III

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Enquanto saía, encontrei Aline na recepção do hospital. Ela me abraçou e ofereceu os seus sentimentos:

- Estou aqui para o que precisar e você sabe disso! - disse. Consenti com um sorriso apagado. Ela me entregou uma sacola. - Vamos, abra! - disse eufórica. Era uma lindo suéter azul com detalhes de renda. - Obrigada, amiga! - Sorri.

É óbvio que ela me fez vestir. Coube perfeitamente. Ao sairmos do hospital, Bruno já nos esperava. Eu não entendi. Olhei para a Aline com uma cara de "O que ele fazia aqui?" e ela retribuiu com uma cara de "Eu sei lá", então rimos.

- Olá! Não espero que esteja bem, além do mais, é uma perda irreparável... Mas estimo melhoras e desejo poder levá-los para casa antes de voltar para minha casa. - disse ele. A única análise que eu conseguia fazer é que ele parecia nervoso.

- Olá... - foi o que respondi ainda intrigada e com uma pitada de vergonha pelo que já passamos. PONDEREM!

- Filha, esse rapaz esteve aqui nas últimas noites para saber sobre você. Disse que a conhecia... Ele me pediu que assim que acordasse, o avisasse. Foi o que fiz... - meu pai muito ingênuo (OU NÃO) falou.

- Ahh sim... Claro, nos conhecemos no local do acidente. Ele foi o bombeiro que me acolheu e me explicou o que tinha acontecido... - mas ainda estava intrigada. "Nos conhecemos", ahãm!

- Por favor, vamos? - com muita educação nos levou ao seu carro.

Depois de nos acomodarmos na caminhonete, reinou o silêncio. Eu estranhava toda a situação, meu pai fazia cara de paisagem olhando pela janela e Bruno batia os polegares no volante com um ar de "Então, né"

- Então, aonde os levo? - ele perguntou, quebrando o silêncio.

- Siga sentido MG-353, por favor. - respondeu meu pai.

Vi pelo retrovisor central que Bruno franziu os olhos e então me viu... - Será que ele percebeu que eu o estava observando? - toda sem graça, disfarcei. Ele sorriu. "É óbvio que ele viu"

- Mais a frente, vire à direita, meu jovem. - meu pai o instruiu, depois de um longo silêncio.

O espanto de Bruno era notável. Parecia que havia uma pergunta entalada, mas ele se contentou a continuar a viagem. Mais uns metros e chegamos. Meu pai desceu, pegou as nossas coisas do carro e agradeceu ao rapaz:

- Obrigado, meu jovem! Foi muito bonito de sua parte.

- De nada, senhor. Era o mínimo que eu poderia fazer. - respondeu com um tanto de timidez.

- Te vejo lá dentro, filha. - disse dando-me um beijo no rosto e levando as coisas para dentro.

MEU DEUS! Só eu não estou entendendo a natureza da situação? OH CÉUS... Malditos dois dias em que fiquei apagada.

Durante alguns segundos, ficamos parados e quietos, focados no horizonte. Bruno tinha um riso de canto que me deixava completamente sem graça, mas o que poderia eu fazer? Ele chutou algumas pedras, eu foquei nas flores que doutor "sorriso" Marcos havia me dado (sim, eu as trouxe).

- Bem, obrigada. Acredito que não seja comum os bombeiros agirem assim, mas admiro muito o que você fez - e estendi o braço para um singelo aperto de mão e torci que todos fossem às suas casas felizes (ou nem tanto) para sempre.

Ele olhou para minha mão estendida e sorriu. Óbvio que fiquei sem graça e rapidamente abaixei-a, procurando um bolso para enterrá-la. EU NÃO ESTAVA ENTENDENDO NADA. Nunca tive amigos homens, vivia para ajudar os meus pais com as tarefas de casa/campo e mal saía para saber como reagir. O que estava acontecendo ali, afinal?

- Então, Camila... Já disse que sinto muito pela sua perda e acredito que serão necessários muitos anos para que sua vida ganhe a felicidade que um dia já teve. Imagino que sua mãe era muito importante para você... - começou enquanto se aproximava.

Definitivamente, não queria falar sobre isso. Tenho mania em me fazer de forte na frente dos outros, já me bastou o dia em que caí em prantos e ele me abraçou.

- Então, Bruno... Já o agradeci pelo o que fez e serei eternamente grata por isso. E sim, minha mãe era a metade de tudo o que tinha de mais valioso na terra. Não sei o que serão das coisas daqui para frente, mas obrigada pela preocupação. - não deixaria ele se aproximar sem fazer nada. Também dei alguns passos em sua direção, o que fez com que ele parasse e imaginei: FIM?

- Não soube que o acidente tinha ligação com o percurso da casa de vocês... - ora, ora... Acabei de descobrir o que havia lhe intrigado durante o caminho.

- Foi fatal. Agora, sei que ela estava indo me buscar... Será difícil passar por ali e não lembrar dela... - os meus olhos se encheram de água.

- Bem... Meus pêsames. - ele reagiu para me consolar. Não dei espaço (sou fria, de vez em quando, mesmo)

- Éé... Volto para Cascavel, SP, hoje... Posso te mandar uma mensagem, qualquer dia desses? - perguntou de cabeça baixa, demonstrando grande timidez.

PRIMEIRO, o que ele estava fazendo aqui? Nesse fim de mundo de Minas Gerais? SEGUNDO, ele por acaso tinha meu número?

- Ahm... Claro! Onde posso anotar meu número? - achei que fosse o certo a se fazer.

- Já o tenho! Não... É... Calma, espero que não tenha soado estranho... Eu o salvei no dia do acidente depois que você desmaiou. Enquanto levávamos você ao hospital, pedi à Aline. Esse era o nome da sua amiga, certo? Espero que esteja tudo bem. - todo envergonhado, tentou explicar.

- Ahh... Tudo bem! Sim, é Aline sim. (risos) Além do mais, não tenho com o que me preocupar, certo? Mas me diga: Como sabia o meu nome no dia do acidente? E o que está fazendo aqui, nessas bandas de Minas? - tentei quebrar o clima tenso que o próprio tinha criado, risos.

Umas das primeiras coisas que um bombeiro faz nessas situações é encontrar os documentos e o celular da vítima. Retornamos as ligações que a vítima mais ligava, de acordo com a lista de chamadas. Um dos contatos era Camila - ele parou de falar, sorriu apagado, mas não olhou para mim - E bem... estou em Minas em treinamento e coincidentemente, aconteceu a tragédia com a sua mãe - ele olhou nos meus olhos para se certificar que eu estava bem e continuou - O caminhão que se chocou com o carro da sua mãe estava carregado com líquido inflamável, por isso nos acionaram...

Passamos a tarde conversando. Fomos ao morrote que tem no terreno da casa, nos sentamos e admiramos o pôr do sol. Bruno contou-me um pouco de sua vida. Era um jovem recém-recrutado de 25 anos, foi criado pelos tios após os pais terem morrido também em um acidente de carro. Cheguei a conclusão que talvez por isso, senti que ele sabia o que eu estava sentindo quando me abraçou naquela noite... Ah! Ele tem um lindo boxer chamado Tadeu, risos.

Voltamos para a casa e então, ele me deixou nas escadas.

- Espero que nos vejamos em breve. - me disse quase sussurrando quando, novamente, me abraçou e deu um beijo na minha testa.

Quando chegou ao carro, acenou. Acenei de volta: Eu também...

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P.S. Trechos em itálico indicarão pensamentos, tá? Fonte da imagem de capa: Pinterest

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