0.2 | cúpula dos ímpios

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Inverno, 2025

O que é verdadeiramente tão forte capaz de unir cinco jovens distintos numa amizade? Uma paixão, um desejo, uma armação, uma mentira? O segredo compartilhado de um plano maligno de descartar uma pessoa como um objeto qualquer quando se cansar de brincar?

Talvez, nem eles saibam ainda, mas isso não torna sua amizade menos verdadeira. Contudo, estão juntos desde o primário, na peça de outono armada pela jovem e sonhadora professora, pobre demais para pertencer à alta-sociedade, sem talento o suficiente para concluir seus sonhos de estrelar musicais na Broadway.

Nenhum deles resguarda dessa lembrança, ou sequer dessa tal professora, tão esquecível como qualquer pessoa fora de Argos para os ímpios. Para eles, a vida antes de unirem suas forças, seus prestígios, seus talentos, e o mundo perfeito atual, onde nada é mais cobiçado, belo ou invejável igual a cada um deles em sua própria maneira.

Cal se ajeita na poltrona presente no canto esquerdo do ambiente, joelhos dobrados, cotovelo apoiado no braço do móvel, segurando seu rosto.

— Repita novamente como foi que encontrou esse lugar, Lauren? É nosso refúgio oculto e sombrio.

Ditri, sentado no chão, aos pés da namorada, uni as sobrancelhas.

— Não tem nada de sombrio aqui, Cal.

Ela dá de ombros.

— Na minha cabeça é meio que um encontro de um culto secreto, onde nos unimos, todas as noites, para realizar feitiços malignos com magia negra.

O melhor ator entre eles, pelo menos o escalado incansavelmente como protagonista das peças, Percy Lennox, procura nas prateleiras lotadas um livro de poesia. Preferencialmente grego, a especialidade da casa. As capas tão antigas como outro móvel dentro daquele ambiente ou pelo Conservatório inteiro, entretanto, preservado. Um leigo poderia facilmente acreditar ser uma edição de lançamento.

Todos os livros, peças, tragédias em capas duras, limpos. Ele dedilha por Shakespeare, suas melhores obras, Romeu e Julieta, Hamlet, Julio Cesar. Macbeth. Um arrepio frio percorre a espinha do rapaz de cabelos grandes e fios lisos e castanhos.

— Bom, planos malignos, talvez. Feitiços? — O moreno entorta a boca. — Seríamos péssimos bruxos. Destruiríamos Argos em nossa primeira lição. Apesar de que eu faria um bom vilão, não acham?

— Não sei. — Cal responde. — Mas seria um belo traidor, quem sabe Brutos.

— Se mantenha na Grécia, Cal. Nossa fase romana e shakespeariana já passou, graças a Zeus.

Camila, calada até então, se senta no sofá cor de musgo, um almofadado comprido e confortável exposto no meio do cômodo, na ponta contrária da morena de olhos verde-mar.

— Lauren? Nos conte a história, hum?

A atriz coça a garganta, garantindo a dramaticidade da atuação e assente. Lauren se ajeita a postura e percorre o lugar em buscar dos olhos de cada um, todos atentos a ela.

— MontClaire é antiga, bem sabemos. Uma das maiores construções da cidade, e pasmem, construída apenas em um ano. Para época foi inacreditável, até hoje seria. Nos tempos sombrios de Argos, nos primórdios de sua fundação, os primeiros 20 anos da província, quando só dez famílias moravam por aqui, nossas famílias, todas podres de ricas, muitos quartos foram construídos em segredo. Os quartos, fechados a sete chaves e escondidos pelos criados, onde lá, faziam todos os tipos de indecência longe dos patrões. — Ela penteia os cabelos escuros com os dedos. — Há casas na cidade, grandes o suficiente para abrigar cômodos enterrados iguais a este e seus donos nem estão cientes. Só na minha casa tem dois. Meu pai só os achou anos após nos mudarmos.

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