Nove: Ele

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Meu coração estava acelerado o suficiente para me dar a impressão de que eu desmaiaria a qualquer instante. As pernas bambeavam como uma corda de violão frouxa e eu sequer conseguia me mexer direito.

Victor estava há poucos metros de mim sentado em uma cadeira atrás da escrivaninha branca olhando atento para alguns prontuários aos quais segurava. Ele já havia chamado o número da Mabel pela segunda vez, mas eu simplesmente não conseguia dar um passo em direção ao interior da sala médica.

Aquilo era demais pra mim. Eu não entendia porque Deus estava permitindo que o meu caminho fosse cruzado com o daquele homem terrível novamente e até questionava se todo o sofrimento das semanas anteriores não havia sido suficiente, pois se realmente havia um propósito por trás daquela situação, eu não era capaz de enxergar.

A bebê, como se não estivesse aguentando mais sua própria condição, resmungou mais alto e me trouxe a memória as razões pelas quais eu estava ali. O bem-estar dela vinha antes de todos os conflitos vividos entre Victor e eu. Por isso, gostando ou não do médico, tomei uma atitude.

A porta rangeu quando eu passei por ela, mas o homem estava concentrado demais com os papéis em suas mãos, por isso, nem se tocou com o fato de ser eu ali, se é que ele ainda se lembrava de mim.

— Maria Isabel Rodrigues? — Victor perguntou para confirmar e foi nesse intante que ergueu a cabeça e me viu entrando com a pequenina no colo. Pude perceber seu espanto imediato e assim como eu, nos primeiros instantes ele não soube como agir. — Sarah?

— Olá, Victor — saudei, sentindo cada músculo do meu corpo se enrijecendo. Não era fácil estar diante do homem por quem eu tanto fui ferida. Prevendo que ele talvez não fosse querer nos atender, eu adiantei: — Se quiser, posso procurar outro médico.

Ainda em choque, Victor negou com a cabeça e em seguida, para o meu espanto, sorriu. Depois de tanto tempo, eu vi naquele belo rosto um sincero e amistoso sorriso. — Por favor, sente-se. — Ele pediu e eu obedeci sem desviar meus olhos dos dele. — Eu estou um pouco perplexo, confesso. Nossa! Faz tanto tempo.

— Sim, você tem razão — eu disse jogando um balde de água fria na animação dele.

— Estou aliviado, pois não estou louco. Há alguns dias pensei ter te visto na rua, mas pelo que me falaram você tinha ido embora — explicou todo entusiasmado me deixando impressionada com sua capacidade de ser um dissimulado e fingir que não havia um passado e uma bebê entre nós.

— É, eu mudei de cidade — respondi ranzinza.

Ele balançou um pouco a cabeça enquanto ria, olhou para alguma coisa sobre sua mesa e em seguida, encarou Maria.

— Essa menininha linda é...

— Minha filha — declarei, interrompendo-o antes dele vir com mais alguma gracinha. — Ela está com muita febre, não dorme e está comendo muito mal — fui direto ao assunto.

— Certo, certo... — murmurou, unindo os lábios mostrando como entendeu o recado. Ele, então, arregaçou as mangas do jaleco se preparando para algo. — Pode colocar sua filha na maca para eu poder examina-la? — pediu.

Atendendo a ordem dele, levantei e fui até o lugar referido onde deitei Mabel. Eu ainda estava arrumando a bebê quando Victor se aproximou me dando um baita susto.

Instintivamente, eu quis me afastar, mas ele impediu. — Fique aqui do meu lado, assim ela se sente mais a vontade — orientou.

Concordei com ele, mas meu nervosismo exalando pelos poros só piorou quando, pela proximidade, eu reparei em como ele continuava estupidamente lindo. O cabelo castanho escuro estava um pouco maior e, diferente de quando nos conhecemos, ele havia deixado a barba crescer, contribuindo em parceria com aquele par de olhos azuis charmosos para que eu o achasse ainda mais atraente e másculo. E para completar, fiquei boquiaberta quando ele começou examinar a bebê de ponta a ponta, demonstrando profissionalismo e maestria em seu trabalho. Primeiro usou o otoscopio nos ouvidos, depois auscultou o coraçãozinho utilizando o estetoscópio e fez o mesmo na barriguinha dela, tudo isso enquanto a distraía cantando uma música, surpreendentemente cristã, bem conhecida para Mabel, pois eu mesma vivia recheando nossos momentos de brincadeiras com canções como aquela.

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