Capítulo CINCO

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Sento apoiada na parede e respiro fundo. Meu braço ainda dói e sangra muito. A bala pegou no meu lado esquerdo, um palmo abaixo do ombro. Com dificuldade, rasgo a barra da minha camiseta e uso a boca para amarrá-la no ferimento.

Encosto a cabeça na parede e fecho os olhos. Respiro fundo e espero a dor diminuir. Não acontece. Olho em volta, quando escuto uma voz masculina.

– Está tudo bem. Xiiii. Olhe para mim. Estou aqui, fique calma. Vamos sair daqui – ele acaricia o rosto de Savana com as mãos amarradas. Ela se acalma aos poucos – muito bem. Essa é a minha garota. Preciso que seja a menina corajosa de sempre – ela assente.

Observo meu colega de cela. Ele é bonito. Seus olhos são verdes e me chamam atenção. Um verde escuro que eu ainda não tinha visto. É loiro e tem o cabelo quase raspado. Deve ter uns 25 anos, talvez mais.

Ele olha para mim e eu não desvio o olhar. Ele se levanta apoiando as costas na grade e vem em minha direção. Se ajoelha na minha frente e olha meu braço ferido. Levanta as mãos amarradas na altura dos meus olhos.

O guerreiro aligorte fez um nó clássico com a corrente fina. Observo a corrente inteira, que se estende em uns dois metros. O nó não é difícil de desfazer, mas é preciso duas mãos e um pouco de habilidade. A garotinha não conseguiria, ainda mais estando nervosa.

Reflito sobre desfazer o nó e libertar suas mãos. Não acho que ele tentará me machucar. Talvez eu precise que ele tire a bala do meu braço, de qualquer maneira.

Decido ajudá-lo e uso a mão direita, recorrendo à esquerda só quando muito necessário. Livro suas mãos e ele me olha. A garotinha se aproxima e sorri para mim. Sorrio de volta.

O rapaz aproxima sua mão do meu braço ferido, eu seguro seu pulso com a mão direita antes que me toque. Ele apenas olha para mim e espera. Seu rosto não demonstra nada, então não sei o que se passa em sua cabeça.

– Tudo bem, meu irmão não vai machucar você – a garotinha me diz.

Na mesma hora penso em Julio e sinto medo. Obviamente, fomos traídos pelos aligortes. Tenho certeza que a ausência do meu irmão tem algo a ver com isso. Seria muita coincidência. Eles teriam mais dificuldade em executar seu plano com meu irmão por perto. Eles nos enfraqueceram, dando um jeito de tirar Julio do alojamento.

E meus guerreiros? Todos com certeza ouviram o tiro. Por que ninguém apareceu? Meu Deus, o que está acontecendo?

A dor me desvia dos meus pensamentos e percebo que o rapaz mexe no meu ferimento. Ele parece refletir enquanto observa o machucado. Nossos olhos se encontram.

– Quem é você? – pergunto e percebo como minha voz sai fraca. É como me sinto. 

De repente, manter o foco parece difícil. Ele me encara e me sacode pelo braço bom. Isso me irrita um pouco e faço uma careta.

– Fique acordada – ele me diz.

Sua voz é grave, marcante.

Escuto um barulho e a sonolência acaba. Viro-me e vejo Jonas entrando pela janela. Um alívio percorre o meu corpo e eu me esforço para levantar. Savana me ajuda e eu sorrio para ela em agradecimento.

Enquanto caminho em direção à grade, noto que Jonas está enfurecido. Ele olha ao redor enquanto se dirige a nós.

– Princesa... – ele alcança a grade, pega minha mão e observa meu ferimento – O que está acontecendo?

Ele vai em direção à fechadura e a sacode, tentando abri-la.

– Eu não sei. Os aligortes são inimigos – tenho que me esforçar para falar.

– Eu ouvi o tiro. Corri para os portões, mas eles estavam sendo vigiados por guerreiros aligortes. Imaginei que algo estava estranho e fiz o caminho que você fez por trás do galpão. Olhei pela janela e a vi presa aqui – Jonas me explica. Ele já desistiu da grade e segura minha mão novamente. Seus olhos se desviam do meu rosto e focam em algo além de mim – quem é ele?

Olho para trás e vejo Savana em pé, segurando na barra da camiseta de seu irmão, que olha sério para mim. Sinto-me cansada, mas por algum motivo meu cérebro registra como eles não se parecem, apesar de serem irmãos.

Sacudo a cabeça e foco no que realmente importa.

– Não sei. Jonas, ainda não sei o que está acontecendo, mas Maison tem uma arma. E não é a arma de Max. Talvez os aligortes estejam com a fortaleza. Esta cela só pode ter vindo de lá. Acho que você é o único que não foi capturado. Precisa sair daqui antes que alguém apareça. Fique por perto, tente observar para saber o que está acontecendo – minha voz começa a falhar e eu fecho os olhos.

– Princesa! – Jonas me chama com urgência.

Abro os olhos devagar e foco nele.

– Vá agora. Darion e meu irmão estão fora. Talvez não tenham sido capturados também – digo isso, mas na verdade acredito que eles estejam presos na fortaleza.

– Não quero dei...

– Não é um pedido – interrompo–o.

Não quero ser grossa com Jonas, mas não temos tempo. E sei como ele reage aos meus comandos. Ele assente com a cabeça, olha para meus colegas de cela e segue em direção à janela.

Estou exausta, mas num lampejo vejo a imagem de Jonas bebendo em sua garrafa de bolso.

– Jonas – chamo e ele olha para mim – você tem bebida? – pergunto apesar de saber a resposta. Jonas sempre leva consigo sua garrafa com pinga.

– Sim.

Apenas estico o braço, falar está exigindo muita força. Sinto-me cada vez mais exausta. Ele me entrega sua garrafa. Agradeço com um aceno de cabeça, ele volta para janela e eu observo enquanto ele sai.

Tento me virar para voltar à parede, mas minhas pernas não obedecem. Perco o equilíbrio e caio. Sinto os braços do irmão de Savana nas dobras do meu joelho. Estou zonza e acho que estou em seu colo. Ele me coloca no chão e me apoia na parede. Respiro fundo. Ele tira a tampa da garrafa de Jonas e cheira o conteúdo. Isso vai doer muito.

Ele lava a mão direita com pinga. Respiro fundo de novo. Ele olha para mim. Respiro fundo uma última vez e tampo a boca com a mão direita. Ele joga bebida no meu braço e eu fecho os olhos com força. Logo depois sinto seus dedos queimando ainda mais minha pele.

Minha mão não consegue abafar meus gritos como eu gostaria. Estou totalmente desperta e mordo minha mão com força. Me contorço, mas ele não para.

Quando penso que não aguento mais, sinto o alívio de sua mão se afastando. Volto a me encostar na parede, respirando pela boca, ofegante. Sinto meu rosto molhado pelas lágrimas, apesar de não me lembrar de ter chorado. Talvez seja suor. Ou os dois. Estou fraca e a sonolência está de volta.

– Ela está bem, Luke? – é a voz de Savana.

Abro os olhos e vejo o rosto de Luke. Ele me observa intrigado. Sorrio cansada. Eu não conseguiria tirar a bala sozinha. Ele sorri de leve, sem mostrar os dentes. Fecho os olhos.

– Durma – diz Luke, sem gentileza.

Não abro os olhos para observá-lo. Paro de lutar contra e deixo o sono me levar.


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2323 - Sobreviventes do Caos (Distopia)Onde histórias criam vida. Descubra agora