não dele, do trabalho dele. Você entendeu... — quando se aproximaram de um espaço amplo, cheio de mesas, computadores, telas, mesas ainda maiores com instrumentos de criação em cima, Olivia soube onde estava e seus olhos brilharam.

Metade da parede era de estantes com livros e a outra feita de vidro que ia do chão ao teto, dando uma visão incrível do lado de fora do prédio.

— Oi gente, boa tarde! BOA TARDE! — o burburinho era enorme, então Charlie aumentou o tom de voz.

— Desculpa Charlie. — uma das pessoas falou.

— É dia de escolha de capa! — outra exclamou, justificando-se.

— Essa daqui é a Olivia... É a nova estagiária de vocês, podem explorar ela. — Charlie riu e Olivia sorriu nervosa. — Brincadeira! Sejam legais com a Olivia, certo?

Ela escutou alguns "boa tarde" e outros "oi Olivia", mas sem ter como responder a cada um, só continuou acenando com um sorriso largo no rosto, que agora encontrava-se escarlate.

Depois de um tempo só notou que começava a anoitecer quando viu algumas pessoas recolherem suas coisas para ir embora. Olivia estava sentada com sua mais nova parceira de trabalho, Jade. Que também era estagiária, mas já estava lá há duas semanas. As duas passaram as últimas horas conferindo a escrita e a capa de um livro ilustrado. Jade mencionara que este já tinha passado na mão de mais de cinco revisores, mas que ainda assim acabara nas suas, explicando que a Meraki era extremamente exigente com esse tipo de coisa.

Olivia sentiu a garganta seca, pediu licença a Jade e saiu em direção a copa do andar, que tinha sido apresentada mais cedo por um dos funcionários do setor.

Bebeu água, e se espreguiçou.

Quando girou os pés para voltar, escutou um estrondo de algo caindo no chão e seguiu em direção ao barulho. Vinha de uma sala separada. Essa tinha metade de sua parede de vidro, que no momento estava coberta de desenhos e ilustrações, provavelmente colocados por alguém de dentro, assim, quem estava fora da sala também podia ver.

Olivia se aproximou de um desenho que chamara sua atenção, provavelmente de algum livro de fantasia, os detalhes eram incríveis.
Pulou, tomando um susto, quando a folha foi removida e um rapaz apareceu do outro lado. Quando ele percebeu que havia assustado a menina, abriu a porta.

— Desculpa se te assustei... — o dono da voz, era um rapaz pouco mais velho que ela. Tinha o cabelo castanho escuro curto, e usava óculos clubmaster de grau, por trás destes os olhos cor de mel pareciam gentis.

— Não, tudo bem... Eu que sou a bisbilhoteira aqui. — sorriu, tirando a mão que ainda estava sobre o peito devido ao susto.

— Você é nova aqui?

— Sim, sou. Na verdade hoje é o meu primeiro dia. — sorriu com o peito estufado.

— Imaginei. — estendeu a mão para cumprimentá-la. — Eu não esqueceria um rosto como o seu.

Olivia corou levemente quando sentiu o olhar fixo no rosto dela, era como se ele estivesse examinando cada detalhe e traço.

— Sou Olivia.

— Josh. — Olivia escutou outro barulho e esticou o pescoço para tentar ver algo dentro do cômodo.

Josh entrou de volta na sala, com uma Olivia curiosa atrás dele. No chão vários lápis e canetas de todas as cores espalhadas, e em cima de uma mesa central... Um gato.

— Isso é um...?

— É o meu gato. Eu tive que levar ele para o veterinário pra tomar banho, mas quando cheguei lá, estava tudo fechado. Só me restou trazer ele pra cá...

— Eu não quero ser chata, mas... Isso é permitido? — se aproximou do gato, acariciando-o.

— Não. Quer dizer... O pessoal do setor não liga. Só eu fico nessa sala durante a tarde. Mas se alguém fora eles virem, provavelmente não vai gostar.

Olivia assentiu e ajoelhou-se, começando a recolher o que estava no chão.

— Não, você não precisa me ajudar.

— Não se preocupe, eu faço questão. Aliás, eu adoro gatos.

Josh sorriu e acompanhou a menina na tarefa.

Alguns minutos depois os dois entraram juntos no elevador, enquanto conversavam animadamente sobre uma série de livros que ambos gostavam. Quando já estavam na porta de saída, se despediram e Olivia engatinhou uma conversa com o gato de Josh.

— Tchau bichinho lindo. Coisinha fofa. Vejo você depois, tá? — ela fazia sons estranhos no meio das frases. Antes de dar um último "tchau", olhou para o lado e viu que dois homens a encaravam franzindo a testa, e um deles fora impossível de não reconhecer. Era ele, o babaca novamente. Fingiu que ele simplesmente não a notara em seu maior momento de descontrole social: animais fofinhos.

— Tchau Olivia.

— Tchau Josh! — saiu correndo em direção a sua bicicleta.

Quando Você Me Toca (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora