- Como a sua família reagiu, quando você disse que queria ir para Inglaterra? – Orion indagou.
Estávamos em seu carro, a caminho de uma parte não muito bem quista, no centro da cidade. Eu já havia desistido de tentar fugir, a minha desistência foi esvaída junto com o meu orgasmo, ontem à noite. E o fato de eu ter passado a noite num jogo de sedução com Orion, e ter dormido agarrada a ele, contribuiu e muito.
- Eles tentaram me impedir. – Respondi. – Usaram de chantagem emocional e tudo mais. Entretanto, posso ser muito teimosa quando quero. Naquele momento, quando decidi "cair na estrada", eu queria dar um tempo de tudo isso. – Olhei para ele e um sorriso surgiu em meu rosto. – Queria distância do lobo mau.
- E agora?
- Não sei, mas acho que o lobo mau tem suas virtudes, principalmente quando usa a língua. – Passei a língua de leve, nos lábios.
- "Quem tem medo do lobo mau, lobo mau" – Cantarolou num tom sarcástico.
- Essa música é de onde? – Perguntei depois de uma sonora gargalhada.
- Sei lá, escutei uma vez, em uma das minhas viagens.
- Isso não é inglês, nem Scots, muito menos gaélico escocês.
- Claro que não, isso é português. – Explicou tranquilamente.
- Não sabia que você falava outras línguas. – Comentei.
- Não é como se nós tivéssemos falado bastante sobre nós mesmos, concorda? – Fiz que sim com a cabeça. – Então, viajei muito pelo mundo, não podia ficar muito tempo em um lugar, por mais incrível que este fosse. As pessoas da sua irmandade nunca desistiram de tentar me encontrar, o que significa que sempre estive com vários rastreadores nas minhas costas. Foi então que conheci a Lauren, ela estava viajando de férias com o falecido marido. Senti a aura de bruxa na primeira vez que a vi.
- Quando foi isso? – Indaguei.
- Logo depois que Victor morreu. – Respondeu tranquilamente e eu olhei pasma para ele. – Lauren fez uma poção, que faz com que mantemos a aparência, nunca envelhecemos. Podemos morrer devido a outras circunstâncias, tais como acidentes e essas coisas, porém nós não envelhecemos.
- Mas, e se deixar de tomar?
- Eu tecnicamente me torno humano, claro que não completamente, já que eu sou um lobisomem e nunca serei um humano normal. O que estou tentando dizer, é que envelhecerei assim com você.
- Você permaneceu vivo para tentar encontrar o livro?
- Sim, Frankenstein pediu isso antes de morrer. Ele sabia o perigo que seria gerado, caso o livro caísse nas mãos erradas. – Orion encolheu os ombros. – Pelo visto ele estava muito mais que certo, ao pensar assim.
- Mas, a irmandade não criou todos esses lobisomens que existem por aí.
- Não, porém eles criaram alguns que fugiram e que transformaram outros lobos. – Quando ergui as sobrancelhas, ele explicou. – Os lobisomens que a irmandade criou, se alimentam de seres humanos e transformam outros lobos. A mordida deles não surte efeito algum em humanos, mas em outros lobos, é fatalmente contagioso.
- Uau, isso eu não sabia. – Pensei sobre o que ele disse, e então uma dúvida surgiu. – E se você morder um humano?
- Nunca fiz isso, nem penso em fazer num futuro próximo. Porém, acredito que geraria outros como eu.
- Você...
- Não, nunca morderia você, principalmente por não saber o que a tal mordida gerará.
- Vamos esquecer esse assunto. – Disse e aumentei o som do carro e comecei a me embriagar pelo ritmo delicioso. Sorri e cantei para Orion. - I think that I'm human.
- Parece que eles ouviram a nossa conversa. – Brincou.
- Gosto de pensar, que o Jesse tem a capacidade de criar músicas para todos os tipos de situações, em que os mais diversos casais se encontram. – Falei. – Essa combina com a gente.
