Capítulo SEIS

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Ele provavelmente está rindo agora, pensei, pensando no pobre garoto a quem enganou.

Eu estava sozinho no dormitório, sentado em minha cama, pensando no que fazer, mas tudo o que eu conseguia pensar era que ele é um traidor. Ouvia vozes, minha cabeça latejava, estava sozinho por sorte, mas sendo vigiado. Lydia disse que Mason estava me testando, fora assim na festa e agora, mas por quê? O que eu tenho de especial?

Os outros recrutas voltariam em breve, eu tinha que pensar em alguma coisa rápido para disfarçar as lágrimas.

Joshua entrou no dormitório de repente, num segundo, me encarando.

- Está tudo bem? - Perguntou ele.

Eu me levantei e o puxei para o canto dos beliches, ganhando tempo para minha cabeça pensar no que dizer.

- Preciso que me ajude com algo - disse, finalmente.

- Ah... O.K. - ele ficou olhando ao redor, me perguntei o que estaria pensando.

- Joshua, Marcus me traiu, eu preciso ir naquela missão.

- O quê?

- Eu tenho que ver minha mãe, eu preciso que me ajude.

- Ei, calma lá, Marcus não traiu ninguém, pelo contrário ele vem te ajudando desde sua entrada aqui...

- É, eu sei, mas tenho que ir para a missão, pode me ajudar?

- Desculpa cara, fiz e faço qualquer coisa por você, mas não posso fazer isso.

Ele fora arrumar sua mochila para a missão, enquanto sentei novamente na cama, deveria me sentir abandonado e ser egoísta por me sentir assim, ou me sentir um monstro por pedir a ele que fizesse algo ruim?!

- Joshua - disse, quando ele já estava saindo - ao menos ganhe tempo para mim.

Ele não respondeu. Os outros cadetes chegaram, pergutaram-me se eu estava bem e respondi de forma conveniente a todos, por fim, quando fiquei sozinho de novo vesti o uniforme de cadete, peguei algumas coisas e coloquei numa bolsa pequena. Eu não sabia se ele faria aquilo por mim, mas eu tinha que confiar em algo, em alguém.

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Comecei a andar discretamente pelos corredores em direção ao terraço, onde provavelmente sairia o helicóptero para a missão.

Passar pelos pavimentos não era difícil, contanto que eu fosse discreto, o primeiro andar, era o mais difícil, onde ficava a parte administrativa do campo. Onde Mason estaria naquele exato momento, mas fiz como os outros recrutas que pegaram uma escada num canto quase imperceptível para os funcionários daquele pavimento.

Por fim, terraço. O helicóptero estava lá, observei dois guardas, um em cada canto do prédio, e um terceiro com quem Joshua conversava, ele ganhara tempo, mesmo sabendo do risco que corria, então o guarda do canto oposto a saída para o terraço, se juntara a conversa de Joshua.

- Está tudo bem? - Perguntou o guarda que chegara na conversa.

- Sim, estava perguntando ao guarda...

- Cleber.

- Isso, Cleber, algumas dicas de como me sair bem na missão - respondera Joshua.

O último guarda continuava atento, tão atento que fora bater o olho em mim.

- Ei! O que você está fazendo?

Joshua golpeou os dois guardas com quem conversava, os desacordando imediatamente, o outro guarda atirou uma ou duas vezes contra mim, enquanto ia em minha direção, peguei meu arco e atirei na perna do homem, que agora estava caído, xingando a mim e ao meu pobre arco.

Entrei na aeronave que agora fechava a porta.

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Aos meus sete anos de idade, meus pais tiraram férias numa pequena ilha do Havaí. Maui. Enquanto isso, fiquei o mês inteiro com minha avó. Ela era uma pessoa muito doce, fazia tudo o que eu realmente queria. Todos os doces, comidas e até mesmo meus desejos improváveis. Comprou dezenas de brinquedos para mim, e eu a amava com todas as forças.

No dia vinte e quatro de dezembro, ela fez um lindo bolo de aniversário, afinal era aniversário de meu avô, morto há três anos. Então nós comemos o bolo e rimos de algumas fotos antigas do vovô. No fim do dia, ela colocou um vestido branco, muito bonito, um colar de pérolas que realçava seus cabelos loiros.

- Nós vamos sair, vovó? - Perguntei, ao entrar no quarto e ao vê-la vestida daquela forma.

- Ah meu querido, a vovó irá se encontrar com o vovô.

- Uau!

- Estou bonita? Acha que ele vai gostar?

Sacudi a cabeça, dizendo sim.

- Então vá até a porta, e espere a campainha tocar, quando ele chegar, diga que estou no quarto, e não conte que estou bonita - ela soltou uma risadinha.

Saí correndo, deslizando pelas escadas até a porta. Esperei por alguns segundos, até ouvir o som de um tiro. Sem saber o que estava acontecendo, eu apenas chorei.

Meus pais chegaram no dia seguinte, eu havia dormido no sofá, com medo de subir para o quarto. Minha mãe só me contou o que havia acontecido, alguns anos depois, no mesmo ano em que os Raks invadiram nosso lar.

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Os outros recrutas ficaram me encarando por um bom tempo, mas não disseram nada, exceto por Stella, que após sussurrar muito com os outros veio até mim.

- Como está?

- Bem, obrigado.

- Não me agradeça. Por que fez isso, Ethan?

Houve uma leve pausa antes da minha resposta.

- Eles não nos deixam sair, eu entrei no projeto com a esperança de cuidarem da minha mãe, mas desde então não sei qual é a situação dela - uma lágrima deslizou pela minha bochecha - não tive escolhas eu tenho que ver ela, sinto por tê-los colocados nessa situação, mas...

- Não nos fez nada, Ethan.

- Como?

- Nós vamos entregar você, assim como seu amigo, depois da missão. Iremos imediatamente a sala de Mason. Não espero que entenda, mas temos um cargo a manter.

Olhei para Joshua, seu olhar era neutro, talvez estivesse escondendo o que realmente estava sentindo, ou simplesmente não sentia nada. Só sei que aquele olhar, congelado pelo tempo, que mirava exatamente na direção de meus olhos, me deixou completamente entorpecido, numa tristeza que tomara meu corpo por completo, como se encontrar com minha mãe, não fosse mais a questão ali.

Stella se levantou e foi sentar com os outros.

As lágrimas vieram com força, e Joshua me abraçou. Seu olhar continuava neutro, mas eu sentia um acolhimento em seu abraço, como se ele dissesse está tudo bem.

Era ruim, saber que quando as pessoas se aproximam de você, elas vão sofrer. Então em um sussurro respondi ao seu abraço.

- Não, Joshua, não está tudo bem! Nunca estará bem!

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