Prólogo
Eu via as placas passarem enquanto nos aproximávamos de San Diego. Estávamos no carro apenas eu, minha mãe e Thunder. Meu pai seguia-nos de perto com o caminhão de mudanças, levando em um container de dez metros quadrados tudo o que consideramos importante o suficiente para carregar até a Califórnia conosco.
Dizer que eu estou feliz a respeito de me mudar para o outro lado do país é uma mentira, mas é claro que essa era a minha resposta todas as vezes que minha mãe me olhava com culpa escorrendo dos olhos e perguntava "você tem certeza que está bem com tudo isso?". Eu não estou. O que há de bom em passar dois dias em um carro dividindo o banco com um cachorro de 44 quilos, apenas para chegar a um lugar no qual eu realmente não queria estar? Não que tenha alguma coisa errada com a Califórnia. Um ótimo lugar para passar as férias. Mas não para se morar. Principalmente não na minha condição.
Eu sou de Nova York. O lugar da diversidade. Onde pessoas de todas as cores, gêneros, gostos e costumes andam nas ruas sem realmente prestar atenção nas coisas que os diferem. Em um lugar como esse, era bem fácil passar despercebida. Ninguém realmente notava, ou se importava, com o fato de eu ter que andar com um cachorro para todo o lado. Oras! É Nova York! Quanta coisa mais estranha se vê por ai? Então, eu não via problemas em ir para a escola, por exemplo, com um pastor alemão vestindo um colete vermelho ao meu lado. Todos já me conheciam, todos já sabiam o porquê de Thunder estar comigo o tempo todo, e estava tudo bem, porque ninguém realmente ligava.
Mas então meu pai recebeu a notícia: os soldados feridos em guerra passariam a ser enviados para o Hospital Central de San Diego, não mais para o de Nova York. A única escolha que tínhamos era arrumar as malas e ir. Não demoramos nem duas semanas para estarmos prontos para a partida. Precisavam do meu pai o mais rápido possível, e ele não tem sangue frio o suficiente para dizer que não ajudaria àqueles que se arriscam para que outros não precisem se arriscar. E eu? Bem, eu não tenho sangue frio o suficiente para exigir qualquer coisa a mais dos meus pais além do que eles já fazem por mim.
Então, adeus Manhattan.
Olá, San Diego!
Ainda estamos no começo de novembro. O verão não deveria estar nem sequer pelas redondezas. Mesmo assim, a temperatura amena e o ar seco, contrastando drasticamente com o frio que deixamos para trás em Nova York, deixa bem claro que estamos longe de casa. A Califórnia parece não se importar com o fato de o verão já ter acabado.
Já estava quase caindo no sono, pela provável nonagésima vez ao longo da viagem, quando saímos da rodovia e entramos de fato na cidade. Endireito-me no banco, com Thunder imitando meus movimentos, e começo a prestar atenção ao meu redor.
A cena, logo de cara, me deixa chocada. Não é como eu imaginava. Claro, vejo palmeiras e tudo o mais, mas nada daquele "ar californiano" que vi na televisão ao longo dos anos. Também vejo lojas, restaurantes, algumas pousadas e casas. Muitas casas. Para se achar uma casa em Nova York, é necessário quase sair da cidade. Para se achar uma com quintal, então? Praticamente impossível. Aqui não. As casas são espaçadas umas das outras, possuem gramados sem cercas em volta e eu consigo ver muitas crianças brincando na rua. Eu também consigo ver o céu.
Ah! Isso sim era o que eu esperava da Califórnia.
Já são quase sete horas da noite, mas o sol ainda não terminou de se por. Azul, amarelo, laranja, vermelho. Tudo se mistura criando uma paisagem arroxeada. É de tirar o folego. Se um lugar possui pores do sol assim, não pode ser tão ruim.
"Bem vinda ao nosso novo lar, querida." Minha mãe fala em um suspiro enquanto para em frente á uma casa branca. Dois andares, nem grande, nem pequena, com uma varanda circulando a entrada. Olho para Thunder, que balança o rabo rapidamente, animado para finalmente sair do carro. O banco de trás e o porta malas estão ocupados com nossas caixas de roupas, então ele teve que ir no banco da frente, junto comigo. Eu não ocupo muito espaço, e nosso carro, um SUV preto, é consideravelmente grande, mas definitivamente não é o lugar apropriado para se viajarem uma garota e um cachorro de grande porte. Sendo assim, no momento em que abro a porta, ele já dispara em direção do quintal em frente à casa e começa a se esfregar na grama, em pura felicidade.
Saio do carro em seguida e fico olhando enquanto Thunder se diverte. Um sorriso escapa de mim enquanto ele corre de um lado para o outro. Ele não tem muito tempo para agir como um cachorro normal na nossa rotina, então nas oportunidades que ele encontra, deixo-o aproveitar o máximo possível.
"Parece que Thunder gosta daqui" Meu pai diz saindo do caminhão e se aproximando de mim e da minha mãe, que tinha se juntado a mim para observar a felicidade do meu cachorro.
"Como não gostar? Olha todo esse espaço! Era quase cruel manter um animal do tamanho dele dentro de um apartamento." Minha mãe complementa e passa o braço pelos meus ombros. "Aqui vocês dois vão poder aproveitar um pouco de ar fresco. Anda, anda. Vamos entrar." Ela toma a dianteira e nos guia até a porta da casa, abrindo-a e olhando ansiosamente para mim e para o meu pai. "Quando eu contar até três, entramos com o pé direito, combinado?" Assentimos e damos as mãos. "Um, dois e... Três!"
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A Garota com o Cachorro de Vermelho
Roman pour AdolescentsAh, Nova York! A cidade onde as diferenças reinam. Andando por qualquer avenida, vê-se pessoas de todos os jeitos, classes, costumes, prazeres. E é claro que Alice amava isso. Aliás, como não gostar de um lugar onde a diversidade é abraçada? Ainda m...