A verdadeira cultura musical

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Ter cultura musical é conhecer. De tudo. Ou, pelo menos, do máximo  possível. É poder participar de qualquer roda de conversa, tendo o que  falar. Saber opinar, embasado em fatos. E, para isto, ouvir de tudo. O  que é feito no Brasil e o que vem do exterior. O que foi composto há  séculos, e o que está sendo criado hoje. O que tem influência urbana, e o  que tem cheiro rural. Qualquer gênero, qualquer estilo. Qualquer  qualidade.

É claro que não estou falando de gosto. As preferências são pessoais e  indiscutíveis. Mas se ficarmos restritos apenas ao que gostamos, não  ampliaremos nossos horizontes, não compreenderemos o motivo que faz os  outros gostarem, não conheceremos, não teremos cultura musical. Pois o  gosto está ligado a conceitos subjetivos, como educação, meio ambiente,  valores afetivos... sim, também à qualidade. Mas mesmo esta não é  objetiva, não pode ser ligada a este ou aquele tipo de música. Em  qualquer categoria há coisas bem feitas e mal feitas. E, se faz sucesso,  algo de bom tem que ter. Pode ser um elemento da própria música, como a  melodia ou a harmonia, mas pode ser a produção de estúdio ou de palco, o  cenário, iluminação ou figurino, o material gráfico, o marketing... e  de tudo se pode aprender. Pra conhecer mais.

E saber reconhecer esses elementos. Saber o que é harmonia, melodia,  ritmo, saber identificar um instrumento solista ou aquele que faz um  contraponto. Entender o que é um contraponto. O que é compasso. Agudo,  grave, timbre, rallentando... É claro que podemos ter prazer em  ouvir música sem conscientizar nada disso. Mas estamos falando de  cultura musical. E, analogicamente, o prazer de ver uma pintura é maior  quando reconhecemos a técnica, o período, o contexto.

Música também é uma pintura. Nossas cores, linhas, formas, luzes e  sombras são as notas, os parâmetros, o sincronismo (ou não), a fonte  sonora. Numa palavra, o som. E nossa tela é o tempo.

Popular ou clássico? Que diferença faz? Tudo se resume a combinação de  sons sobre uma tela de tempo. Os elementos usados são os mesmos. Podemos  ter uma sinfônica tocando rock progressivo ou um sambista cantando  barroco. É música.

O primeiro passo para atingirmos a verdadeira cultura musical é  abandonar os estereótipos e abrir a mente para todas as manifestações  musicais do mundo. Depois disso nosso gosto pode até mudar - mas,  provavelmente, não, pois as crenças arraigadas ao subconsciente são mais  fortes. Mas, pelo menos, viveremos um processo maravilhoso, ao fim do  qual estaremos musicalmente mais cultos.

É, isso resume tudo: ter cultura musical é combater o preconceito. O nosso próprio.


29/10/2010

(Publicado no jornal Tagualetras, de Novembro/2010)

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