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Na manha seguinte, recebi o bilhete de Anne confirmando minha visita à Monbray. Quando cheguei ao salão dos Handerson, eu estava exultante, controlando-me para não demonstrar minha ansiedade. A condessa me recebeu e ficamos no salão tomando chá, enquanto Anne não descia.

- Ela está terminando suas rezas – a condessa me explicou – Fico feliz que tenha aceitado ser dama de companhia de Anne até o dia de seu confinamento.

Aquele detalhe me causava ojeriza, não podia conceber a ideia de ver Anne presa entre paredes frias e silenciosas, longe de mim.

- Minha filha anda muito solitária e triste...

- Eu imagino – o sofrimento dela era meu, isso me cortava o coração.

- As irmãs estão casadas – a condessa prosseguiu – E às vezes, tenho a sensação de que Anne não é feliz no caminho que meu marido lhe impôs - Eu vi tristeza nos olhos da condessa e ela forçou um sorriso – A vida de Anne custou sua liberdade... A maioria das moças de sua idade estão sonhando com o dia de seus casamentos – ela me olhou atentamente – Deve estar feliz com a chegada do seu, não é querida?

- Muito – respondi.

- Henry é um rapaz muito bonito. Meu marido até tentou casá-lo com nossa filha Sara, mas ele não quis, sempre esteve apaixonado pela senhorita... Deve se sentir muito lisonjeada de ter um homem tão rico e que a ama.

Sim, eu ficava, mas não do modo como ela pensava e também não esperava tanta inveja vindo por parte dela. Eu estava ficando irritada com aquela conversa, quando Anne entrou na sala. Todo meu mau humor se dissipou e a paixão tomou conta do meu ser. Levantei-me. Eu queria atravessar a sala e abraçá-la, e estreitá-la contra mim, sentir o calor de seu corpo, dizer que havia sentindo sua falta. Mas era ridícula tanta afeição inexplicável, e isto mataria a condessa do coração e causaria um escândalo terrível. Cumprimentamo-nos como exigia a educação, com mesuras. Eu era apenas sua dama de companhia e não sua amante, eu precisava me controlar.

Seria um escândalo!

Ela hesitou em se aproximar de mim e sua súbita indiferença no olhar me incomodou. Não havia o calor da noite anterior, busquei ardentemente em seu semblante, qualquer coisa que alimentasse minha paixão, mas ela mostrava-se apática. Como se minha presença a incomodasse. Foi um balde de água fria em meus sentimentos e eu fiquei desejosa de partir.

- Vou deixá-las a sós para conversarem – a condessa se levantou e se retirou.

Ficamos sozinhas, de portas fechadas e seu olhar para mim não mudou em nada.

- Trouxe os desenhos? – ela perguntou olhando para a pasta em minhas mãos.

- Sim...

Ela se aproximou e eu lhe entreguei a pasta. Enquanto meu âmago se retorcia por senti-la perto, ela se afastou depressa e sentou-se no outro sofá, bem longe de mim.

- São lindos – ela elogiou e forçou um sorriso – A senhorita tem muito talento.

Ela falou com tamanha formalidade, que eu me perguntei se teria me enganado quanto aos sentimentos dela por mim? Eu estava tão carente de amor e paixão que não enxerguei que apenas eu estava disposta quanto aquele sentimento. Eu teria confundido uma demonstração de amizade com outra coisa? Não podia ser!

- De quem são essas mãos? – ela perguntou separando um desenho e me mostrando.

- De Margareth, nossa governanta.

- É poético – ela olhou para mim finalmente – Faz mais do que reproduzir desenhos, senhorita, pode descrever a alma em poucos traços.

Não queria seus frios elogios, eu queria o calor de seu olhar, onde estava?

- Conseguiria fazer um retrato meu?

Eu não desejava. Como criança mimada que perde seu brinquedo preferido, eu queria pegar minhas coisas e partir e esquecê-la para sempre e apagar o amargor da rejeição. Mas agora que estava ali, necessitava ficar ou minha mãe me mataria.

- Claro que sim – eu clareei a garganta e concordei – Como gostaria que eu a desenhasse?

- Com a sinceridade de seu coração – ela disse e se levantou, me devolvendo a pasta e caminhando para perto da janela, sentando-se em uma cadeira – Daqui pode me ver bem?

- Sim – eu fui até a mesa e me ajeitei.

Aquilo era uma tortura. Eu a desenhava com todo meu amor platônico. De repente, não ser correspondida, doía intensamente, e eu compreendi o que Henry sentiria se descobrisse que eu não o amava. Ele não o merecia, era um bom homem. Durante as duas horas seguintes, ficamos no mais completo silêncio, apenas o som do carvão deslizando sobre o papel. Enquanto eu saboreava de sua beleza, sentia o veneno do descaso me assolar, ela não me olhou um instante.

Eu queria chorar e me entregar ao drama do desgosto. Mas me controlava, talvez aquele sentimento devesse ser guardado apenas para mim e se afogar nos mistérios da minha alma.

A condessa entrou de repente, e levamos um susto como se fossemos pegas em flagrante. Ela se aproximou de mim, curiosa:

- O que está fazendo? – ela perguntou e parou ao meu lado.

Anne levantou-se:

- Elise está me desenhando – ela avisou.

- Elise! – a condessa falou surpresa levando a mão ao peito – É lindo!

- Obrigada – eu falei sem graça.

- Como a senhorita é talentosa! – ela pegou o desenho e olhou para a filha – Venha ver Anne...

Anne não parecia disposta a se aproximar, e com relutância o fez. Ela pegou o desenho e eu fiquei mais ansiosa se isso era possível. Os olhos dela se encheram de lágrimas e num impulso inesperado, ela deixou o desenho sobre a mesa e saiu correndo da sala em prantos, deixando-me atordoada.

Eu me levantei e a condessa me olhou sem entender nada.

- Desculpe-me, Elise. Eu não compreendo o que houve – e saiu no encalço da filha.

Eu fiquei sem saber o que fazer, completamente arrasada. O que havia de errado com o desenho? Por que ela não gostou e ofendeu-se tanto? Subi para o quarto que me foi relegado e ajeitei minhas coisas. Meu coração apertou-se mais ainda quando Anne não desceu para o jantar.

- Ela não se sente bem, Elise – a condessa me avisou – Não sei o que houve com ela, mas acredito que estas mudanças de humor se dão pelo fato que logo irá partir. Peço desculpas.

Ela não me queria ali, eu podia sentir isso.

- Se quiser, posso voltar para minha casa, senhora.

- Fique, por favor – ela disse esperançosa – Tenho certeza que amanhã ela estará bem melhor e lhe dará uma explicação plausível para o seu comportamento.

- Esta bem...

Eu fiquei apenas por educação. E porque no fundo, eu queria compreender o que estava acontecendo. Mas meu desejo era fugir da dor que era o descaso de estar apaixonada e não ser correspondida.

Sublime - Conto Erótico e LésbicoOnde histórias criam vida. Descubra agora