Dez horas antes.

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Olivia

As minhas mãos agarraram os meus cabelos, em frustração, e fiquei com medo de mim mesma, quando quase não tive forças para me parar de os puxar. Encostei-me à parede mesmo à beira da porta de entrada e deixei o meu corpo deslizar pela mesma, até me encontrar sentada.

Deslizei o meu telemóvel para fora das minhas calças e marquei o número de Melanie, apenas para desabafar – eu podia contar sempre com ela para fazer isso. Ou assim achava eu: não houve resposta.

Ver o meu pai agir daquela maneira estava realmente a dar cabo de mim. Eu tornara-me numa pessoa bastante frágil e saber o quanto a minha mãe estava a sofrer por a sua filha mais nova lhe ser retirada pelo homem que a abandonou partia o meu coração.

Um barulho originado da porta mesmo à minha beira fez-me dar um pequeno salto. O meu ex-companheiro de cela saiu da casa do meu pai e os nossos olhos encontraram-se por uns segundos, antes de ele desviar o seu olhar para a sua frente e retirar um isqueiro e um maço de cigarros do bolso traseiro das calças de ganga com as quais eu já o adorava ver vestido.

Ele começou a fumar?

Forcei-me a observar o chão, para não estar apenas a olhar fixamente para ele. No entanto, o facto de ele fumar espantou-me demasiado para eu conseguir manter a minha grande boca calada.

"Desde quando é que fumas?" Contemplei-o novamente.

O Niall que eu conheci nunca fumaria. Se bem me lembro, ele até era contra isso.

Ele encarou-me, depois de dar uma passa no cigarro. "Desde que desfizeste o meu coração em pedaços," Abanou os seus dedos, deixando alguma beata cair no chão, e encolheu os ombros. "Vezes e vezes sem conta."

Julgo que parei de respirar por uns segundos.

Todas as promessas que fiz a mim mesma sobre tentar empurrar as nossas memórias para um canto do meu cérebro estavam a ser desfeitas naquele exato momento. Tudo o que passámos juntos era indelével e eu estava bem consciente disso.

"Dás-me um?" Pedi, estendendo uma mão.

Ele assentiu e esticou-me o seu maço. Retirei um cigarro e voltei a entregar-lhe o objeto.

Eu estava entusiasmada por este ter sido o maior diálogo que tivemos em anos e, ao mesmo tempo, estava envergonhada pelo quão patética era por me entusiasmar com algo tão estúpido. Acabei por lhe solicitar um isqueiro também e ele retirou-o também das suas calças, antes de passar à minha frente. O coração caiu-me aos pés, a pensar que ele se iria embora, mas logo deu um salto assim que ele se sentou à minha beira; assumi que apenas passara por mim para ficar sentado mais longe da porta e aceitei o isqueiro que me foi entregue.

"Desde quando é que tu fumas?" Questionou, mas não tão espantado como eu ficara quando recebi a notícia de que ele se tornara num fumador.

"Desde que me admitiste que começaste a fumar por minha causa."

Prendi o cigarro entre os meus lábios e fiz um escudo na sua ponta, para acendê-lo. Contudo uma mão pousou-se em cima do isqueiro e este foi-me retirado. Não me apercebi de que Niall se tinha queimado até o ver observar a sua mão atentamente. Se ele decidisse encarar-me, de certeza que iria conseguir identificar a preocupação e culpa que eu carregava no rosto pelo sucedido.

"Não te estragues." Falou, de forma decidida – provavelmente, da forma mais decidida que alguma vez o ouvira falar.

Ao aperceber-me de que ele ainda se preocupava comigo, deu-me uma vontade repentina de chorar.

Queria chorar por ele ser uma pessoa tão boa e tão pura – alguém que eu nunca iria merecer, mesmo que não lhe tivesse feito o que fiz. Queria chorar por ter feito o que fiz a alguém como ele. E queria chorar por ele ter escondido a sua doçura que, antes, era tão aparente – e tudo por minha causa.

"É melhor ires lavar a mão com água fria." Aconselhei, contudo, não fui levada em conta.

"Estou bem; isto não é nada."

Uma parede de silêncio começou a formar-se entre nós e rapidamente se tornou constrangedor estarmos assim, provavelmente ambos a relembrarmo-nos de toda a história que tínhamos juntos.

"Porque é que vieste à festa, se podias ter quase a certeza de que eu iria estar aqui?" Decidi perguntar. Julgava que ele me queria evitar e, para dizer a verdade, depois de ouvir as suas palavras frias no tribunal, eu queria evitá-lo também; no entanto, tudo o que ele me confessara nos últimos minutos mudara esse meu desejo completamente.

"No tribunal, eu disse-te que falaríamos mais tarde, não disse?" Questionou. O seu olhar pousou-se em mim, pela primeira vez desde que me retirou o isqueiro, e decidiu manter-se lá para constatar o meu aceno de cabeça. "Posso odiar-te com tudo o que tenho, mas sou um homem de palavra."

Esperava sentir o meu coração partir-se, ao ouvir as suas palavras duras, contudo, eu estava, mais do que tudo, feliz, por não lhe ser indiferente.

"Por isso é que estou aqui, sentado à tua beira, e não lá dentro, no meio dos teus familiares de merda que, claramente, te estavam todos a julgar mentalmente." Continuou.

Queria resmungar com a sua escolha de palavras, mas a verdade é que ele tinha razão – lá dentro, ninguém se preocupava com nada sem ser com o próprio umbigo. Queria também contar-lhe o porquê de lhe ter mentido, naquele último dia, porém, a nossa conversa estava a ir tão bem que eu não a queria interromper. Felizmente, apercebi-me que ele se preparava para falar; mas parou-se a ele mesmo.

"Diz." Pedi, esperançosa – não sabia à espera de quê, mas sentia-me envolvida num manto acolhedor de esperança.

"Estás tão..." Começou, encarando-me, e respirou fundo, enquanto encontrava palavras para me descrever. "Diferente." Foi tudo o que disse. "Gosto de te ver assim." Admitiu, oferecendo-me o primeiro sorriso genuíno desde que nos reencontrámos.

Encolhi os ombros. Não queria continuar a encará-lo, mas também não conseguia desviar o olhar. "Tu apenas passaste lá uns meses. Eu fiquei lá nove anos – consegui sair mais cedo por bom comportamento." Pausei. Lágrimas estavam a formar-se nos cantos dos meus olhos e a ameaçar deslizar pelo meu rosto. Ainda me custava pensar em todo o tempo que desperdicei. "Quando voltas ao mundo verdadeiro, depois de tanto tempo, ficas realmente agradecido por todas as oportunidades que te são concedidas, por todos gestos carinhosos das pessoas para contigo – por tudo. Acho que é esse o objetivo de mandarem as pessoas para a prisão." Pousei uma das minhas mãos por cima de uma das suas, que se encontrava no seu joelho, e acolhi com prazer as borboletas de volta à minha barriga, depois de tanto tempo. "Não sentiste nenhuma diferença? Mesmo que tenha sido pequena; afinal de contas, também desperdiçaste algum tempo da tua vida lá dentro."

A sua mão recolheu-se violentamente, o que até me assustou um pouco. "Tu eras o meu mundo inteiro; não precisava do mundo cá fora quando estava contigo."


***


eu amo-os

e amo-vos a vocês por, depois de tanto tempo, continuar a seguir esta história e a apoiarem-me, sinto-me tão agradecida como a olivia, ou ainda mais

até ao próximo capítulo

OUTSIDE // niall horanWhere stories live. Discover now