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Escuro.

Não conseguia ver nada quando recobrei os sentidos e estava tão horrivelmente amarrada que não conseguia me mexer. Para piorar, estava amordaçada e o lugar era apertado. Deduzi que estava no armário de vassouras por causa de uma coisa áspera perto da minha cabeça. Eram cerdas plásticas e estavam me pinicando. Meu coração acelerou em questão de segundos e respirar passou a ser difícil.

Minha sorte foi que eu não tenho claustrofobia, pois do contrário, estaria morta. Essa é a verdade, não se assuste. Eu não disse em momento algum que a verdade seria bonita. Você disse que eu precisava ser mais específica se quisesse realmente que acreditasse em mim e tudo o que contei até agora foi necessário para contextualizar o restante. Então, vamos lá.

Estava amarrada já fazia algum tempo. Não sei dizer com exatidão quanto tempo foi, pois para mim pareceu uma eternidade, e quando finalmente alguém abriu aquela porta, meu coração se permitiu sentir alívio. Como fui tola...

Jayden estava à porta com sua melhor expressão de bonequinho de voodoo e eu estava tão confusa que não consegui ter reação alguma. Poderia ter me debatido, tentando me jogar em cima dele, mas e aí? O que mais eu faria amarrada daquele jeito? Ele me olhou como se estivesse com pena de mim e me pegou como se eu fosse feita de plumas, colocou-me sobre as costas e saiu rumando para qualquer lugar – só depois eu soube que era para o meu quarto.

Eu nem sabia que Jayden era forte, mas percebi que eu não sabia nada sobre ele. Ou sobre Nelly. Ou sobre qualquer coisa.

A casa já estava vazia e o silêncio era terrivelmente ensurdecedor. Respirava rápido, tentando entender o que tinha acontecido e como eles haviam me amarrado. Quando passamos pela sala e a claridade me possibilitou enxergar, vi que estava presa com cordas de varal e os nós eram bem precisos. Coisa de quem participou de acampamento de escoteiros ou coisa assim.

Chegamos ao meu quarto e ele me jogou sobre a cama como se eu fosse um saco de batatas, e depois passou a me encarar de maneira enigmática. Eu não conseguia decifrá-lo e os vestígios de menino tinham se esvaído de seu rosto. Restara apenas um semblante sofrido e desvairado.

— Eu não queria que fosse assim — disse, por fim, quebrando o silêncio. — Jamais quis, mas você tem que se intrometer em tudo, não é, Charlie?

Tentei resmungar que não estava entendendo nada, mas a mordaça impedia-me de qualquer coisa. Ele se aproximou e se ajoelhou ao lado da cama, passando a mão pela minha cabeça.

— Deixe-me contar a você a minha história, Charlie — proferiu, acariciando minha bochecha. — Eu era um garoto normal até pouco tempo atrás. Você iria gostar muito mais de mim naquela época, mas o meu pai tratou de foder com a nossa vida — fiquei em silêncio, pois senti que o que viria a seguir era sério. — Ele se meteu com um pessoal da pesada. Minha mãe implorou para ele parar com aquilo, pois estava nos colocando em perigo, mas ele não ouviu. Meu pai foi brutalmente assassinado na minha frente e os caras que fizeram isso deixaram uma mensagem bem clara: ou vocês pagam a dívida dele, ou morrerão também.

Jayden fez uma pausa e eu mal conseguia respirar, apreensiva com o que viria a seguir. Minha teoria sobre não conhecê-lo se concretizava a cada palavra dita.

— Minha mãe se empenhou em pagar a dívida, mas a cada dia eles voltavam alegando ter novas coisas a pagar. A situação foi ficando insuportável e ela decidiu que viríamos para cá passar um tempo, depois sumiríamos no mapa. Talvez iríamos para a Finlândia, o país do meu pai. Se não soubessem do nosso paradeiro, não teriam como nos torturar. Ela vendeu tudo na Califórnia e viemos, dizendo que iríamos passar apenas uns dias. Não contávamos que tia Ana sofreria aquele acidente... foi uma oportunidade.

O Quarto ao LadoOnde histórias criam vida. Descubra agora