8 - Arileu

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Arileu e Iarvo, neto e avô, estavam no mesmo lugar que frequentavam todas as tardes, olhando para o turbilhão de água e ouvindo o som ininterrupto do Grande Rio. Cada um vagando em seus pensamentos.

— Não vamos começar hoje? — perguntou Arileu, quebrando o silêncio.

— Sim iremos, assim que nosso grupo estiver completo.

Quem será? se perguntou Arileu, mas preferiu não externar, se quisesse já teria me contado.

Seu avô estava sentado nas mesmas raízes de sempre, encostado e murmurando algumas palavras inaudíveis, como se estivesse lembrando antigas passagens ou cantigas. As faixas de sol que conseguiam atravessar a borda da copa o iluminavam, e Arileu reparou o quanto seu avô estava envelhecendo a cada dia. Parece que está cada vez mais amarelo. Suas veias mais visíveis e negras. Ele olhou para seu próprio braço, comparando. Ainda se podia ver sombras de laranja aqui ou ali, lembranças da infância, que ele preferia que sumissem logo. Mas o verde já predominava, e Arileu sentia-se quase um homem feito, mesmo tendo treze anos.

Voltou os olhos para seu avô, ainda imóvel, e se perguntou quantos anos ele teria. Mais de cinquenta, suponho? Sim, ele já era maior de idade na época da Guerra da Fenda, casado e com filhos, segundo ele me contou. Deve ser um dos cavos mais velhos ainda vivos. E o que ele fez para ser lembrado pelo resto da história? Nada.

Um som de passos das árvores atrás retirou Arileu de seus devaneios. Iarvo se mexeu e sorriu satisfeito, levantando-se.

— Bem-vinda, Rovana. Agradeço por ter aceitado meu convite. Espero não estar atrapalhando em nada seus afazeres.

— Não meu avô, eu que espero não ter atrasado muito.

— De forma alguma, estávamos te esperando. Sente-se se preferir, só não ofereço este lugar por que ele parece ter sido moldado para mim, e minhas costas velhas não suportam qualquer outra raiz.

Rovana vestia uma leve blusa sem mangas branca, adornada com margaridas em flor, e calças azuladas, que iam até abaixo do joelho. Seus cabelos estavam divididos em duas tranças que desciam pelos ombros. Arileu não via outras pessoas com frequência, e menos ainda mulheres. Ficou sem reação ao ver uma inesperadamente ali, e como ela é bonita.

— Olá, meu primo.

— Rovana — conseguiu dizer por fim, sem conseguir sustentar o olhar por mais que dois segundos.

Ela sentou na beirada da margem, onde as raízes desciam em um ângulo reto até as águas do rio abaixo. Seus pés descalços ficaram balançando ali, batendo com os calcanhares nas raízes.

— Bom, acho que agora podemos começar. Estão confortáveis? Muito bem. O príncipe Arail está vindo visitar o rei, como vocês já sabem. E achei que seria importante para pessoas em suas posições conhecer e entender melhor um pouco da história deles, para não cometerem nenhuma gafe.

Iarvo olhou rapidamente para Rovana e continuou.

— Baravi, o último Rei da Segunda Dinastia do Quarto Reino, morreu sem deixar herdeiros. Ele era filho único de filho único, e o parente varão mais próximo estava a cinco graus de distância e era apenas uma bebê. O Conselho dos Dignos ficou sem alternativas, e precisaram escolher um novo rei, que daria início à Terceira Dinastia. Mas quem seria esse rei? Muitos se apresentaram, alguns eram parentes distantes da casa real, apresentando árvore genealógicas complexas, reais ou criadas, para provar o parentesco, outros eram nobres, ricos e de famílias antigas, ou pobres, mas de famílias ainda mais antigas.

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