Quem é Ela?

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Nas ruas das grandes cidades, há uma frieza distante e amedrontada entre as gentes. Gente no plural, pois são diversas as tribos urbanas. Dentre estas, alguma gente interessante pra se conhecer. Ao cair de uma entre tantas tardes, diante de um dentre tantos sinaleiros, avistou Renato uma artista de rua, a apresentar números de malabares com tochas de fogo, girando-as em círculos, alternadas em número, direção e ritmo de movimento. Aquela garota era incrível! Quem é ela? Seu jogo parecia tão fácil, que Renato não resistiu a amassar três latas e arriscar um número. Desilusão e mico! Para aumentar o sentimento de vexame, ela se aproximou.

-E aí? – Cumprimentou-o como se fossem velhos amigos.

-E aí? – Sua cara ardia em timidez.

-Quer aprender uns números?

-Até gostaria, mas acho que não levo jeito.

-Quem não tenta, não se reinventa. Como te chamo?

"Faz sinal de fogo, que eu sigo a fumaça e venho". Não, Renato não disse isso. Ele se imaginou dizendo.

-Ei, quero saber seu nome.

-Renato. –Outra vez, a face corou.

-Renasça, Renato.

Ela era diferente de tudo o que ele havia visto em sua vida.

-Meu nome é Sabrina.

Sabrina!

Sabrina ensinou-lhe a fazer, com latas amassadas, números simples, com número reduzido de objetos. Para ela, foi divertido. Para ele, inesquecível. Trocaram ideias, mas não trocaram número de telefone. Renato não tinha um, dada a limitação financeira do momento. Sabrina não tinha um, por estilo de vida. Renato quase deixou escapar o quão linda se lhe afigurou ela. "Areia demais pro seu caminhãozinho"- disse a si mesmo. No mais, era hora de voltar para casa. Em seu bairro não há toque de recolher, como havia nos tempos de ditadura, mas há 'hora de se proteger', a qual se aprende sem que ninguém diga nada.

"A gente se esbarra!". – Ah, essas palavras soaram-lhe a promessas mil de aventuradas horas românticas. Aos dias seguintes, Renato a buscava enquanto trabalhava. E aquele desejo de ter alguém em específico por companhia, inspirava-lhe a sensação de 'solidão na multidão'. Renato estava apaixonado. Apaixonado, talvez, por Sabrina. Apaixonado, talvez pelo conceito que nela se embutia. E só, pelas ruas da cidade, a buscar aquela imagem de Deusa do Fogo, tudo o que ele via eram anônimos em seus carros de vidros fechados, a ocultar olhares baixo enormes lentes de óculos de sol, como que disfarçados para um baile de máscaras. Todos pareciam esconder-se. Poucos podiam mostrar suas caras.

O dono da riqueza torna-se vítima do medo de perdê-la.

Torna-se vítima do medo de perder sua vida,

Para que a vítima da pobreza sinta-se,

Um pouco, dona da riqueza.

O Catador de SonhosOnde histórias criam vida. Descubra agora