- Isso não existe, é só uma música.
- Você gostou dela, lobo mau. – Provoquei.
- Talvez. – Se fez de difícil e estacionou o carro. – Venha, preciso comprar algumas coisas.
- Aqui? – Pela janela, olhei para o mal falado bairro de Walterwood.
- Sim, aqui consigo armas num preço bom e sem tanta burocracia, se é que me entende. – Franzi o cenho para ele. – Não posso sair para enfrentar todas aquelas pessoas na irmandade, apenas comigo mesmo como arma.
- Eu irei ajudar você, eu...
- Aquelas armas são para o seu uso, é para que você possa se proteger. – Ele relanceou um olhar para mim. – Já vi você em ação, e sei que faz bom uso de todas elas.
- Ramsés pensa diferente.
- Ele apenas que descontar e você a sua frustração sexual, pois não pode foder você. – Orion foi direto.
- Eu...eu. – Não conseguia formular uma frase.
- Nunca desconfiou? – Fiz que não com a cabeça. – Em todos os seus treinamentos, na floresta, eu estava lá. Vi todos os olhares soturnos e luxuriosos que ele lhe lançava.
- Jamais imaginei isso.
- Você costuma ser bem distraída as vezes.
- Seja sincero.
- Okay, você é sempre muito distraída, mas é interessante te observar. – Comentou. – Acho engraçado o jeito que você fala sozinha, quando está assistindo algum filme ou série, ou quando briga com personagens fictícios de livros. – Riu. – Uma vez pensei que você havia me descoberto, pois soltou um "Acha que não estou vendo o que você está fazendo? ". Demorou alguns segundos, para eu perceber que você estava falando com o livro.
- Não faço isso! – Protestei. – E como você pode ficar me espionando?
- Ora, podendo! – Disse o obvio. – E sim, você faz. Também faz algumas caretas. Tipo, semicerra os olhos, franze a testa, ergue as sobrancelhas.
- Você é uma criatura muito observadora.
- Obrigado.
- Isso não foi um elogio. – Disse felinamente.
- Tanto faz. – Abriu a porta e deu a meia volta, para abrir a porta para mim. – Vamos?
Desci da caminhonete e Orion enlaçou as nossas mãos e caminhamos assim até um dos galpões industriais. Eu fiquei meio surpresa com o gesto dele, mas não de uma maneira negativa.
Entramos no lugar, e o ruivo se encaminhou até um grupo de homens, que carregavam duas grandes maletas. Antes de chegarmos até ele, Orion soltou a minha mão e fez um gesto para que eu ficasse ali.
Observei enquanto ele andava até lá, falava alguma coisa com o homem que parecia ser o líder, e depois de depositar um envelope na mão deste suspendeu ambas as maletas e deu meia volta, para retornar a mim.
- Pronto. – Disse somente.
**
- Quem eram aqueles homens? – Indaguei, quando já estávamos no carro novamente.
- Traficantes de armas. – Respondeu com naturalidade.
- E você fala assim, naturalmente?
- Você queria que eu falasse mais dramaticamente? Tudo bem – Respirou fundo e falou. – ELES ERAM TRAFICANTES DE ARMAAAAS. – Disse o mais dramático possível.
- Engraçadinho.
- Porém, falando sério, Daphne. Eu preciso de armas, e fui aonde sabia que encontraria.
- Eu sei.
- Agora podemos ir na "casa da vovó". – Falou. – Vamos esta noite.
- Enlouqueceu? Por que tão rápido?
- Já esperei séculos, Daph. Agora é a hora.
trm5
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Red
Short StoryNem todo conto de fadas é do jeito que imaginamos... Há muitas releituras de uma mesma história, mas sempre vendo só um lado da situação: a da mocinha e do mocinho. Os vilões sempre são vistos como os únicos errados da situação, mas será que se...