Capítulo 14

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Ele estava bem lá, sentado no sofá. Dessa vez com sua roupa de barqueiro, imaginei que ele deveria fazer free lance de barqueiro aos fins de semana. Mas seria possível que esse cara ia me seguir agora onde quer que eu fosse ? Nem aos sábados eu tinha descanso. Eu tinha a plena certeza que assim que ele me visse, começaria com toda aquela história de meu pai ser o Saci, de deuses e monstros existirem etc. Ali na vila eu não teria pra onde fugir, tive que admitir que ele foi esperto, me cercando em meu próprio território.

Como o sofá era de costa pra porta do meu quarto, eu tive tempo de ir pra cozinha antes que ele pudesse me ver, e encontrei minha mãe lá preparando um enorme banquete para o homem. Tinha praticamente tudo. Bolo, torrada, pão, queijo, leite, suco e algumas outras coisas. Achei exagerado pra um convidado que não era bem vindo, pelo menos naquele momento.

- O que ele está fazendo aqui ? - Sussurrei.

- Ele não me falou que vinha Heitor, mas com certeza ele quer conversar mais uma vez com você. - Ela respondeu também sussurrando.Nesse momento eu tive a intensa vontade de não sair da cozinha, ficar lá até ele ir embora. Minha mãe, por me conhecer muito bem, notou que eu não estava gostando nada daquela visita.

- Filho, dê uma chance a Charlie e... a mim, nossa história é verdadeira. Dê uma chance, nos ouça. - Ela disse em tom um pouco mais alto e fiquei com medo de Charlie ter ouvido.

Repentinamente me bateu um sentimento de culpa e pena ao ver minha mãe daquele jeito, quase implorando pra eu acreditar nela e em Charlie, eu nunca tinha visto ela daquela forma, o que me fez de vez resolver dá uma chance àquela história. Pela minha mãe, que nunca mentia pra, eu resolvi ceder.

- Ta bom mãe, eu vou pra lá falar com ele. - Falei em tom desanimado. Ela sorriu, o que eu não a via fazer a muito tempo, e deu um beijo na minha testa. Aquilo me deixou momentaneamente feliz.

Ajudei minha mãe a levar as bandejas e as jarras de suco para a mesinha da sala, para comermos junto com Charlie.

- Oi guri - Ele disse com uma voz bem... neutra. - Bom dia, bom te ver.

- Bom dia Charlie... É bom te ver também. - Menti.

Ele nem tocou na comida, nem esperou minha mãe se sentar e mal esperou eu me acomodar e preparar meu psicológico, antes de começar a voltar no assunto do outro dia.

- Ainda temos muita coisa para conversar garoto... Sobre o assunto de ontem. - Ele falou e ai sim, deu uma beliscada em uma rosquinha.

- Eu tive tempo para pensar... e... eu acredito na história de vocês, mesmo me parecendo impossível. - Foi difícil pra mim admitir que eu estava acreditando.

- Ora ora ora... Vejo que mudou muito de opinião de ontem pra hoje. - Ele olhou para minha mãe, como quem diz "Ótimo trabalho". Ela disfarçou e olhou pro outro lado.Eu não respondi, então ele continuou falando.

- Antes de tudo, preciso saber da profecia Heitor, preciso ouvi-la. - Ele falou em tom sério.

"Não conte a profecia a qualquer um, só a quem você realmente confia." As palavras de Mayara não saiam da minha cabeça de forma alguma. Minha mãe confiava em Charlie e parecia conhecê-lo a muito tempo e ele não parecia alguém que fosse me trair ou algo do tipo, então eu finalmente decidi contar pra alguém a profecia. Eu nem precisei pegar o papel, eu tinha gravado, de tanto que tinha lido.

- Filho da floresta... - Comecei a falar e os dois ficaram com os olhos fincados em mim, como se aquilo fosse a coisa mais importante. - O fim está se aproximando, as únicas armas capaz de detê-los estão bem longe daqui. O caminho mais sombrio é o que você deve ir. Ao todo, cinco irão com você. Um morrerá, e um, no escurecer, te trairá. No fim, somente dois chegarão ao destino. A menina você deve salvar, para então, no fim de tudo, fracassar.

Floresta SombriaOnde histórias criam vida. Descubra agora