Emma Swan

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Hesitei diante do escritório no nono andar, a mão erguida para bater à porta. Do outro lado, estava Emma Swan, a nova diretora de marketing da Angeles. Ela me convocara via e-mail para ir até seu escritório para um "bate-papo" (palavra dela, não minha) no terceiro dia após meu retorno à Angeles.

A idéia de voltar ao trabalho convertera minhas emoções num pêndulo que oscilava constantemente entre o medo e a empolgação. O medo me toma­va de assalto a cada vez que pensava em minha ausência por tantas semanas que, talvez, não lembrasse mais o que fazer. O pêndulo, então, passava para a empolgação, porque esse fato de eu não me lembrar mais o que fazer significa­va que o trabalho seria um tipo diferente de desafio. Então, temia novamente porque estaria a quilômetros de distância de Laura. Passara dois dias sem a menina quando ela estivera no grupo de recreação da escola, mas, uma vez que eu estivesse trabalhando de volta ao centro de Storybrooke, para estar com Laura dependeria do trânsito e do transporte público; não poderia simplesmente caminhar até a esquina para buscá-la. Em seguida, tornava a ficar empolgada porque não teria de passar mais horas assistindo à programação infantil na tevê e, portanto, conseguiria parar de falar e pensar da maneira exagerada como faziam os apresentadores.

Entre a ansiedade e a expectativa, estava a certeza de que eu iria conhecer Emma Swan. Era minha chefe, a pessoa com quem trabalharia mais direta­mente e também era minha primeira nêmesis no trabalho — a única colega que conhecia que ficara com o cargo que deveria ter sido meu. Sua presença na Angeles estaria sempre esfregando na minha cara a incapacidade de ascender até o topo.

No meu primeiro dia de volta ao trabalho, Laura, que não ficara nem um pouco nervosa no seu primeiro dia no grupo de recreação (estivera empolgada a caminho de lá e, então, incrivelmente falante naquela noite), dera-me um abraço forte, redobrado, junto aos portões da escola.

— Divirta-se no seu trabalho — dissera-me, como se fosse a adulta e eu, a criança.

O percurso de trem até o centro  depois daquilo fora carregado de tensão. Tudo em que pude pensar foi em não me deixar intimidar por Emma Swan. Quando, enfim, cheguei ao meu escritório no décimo andar, eu es­tava com os nervos em frangalhos, dividida entre a vontade de vomitar e a de esbofeteá-la no segundo em que a conhecesse para mostrar quem era a verda­deira chefe ali. Descobri, dez minutos depois, que ela estaria fora até sexta-feira.

Sexta-feira. A próxima.

Uma vez que eu soube que não seria obrigada a lidar com minha arquiinimiga, descontraí-me no trabalho, gostei de rever as pessoas que foram me contar suas novidades, para saber o que eu andara fazendo. Ruby, que estivera sozi­nha em nosso escritório por quase dois meses, ao me ver, agiu como se eu tivesse regressado após um ano morando no exterior. Passou o dia se oferecen­do para preparar nosso chá e contornando a mesa para me envolver com gran­des abraços. — Você poderia me processar por assédio sexual — brincou a um dado momento. — Sinto-me tão tentada a beijar você na boca.

— O sentimento é recíproco, amiga — respondi, um tanto surpresa, mas imensamente feliz pelo fato de ela ter sentido tanto a minha falta. Éramos amigas, mas eu sempre achei que fosse algo apenas relacionado ao trabalho. Era bom saber que ela realmente gostava de mim. — Mas sem o beijo na boca.

David deixara a empresa no dia anterior com seu habitual jeito digno, discre­to. No horário de almoço, ele me pedira que o acompanhasse até a lanchonete. Uma vez lá, confessara que não voltaria ao escritório, que não aguentaria as despedidas extravagantes que a equipe da Angeles costumava fazer. Assim, fora apenas:

— Adeus, Regina. Manterei contato. — E aquilo havia sido tudo. David se fora.

Agora, eu tinha de enfrentar Emma. Respirando fundo, preparei-me men­talmente e bati na porta. Segundos depois, uma voz possante indicou-me que entrasse.

