Bia

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A mocinha olhou sorridente para minha mãe e perguntou se eu estava.

               — Um instantinho só, que eu vou chamá-lo — foi a resposta. — Entre, por favor. Qual é o seu nome?

               Dois ou três segundos de perceptível hesitação, antes da voz fraca dizendo:

               — É a Bia.

               Ela entrou, sentou-se, enquanto minha mãe avisava-me:

               — A Bia está aí.

               — Bia?

               — É, uma lourinha, engraçadinha.

               Fiz cara de quem não sabia.

               — Tá legal, vou só acabar de comer e já vou.

               Minha mãe voltou à sala e encetou uma conversa qualquer para passar o tempo. Logo levantei da mesa, lavei as mãos e, não sem antes dar uma rápida arrumadazinha no cabelo e na roupa, fui pra sala.

               Mesmo vendo-a, não a reconheci. Conversava com minha mãe com uma naturalidade jovem, alegre, empunhando um cigarrinho como se dele tirasse a segurança que aparentava. Como o cabelo, suas roupas tinham um colorido vivo e agradável. Fiquei parado em frente a ela, de pé, após um breve "oi" de minha parte. Ela continuava falando, e só quando minha mãe referiu-se a mim apontando-me, é que ela caiu em si.

               — Ah, é você?

               Pensei comigo: talvez seja alguém me procurando para tratar de aulas de violão, que esteja surpresa por encontrar-me tão novo.

               Não tive tempo de responder à pergunta. Ela levantou-se imediatamente, sem graça, jogando as palavras em rotação acelerada:

               — Puxa, então bati na casa errada. Você não conhece ninguém com o seu mesmo nome, gordinho — olhou para minha magreza —, baixinho...? — baixou os olhos.

               — Neste mesmo bloco?

               — É...

               — Não, conheço muito pouca gente por aqui.

               — Bem, então vou embora. Desculpem — foi andando em direção à porta.

               — Não foi nada.

               Depois que ela saiu, ainda segui-a pelo olho mágico até o elevador. Era fácil ouvir seus lamentos em voz alta:

               — Ai, meu Deus, que vergonha!...

               Não, seu nome não era Bia. Mas não vou acentuar-lhe o constrangimento divulgando seu nome. Pelo contrário. Quero que ela, se por acaso ler esta matéria, saiba que a agradeço sinceramente pelo equívoco. Eu estava mesmo precisando encontrar um assunto para escrever uma crônica...

                                                                                                                                     20/9/1980

O assassinato do abacateiroOnde histórias criam vida. Descubra agora