Capítulo Dezessete

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   Água.

   Água, foi a primeira palavra que se formou na minha cabeça quando meus sentidos voltaram a mim. Muita água de preferência, pois eu poderia sentir minha boca seca que nem o deserto do Saara!

   Além da sede catastrófica, uma dor no fundo da minha cabeça se mostrava persistente em martelar o meu cérebro. E se isso não fosse o bastante, uma luz praticamente penetrava minhas pálpebras.

   Comecei a piscar até que meus olhos se ajustaram a claridade que, para o meu espanto, vinha do sol. Olhei imediatamente em volta (o que não fez nada para bem para minha dor de cabeça) percebendo o quarto ao qual eu me encontrava. As paredes bejes e sem vida em conjunto com a cama, no mínimo dura, me afirmavam que eu estava em um hospital.

   Me perguntei, por um breve momento enquanto tentava me sentar, como diabos eu havia parado ali?

   Mas assim que sentei o mais ereto que, meu corpo permitia no momento, alguns lampejos da última madrugada se refizeram na minha mente.

Meu Deus, quanto que eu bebi?

—Provavelmente muito, minha jovem. —disse um velho quando entrou no quarto no exato momento da minha pergunta.

   Olhei para ele com a testa franzida e imediatamente percebi seu jaleco branco. O médico. Ele fechou a porta atrás de si antes de se firmar na minha frente.

—Você deve ser Adélia, certo? —ele indagou olhando para prancheta que estava em sua mão, antes de voltar olhar para mim.

Certo. —respondo incerta à ele, que voltou a foliar a minha ficha.

—Eu sou Dr. Rodrigues e vou ser seu obstetra até que...

—O quê? —interrompi bruscamente. —Obstetra?!

—Sim. —ele responde calmo, ao voltar os olhos para mim.

   Fitei seu rosto redondo, que não escondia seus quase 50 anos, em completa indignação!

   Nem mandar o médico certo eles poderiam mandar?!

—Você deve ter entrando no quarto errado. Eu não preciso de um Obstetra; eu preciso de um grande remédio para dor de cabeça, galões de água e a minha alta para eu poder me lastimar da última noite na minha própria casa.

   Vi Dr. Rodrigues levantar as grossas sobrancelhas grisalhas antes de voltar os olhos mais uma vez para a minha ficha.

   Desviei minha atenção do médico para a janela, que continuava a derramar o sol pelo quarto, o iluminando mais do que o necessário. Não sabia que horas eram, mas queria muito ir para meu apartamento. Principalmente quanto mais eu deixava meus pensamentos vagarem para o que acontecera na madrugada passada. As lembranças, mesmo que um pouco falhadas, me fazem querer nada mais que me esconder no meu apartamento e me manter lá até as feridas recém-abertas se curarem novamente. Ou até eu conter um pouco do ardor delas.

   Não conseguia acreditar que havia cedido daquele jeito, mesmo bêbada, não conseguia acreditar no tanto que eu havia deixado ele ter controle sobre mim.

—Você é Adélia Sanches, certo? A jovem que estava quase entrando em coma alcoólico quando chegou aqui na madrugada. Um rapaz a trouxe...

   As palavras do médico logo me tiram do mundinho de alto piedade que eu começava a criar e me jogam novamente na atual realidade.

   Me lembrava vagamente de Henrique me trazendo para o hospital, agora que ele começava a falar sobre como eu havia parado ali. Os borrões de memória eram obviamente consequências do quase coma alcoólico.

Lutando pelo CaminhoOnde histórias criam vida. Descubra agora