Quando vejo Karl encurralado entre dois homens, não faço nenhum movimento brusco.
Galen, um dos melhores amigos do meu pai, ou a pessoa que me botou no mundo está a minha frente. Um sorriso cínico brota em seus lábios. Seu rosto me convida para o confronto e eu me recuso a cair em sua armadilha. Cada passo em falso, resultará em Karl machucado, ou algo pior. E no momento, isso é o que menos quero agora.
" Não faça nada Henry." Meu tio me alerta.
A cena a seguir passa-se meio que em câmera lenta. Em um momento estou a observando, nervoso, e em outro os três homens do mal estão caídos no chão.
Não sei ao certo o que aconteceu, mas de repente me veio uma raiva absurda, uma inconformidade por meu pai ser esse homem mal que todos temem e respeitam. Então fui pra cima deles. De todos eles. E acabei com todos.
O mais estranho é que eu nunca tinha brigado na vida, e tudo pareceu tão fácil, como se eu tivesse lutado a vida inteira.
Karl vem ao meu encontro e faz a pergunta que está na minha cabeça faz alguns minutos:
- Quando aprendeu a lutar, Henry?
- Agora. Na verdade não aprendi, só lutei e pronto.
- Ainda temos que investigar muito seus poderes e testar seus limites - fala, observando-me atentamente. - Aprendi práticas de batalha nos meus tempos de adolescência, e vou te ensinar tudo. Absolutamente tudo.
- E quando você vai fazer isso? Já está quase anoitecendo. Além do mais, tenho umas coisas pra te contar.
***
- Como assim "outra dimensão"? - Karl me olha de uma maneira cética. - Quando foi isso?
- Tudo aconteceu ontem, e não sei explicar como.
- Muito bem. Então quer dizer que você se teletransportou para a mansão do seu pai, viu "coisas estranhas" e relatórios de morte?
- Sim. Haviam milhares de papéis. E não me surpreende nada as execuções serem comandadas por Keith.
- E como você voltou pra cá?
- Não sei. Acho que pressenti que você estava em perigo - pelo menos eu acho que foi isso. Preciso urgentemente tirar uma dúvida com meu tio: - Sabe se tem como eu voltar lá?
- Pra você ter uma idéia, eu sequer sabia que isso era possível de se fazer. Agora vai descansar. Temos muitas coisas pra fazer amanhã.
Dou dois tapinhas fracos nas costas de Karl e sigo para o meu quarto. Abro a porta e uma lufada de vento bate em meu rosto. Então tenho a sensação de estar sendo observado.
Vou até a janela, que encontra-se escancarada. As cortinas voam com o vento e balançam-se em uma dança estranha.
Abro as cortinas e olho para fora. A sensação de estar sendo observado aumenta, então fecho-as fecho. Com tudo trancado, o silêncio toma conta do lugar.
Uma sensação de inquietação toma conta do meu corpo, e novamente vou até a janela. Pelas frestas da cortina, observo pelo vidro a paisagem exterior e vejo uma sombra escondida por entre as folhas.
À essa distância não posso dizer se é um homem ou uma mulher. Seria muito arriscado ir lá fora? Realmente espero que não.
Caminho pela casa, vou até o quarto de Karl e bato apressadamente na porta.
- Karl? Karl? Acorda!
Um homem totalmente descabelado e largado surge quando a porta é aberta. Sua cara amassada entrega que ele estava tendo uma boa noite de sono.
- Aconteceu alguma coisa? - pergunta ao mesmo tempo que solta um grande bocejo.
- Tem alguém vigiando lá fora! - quase grito, apontando para a janela.
- Onde? Não tô vendo nada! - corre para a janela e olha atentamente para o lado de fora. - Não tem ninguém ali.
Ando pelo piso branco até onde ele se encontra e observo o local. A pessoa continua lá, por entre os galhos e folhas, observando-nos.
- Olha ali, perto da caixa de correio. No meio dos arbustos - aponto com o queixo.
- Continuo sem ver nada. Ou a sua visão que tá muito boa ou a minha que tá muito ruim.
"Sua visão tá muito boa..."
- Acho que acabo de descobrir mais uma habilidade sobrenatural - meu tio concorda com um aceno de cabeça e volta a observar o lado de fora. - O que devemos fazer? Lutar com ela?
- Pera aí!? É só uma pessoa?
- Aparentemente sim. Porque?
- Então a pessoa não veio pra brigar, e sim pra passar uma informação ao chefe dela.
- Então o que devemos fazer? Ignorar? - questiono.
- Entrar no jogo deles!
- Como assim "Entrar no jogo deles"? Nem sabemos quem eles são.
- É o que vamos descobrir. Pega as cordas grossas pra mim, por favor.
- Não me diga que vai sequestrá-la para conseguir informações!?
- Digo sim, porque vou. Vamos, na verdade.
Alguma coisa me diz que isso não vai dar muito certo. Não sei se é intuição, uma espécie de premonição ou o que, mas acho que é melhor pensar em alguma outra coisa logo. As ideias do meu tio são sempre loucas.
- Não! Isso é muito arriscado! Olhando bem, vamos nos tornar os vilões da história.
- Então o que sugere?
- Vou lá fora! Fique aqui - decido, por fim.
- Ei, eu sou o mais velho daqui. Eu vou!
- Deixa que eu vou!
- Vamos parar com essa bobeira
e irmos os dois mesmo.- É - estávamos parecendo duas crianças. - Então vamos logo!
Destrancamos a porta e saímos da casa. O frio da noite bate de encontro aos nossos rostos, trazendo uma sensação de congelamento.
Seguimos em direção à caixa de correio e observamos o espaço ao redor. Olho para o local onde vi a tal pessoa e não vejo nada.
Noto a expressão confusa de Karl e observo-o enquanto ele vai para dentro de casa e pega uma espingarda que eu nem sabia que ele tinha. Logo depois fuça no matagal com a mesma e puxa o gatilho.
- Onde ela se enfiou?
- Não faço a mínima ideia!
Do nada surge uma fumaça verde ao nosso redor, que vai nos enfraquecendo aos poucos. Tento olhar por entre ela e vejo apenas um corpo feminino. Não consigo ver mais nada além disso. Nem o corpo, nem a expressão, nem o rosto. Nada mesmo.
Ainda consigo ouvir Karl sussurrar antes de apagarmos totalmente:
- Acho que a minha ideia do sequestro não era tão ruim.

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Meia-Noite
RandomHá sempre dois lados da moeda. Há sempre duas versões para uma história. E é você quem escolhe qual lado quer ficar. Você pode estar certo, mas também pode estar muito errado. E o final? Espere e verá! Henry aceitou o lado mais perigoso e por sinal...