Respirei fundo novamente antes de me adiantar até o interior do espaçoso escritório de paredes brancas. A persiana estava fechada sobre a janela atrás da mesa para proteger o computador do sol. Olhei ao redor, verificando o que Emma mudara no escritório. A grande planta ornamental ainda permanecia a um canto, a posição da mesa continuava a mesma, as persianas ainda eram em tom pastel, a mesa de reuniões ao lado de uma parede ainda tinha quatro cadei­ras azuis em volta. Ela não mudara, nem acrescentara nada ali, quase como se não tivesse necessidade de mostrar que era o seu domínio. Se fosse meu, teria deixado expostas as capas da Viva Angeles, teria acrescentado mais algumas plantas, teria... Pare, ordenei a mim mesma. Emma ficou com o cargo, com o escri­tório; você tem de aceitar isso.

A mulher detrás da mesa não se levantou quanto entrei. Na verdade, recostou-se na poltrona, esticou o corpo comprido e não fez a menor tentativa de ocultar o fato de que estava me avaliando. Fui mais discreta no meu exame. Os traços dela, fortes e bem-definidos, pareciam esculpidos, como se um artis­ta tivesse passado horas aprimorando-os em sua pele clara. O nariz era delicado e forte, os olhos igualmente espaçados, o maxilar de contornos firmes até o queixo. Os cabelos loiros exibiam um cachos grossos, o que deixava seu rosto ainda mais atraente. O que sobressaía mais nela, porém, eram os olhos — um tom claro, vibrante, intenso de verde.

Usava camisa branca com o botão do colarinho aberto e mangas dobradas e elegante calça bege. Pelo aspecto impecável de seu corpo, soube que tinha o físico de quem praticava exercícios. Reconheci seu tipo; trabalhei com muitos deles ao longo dos anos. Era a Sra. Carreira. Era dinâmica, engaja­da, super-ambiciosa e qualquer um que trabalhasse a seu lado teria de dar cen­to e cinquenta por cento de si, ou ela encararia a ausência de absoluta dedica­ção como um insulto pessoal e encerraria a carreira de quem não correspondesse às suas exigentes expectativas.

Enquanto eu a estudava, os olhos verdes da sra. Swan percor­reram-me, notando o cabelo preto, o corte de comprimento pelo queixo; meus olhos castanho-escuros; meus lábios com batom; o corpo oculto sob uma camisa vermelha simples e calça preta de corte reto; as unhas dos pés por pintar aparecendo na ponta das sandálias de salto médio. Depois que me percorreu de alto a baixo, seus olhos endureceram com um ar de repro­vação. Ficou claro que não gostou do que viu.

— Sente-se — ordenou.

— Por que, isto vai demorar? — respondi no mesmo tom hostil.

Ela sorriu de repente, surpreendendo-me com uma inesperada demons­tração de charme.

— Por favor, Regina — falou calorosamente, indicando a cadeira diante da mesa. — Sente-se.

É tarde demais para a exibição de charme agora, pensei. Já vi a repulsa em seus olhos. Sei o que pensa de mim.

— Prefiro ficar de pé — insisti, retribuindo com um sorriso de orelha a orelha, mas cem por cento falso. — Tenho muito trabalho a fazer.

Minha resposta tirou um pouco do brilho do sorriso dela. Estudou-me por um momento, obviamente tentando descobrir como lidar comigo.

— O que vai fazer hoje à noite?

— Como disse? — falei, confusa. Ela está me convidando para sair? Eu a interpretara da maneira completamente errada? Aquela expressão teria sido, na verdade, um meio de encobrir sua atração por mim?

— Tenho jantado fora com todos os chefes de departamento para saber o que acham do marketing da Angeles, ver se têm idéias novas sobre como pode­mos aperfeiçoar as coisas. Você é a última da minha lista... Do departamento de marketing. Assim, achei que, se não estiver ocupada hoje à noite, podemos tirar isso do caminho.

Fiquei perplexa com a quantidade de insultos que a mulher conseguira incluir naquele minúsculo monólogo.

"Última da minha lista." Apenas para o caso de eu duvidar que seria a última em todas as listas dela.

"Se não estiver ocupada hoje à noite." Obviamente, eu estava fadada a me ver sem namorado e amigos numa noite de sexta-feira.

"Tirar isso do caminho." Eu era como um exame laboratorial para ela: desagradável mas necessário.

— Podemos jantar juntas hoje à noite — concordei, o sorriso falso inaba­lável.

— Eu a encontrarei no térreo às seis e meia — avisou Emma, tentando desbancar meu sorriso.

— Será divertido.

— Será, não é mesmo? — resmungou ela, enquanto eu saía fechando a porta.

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