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- Beba um pouco, senhorita – Pula voltou com o copo d'água.

- Eu não quero.

- Ayla, você precisa – Amara disse delicadamente.

- EU NÃO QUERO! – gritei e assustei todos – Me desculpem, eu só preciso ficar sozinha, por favor.

Apesar da minha grosseria, todos compreenderam e saíram, deixando o copo em cima do criado mudo. Comecei a soluçar de novo, sem parar; as roupas dele estavam no armário aberto bem na frente da cama, levantei e fui até a janela.

Era insuportável, a dor no meu peito formava um vazio, uma floresta sombria pela qual eu era incapaz de fugir.

"Se é guerra que o rei quer, é guerra que ele terá" – pensei enxugando as lágrimas.

Caminhei até o armário, escolhi a camiseta preta formal de Marc; assim como tudo, as roupas tinham o cheiro dele, o jeito dele; eram como se ele estivesse aqui, mas não estava.

Vesti a camiseta, uma calça preta que Demian tinha feito para o meu trabalho de teatro; prendi o meu cabelo como um coque. Bebi a água e saí do quarto. Fui até a minha sapateira para procurar o salto que eu devia usar como castigo, que na verdade não seria nada comparado a minha dor.

Cheguei no salão para o café da manhã, todos de preto e olhando para mim. Agradeci por ter pego meu óculos escuros antes de sair do meu quarto.

- Nossa, ela está horrível – ouvi alguém dizer, mas nem me importei.

Caminhei até a mesa dos meus amigos, que estavam todos reunidos como sempre, haviam duas cadeiras vazias: a minha e a de Marc.

- Vamos tirar essa – Alberth disse quando eu sentei.

- Não! – eu segurei um dos braços da cadeira com força – Por favor.

A pior coisa a se fazer quando alguém que você ama vai embora, é admitir logo de cara que ela foi embora.

- Ok – ele respondeu quando Camille segurou sua mão. A minha amiga me entendia melhor que todos, depois de Marc.

Todos comiam em silêncio, enquanto eu olhava fixamente para o chão; não larguei a cadeira nem por um minuto. Lágrimas silenciosas caíam do meu rosto; Catarinne tentou enxuga-las mas eu não deixei.

- Temos que ir para o funeral da rainha – Ana disse depois que todos terminaram de comer.

Balancei a cabeça afirmando, mas eu não queria deixar a cadeira que até ontem era de Marc, sozinha.

- Venha, eu te ajudo – Demian disse cabisbaixo enquanto me erguia.

Eu não queria largar a cadeira, não podia largar. Apesar de estar sendo levada por Demian, o meu pulso permanecia firme.

- Ayla solta – Elisabeth pediu com calma – Você precisa soltar.

Eu sabia que tinha que soltá-la apesar de não querer; fechei os olhos e larguei, o barulho foi alto e todos olharam para mim, mas eu não me importava com mais nada.

Caminhamos todos juntos até os carros pretos que estavam enfileirados na entrada. O caminho até o cemitério foi um borrão em

minha mente, não me importei com quem me fez companhia, ou o que falavam; eu apenas olhava a neve cair na janela, bem devagar, como se o tempo parasse e tudo estivesse caindo devagar.

Quando finalmente chegamos ao cemitério de Paris, tivemos que passar no meio do povo. O povo francês que chorava a morte da rainha, ou saberem que o país estava nas mãos do rei; haviam crianças segurando rosas vermelhas – as flores favoritas da rainha, e minhas também – bandeiras francesas eram abraçadas por alguns, outros só tinham lágrimas para oferecer. Apesar do frio, todos saíram de suas casas para dar um último "Adeus" para a rainha, aquela que defendia os inocentes, lutava pela justiça, que amava o seu filho e seu país.

Era uma fila interminável de crianças, jovens e adultos; todos abalados esperando o príncipe e o rei fazerem o seu "elogio fúnebre". Os carros pararam na frente de um enorme portão dourado, Ana e Elisabeth saíram primeiro de cabeça baixa. Respirei fundo e comecei a sair assim como os outros alunos; Demian estava com olheiras enormes, o que significava que ele também teve dificuldade em dormir, Camille usava um sobretudo preto com renda na barra, Alberth usava um cachecol vermelho e uma boina combinando; Amara saiu do carro junto com Catarinne – as duas usavam vestidos pretos por baixo do sobretudo vermelho-vinho – Rocksell e Lucie usavam vestidos quentes pretos e botas de cano alto, os professores também estavam ali, segurando rosas vermelhas. Percebi que eu era a única menina da universidade que vestia calças, mas não era a primeira vez que eu era a "ovelha negra" e não seria a última.

- Posso caminhar com você? – perguntei para Demian.

- Se você não ficar ao meu lado, eu me jogo no primeiro buraco que encontrar – ele brincou, sério.

Segurei no braço dele e começamos a caminhar no corredor branco cheio de lápides dos dois lados. Fiquei observando os nomes enquanto eu caminhava, haviam muitas pessoas que morreram durante a guerra, jovens e crianças principalmente; imaginei a dor

dessas mães quando a carta de óbito foi entregue, creio que todas tinham o mesmo padrão:

"Aos membros da família x,

O país agradece pela vida e dedicação que (nome do falecido(a) e função) nos ofereceu na guerra contra o país rival e seus aliados.

Sentimos em informar que (nome do falecido), perdeu a vida em campo de batalha lutando pelo seu país. Ele(a) será lembrado e honrado por toda a eternidade".

A que recebemos quando o meu pai morreu era assim, cheia de ladainhas falando de como a vida do meu pai foi bem usada nos campos de batalha. Eles falam de vida, mas a tira no momento em que poder e dinheiro falam mais alto; tudo papel, papeis que compram tudo, menos o amor e a vida das pessoas.

O lugar aonde a rainha seria enterrada ficava bem no centro do cemitério, o brasão da família real estava em destaque junto a uma estátua do primeiro rei e da primeira rainha que assumiram o trono – que eram os avós de Felipe – pelo que dizia a lápide, o rei havia morrido quando Felipe tinha onze anos, e a rainha morreu um ano antes que ele.


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