Capítulo 1 - Mudança

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      Sentada em um banco de couro negro, ao som de um toque suave de piano, via a paisagem exterior correr por meus olhos. Encostei meu rosto na janela do carro, enquanto captava os altos edifícios e as luzes de neon que decoravam o cenário. Então aquilo era uma cidade grande? Preferia a calmaria de Buoregon, com suas inúmeras árvores e o cheiro inebriante de terra molhada, causado pelo clima úmido da região. Aquilo ali que eu estava vendo agora? Parecia um caos. Preciso que alguém me explique a graça de estar no meio de uma selva de pedra com luzes piscando em todos os cantos.

- Alice! - acordei do meu transe com a voz estridente de minha mãe, Clara.

- O que foi? - bradei, irritada.

- Sua irmã te fez uma pergunta. Em que planeta você está?

Estar em outro planeta seria maravilhoso. Me tira daqui.

-  O que você quer? - perguntei, virando-me para a loira oxigenada ao meu lado.

- Ih, olhe o bicho! - Esther falou, com tom de ironia -   Só queria saber se está ansiosa para chegar à nossa nova mansão. -  um sorriso maldoso se estampou em seu rosto após fazer o questionamento.

Aquela coisa sabia muito bem o meu sentimento em relação a tudo aquilo. Acham que é fácil sair da cidade onde estão seus amigos, sua família, seus lugares preferidos? Façam o teste. É frustante, principalmente quando é algo feito sem planejamento algum. Em um dia soube da notícia, no outro eu já fui lançada em um automóvel negro, rumo ao meu novo "lar". Não pude me despedir de inúmeras pessoas, e aquilo me doía o coração.

Não iria responder àquela cretina que queria me provocar. Simplesmente fiz minha maior cara feia e dei as costas. Era por culpa dela que estávamos migrando para um lugar totalmente diferente do meu ambiente habitual. Esther iniciou a carreira de modelo há pouco tempo, mas ascendeu em uma velocidade impressionante. Por estar na mira de diversas marcas importantes, logo ela foi convocada para um grande centro, como Turjitown. E, é claro, como minha mãe faz as vontades dessa exibida, tivemos de nos mudar o mais rápido possível.

Engraçado que ninguém pensou em mim antes de tomar qualquer decisão.

- Estamos chegando - falou meu pai, Marcos, do banco do motorista.

- A casa é grande? Tenho que ter espaço para dar minhas festas - disse Esther.

- Claro! É maior até do que a mansão anterior. Temos cinco quartos a mais que o habitual. Teremos espaço de sobra, querida

Como sempre, minha mãe cedendo aos caprichos da princesa.

- Ótimo! Preciso ter uma casa à altura da minha carreira. -  ela pegou o celular da bolsa Chanel, de uma cor rosa tão pink que dava nojo -  Já viu quantas revistas estão comentando sobre a minha mudança e como é promissora? Preciso atrair todos os holofotes para mim neste momento.

- Ridículo - disse, quase de maneira inaudível.

Quase, porque a loira arqueou as sobrancelhas em protesto ao ouvir meu comentário.

- Sinto muito por sua inveja, querida. É difícil não ter um corpo perfeito, olhos castanhos sem vida e um cabelo curto tão morto quanto o resto da sua aparência.

- Sou mais minha aparência natural a essa sua cara rebocada e esse cabelo loiro de vassoura. Você é superficial por fora e por dentro, digna de pena.

- Vão começar mais uma vez com essa discussão? -  perguntou meu pai -  Por favor, creio que duas jovens de 17 e 25 anos já não tenham idade para essas provocações.

- Vai ver você se esqueceu de educar sua filha mais velha - falei.

- Alice, mais uma ousadia sua e vamos nos resolver.

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